História do aborto
A história do aborto, segundo a Antropologia, remonta à Antiguidade. Há
evidências que sugerem que, historicamente, dava-se fim à gestação, ou seja, provocava-se o
aborto, utilizando diversos métodos, como ervas abortivas, o uso de objetos cortantes, a aplicação de pressão abdominal entre outras técnicas em geral.
A legislação sobre o
aborto e sua execução prática variaram segundo sua época. Muitas leis e
doutrinas religiosas antigas consideravam os golpes da criança em gestação no ventre da mãe como um parâmetro para
diferenciar quando a prática do aborto deixava de ser aceitável. Nos séculos XVIII e XIX vários médicos, o clero e reformadores sociais conseguiram aprovar leis que proibiam totalmente
a prática do aborto. Durante o século XX o aborto induzido tornou-se
prática legal em muitos países do Ocidente, todavia com a oposição sistemática de grupos pró-vida, seja por via de ações
legais, seja por protestos e manifestações públicas.[1]
A história do aborto acompanha a história das
sociedades humanas e ainda se mantém em construção na atualidade, revelando
aspectos importantes da chamada história das mulheres. A forma de abordagem sobre a prática do aborto sofreu alterações ao
longo do tempo, em termos técnicos, éticos e jurídicos.
De acordo com Giulia Galeotti “Muitas das convicções que hoje são dados adquiridos constituem, na
verdade, o fruto de um árduo trabalho amadurecido ao longo dos séculos: o papel
da mulher, as formas de considerar o feto e a gravidez, as intervenções
externas, os interesses políticos e os parâmetros de avaliação mudaram desde a
Antiguidade até os dias de hoje, assumindo diferentes funções e significados.” [2] Até o século XVIII o feto era
entendido como uma parte do corpo feminino e, apesar da interferência das
religiões da Antiguidade até o século XVIII, a gestação, o parto e o aborto mantiveram-se como um assunto privado de mulheres, por isso
a vida da mulher e a do feto não foi colocada no mesmo plano por séculos.[3] Até esse momento, a mulher estava
associada à maternidade e o aborto acontecia principalmente nas situações de
prostituição, adultério e para salvar a vida da mãe. Nas sociedades em que o
aborto não era tolerado, durante a Antiguidade, isso não se dava em razão do
"direito do feto, mas sim como garantia de 'propriedade do pai' sobre um
potencial herdeiro".[4]
A partir do século XVIII, com as descobertas científicas e conhecimentos
médicos e a afirmação dos Estados Nacionais com a Revolução Francesa, a mulher
começa a perder o conhecimento sobre os saberes do corpo e, especialmente, dos
saberes ligados à reprodução. Consequentemente as visões sobre gravidez, parto
e aborto também vão se alterar. O feto passa a ser considerado como entidade
autônoma, o que traz consequências tanto para as reflexões da Igreja como para
o Estado. As conquistas científicas do século XVII e XVIII vão influenciar a
demografia e a política do Estado quanto ao papel da mulher e sua importância
para a reprodução de futuros cidadãos. O papel das parteiras tradicionais
também é alterado e estas passam a ser o bode expiatório do grande número de
mortalidades maternas. As parteiras passam a receber treinamento de médicos e
seu campo de ação é restringido. Ao mesmo tempo em que era desenvolvido esse
processo, passa a ser perigoso para a saúde as práticas (de parto e aborto)
quando realizadas pelas próprias mulheres ou pelas parteiras não capacitadas,
agravando o risco para a vida da mãe, além do estabelecimento de punições para
a prática do aborto.[5]
Durante o século XIX e entrando pelo século XX, o Estado passa a tutelar
o nascituro e a reprimir o aborto. A diminuição do número de nascimentos no
início do século XX exige dos Estados a tomada de decisão sobre o aborto. As
primeiras legislações sobre aborto aparecem de forma sistemática no século XX,
com a definição e penas para tal crime. Surgem nesse período pessoas
capacitadas para realizar o aborto, mesmo sendo a prática ilegal, de forma mais
segura do ponto de vista da saúde, mas que não elimina o risco de penalidades.
A produção e difusão em grande escala dos preservativos masculinos na segunda
metade do século XIX contribuiu para a diminuição do número de nascimentos na
Europa e foi um fenômeno quase que generalizado.[5]
Com o fim da Segunda Guerra surgem
novos comportamentos sexuais e de demografia. A descoberta da pílula
anticoncepcional proporciona à mulher a possibilidade de controlar sua
fertilidade e a maternidade deixa de ser o destino de toda a mulher, assim como
inicia-se o processo de separação entre sexualidade e maternidade trazido pelo
movimento político denominado feminismo, nos anos 1960. E é neste quadro político que o aborto “torna-se o
símbolo da expropriação do corpo e da identidade feminina.” [6] E é nesse momento que há a
cisão entre Igreja e Estado com relação à legislação específica para o aborto.
Nos anos 1970 na Europa essa discussão ganha as ruas e os legisladores são
chamados a discutir o assunto e a rever as leis punitivas. Vários países como
França, Alemanha, Inglaterra, Bélgica, Itália, Canadá e mais recentemente
Portugal e Espanha, entre outros, liberaram a interrupção voluntária da
gravidez por desejo da mulher.[5]
O tema, ainda hoje, é motivo de discussões acaloradas, especialmente nos
países do hemisfério sul, onde o aborto é crime, sendo admitido, em alguns
países, em situações específicas, como em caso de gravidez decorrente de
violência sexual, gravidez que represente risco de vida para a mulher e má
formações fetais incompatíveis com a vida extrauterina.
Índice
Aborto na AntiguidadeEditar
Neste período a prática do aborto era bastante difundida em todas as
classes sociais e vozes contrárias se davam quando o interesse masculino era
contrariado. O aborto era realizado por parteiras ou pelas próprias mulheres
grávidas e os meios utilizados para sua realização eram “cantilenas mágicas,
exercícios físicos violentos e instrumentos mecânicos”,[7] o que provocavam, muitas vezes, danos e
envenenamentos às mulheres. Na Grécia o aborto não era considerado crime, mas
precisava do consentimento do marido ou do patrão, da mesma forma como o
abandono de menores e o infanticídio. Nem mesmo em casos de morte da mulher a
pessoa responsável era imputada, a menos que o interesse do homem fosse
desrespeitado. Nesse período surgiram vozes isoladas contra o aborto com teses
que levavam em consideração o desenvolvimento do feto e sua condenação estava
relacionada ao momento da gestação em que ele é realizado. Em Roma o aborto não
foi considerado crime. Havia os que o condenavam e as razões eram em nome do
bem comum, impiedade, ofensa aos deuses, à família, à natureza e não
diretamente ao feto.[5]
O aborto e as religiõesEditar
JudaísmoEditar
No Judaísmo a vida se inicia antes da concepção, como uma bênção do
Senhor. De uma maneira simplificada podemos dizer que entre as etapas de
desenvolvimento do feto, as relações sexuais entre homem e mulher seriam a
primeira etapa, seguida da concepção, até chegar ao embrião. O judaísmo
considera o aborto provocado como violação e ofensa à vida. No entanto, é
possível interromper a gravidez para salvar a vida da mãe ou quando sua saúde
correr perigo. O não atendimento da solicitação médica nesses casos pode ser
considerado como suicídio. Se o aborto for praticado e houver possibilidade de
salvar a vida da mãe, será considerado homicídio.[8] No judaísmo a relação sexual no
casamento não é só para a reprodução.
CristianismoEditar
Da mesma forma que o judaísmo, o cristianismo condena o aborto, mas da
perspectiva do feto, equiparando o aborto ao homicídio. “O objeto de interesse
é o feto, ao passo que a preocupação da tradição clássica dizia respeito aos
interesses do pai, da família, do Estado, ocasionalmente da mulher, mas nunca
do nascituro”.[9] O princípio de proteção do feto e a
condenação do aborto como homicídio permaneceu constante e somente no século IV
torna-se objeto de Concílios. O direito canônico, após 1200, vai aprimorando as
penalidades para o aborto e além da excomunhão há sanções terrenas que retiram
direitos civis adquiridos. É importante destacar também que o cristianismo, a
partir do século VI irá influenciar diversos reinos e ampliar sua influência
sobre as legislações. Direito canônico e direito civil que eram separados, a partir
do século XII iniciam processo de convergência que permanece até os dias
atuais, com diferentes formas de manifestação. Para os teólogos cristãos era
fundamental a determinação da época da animação do feto, o que sofreu
diferentes interpretações e teve por consequência as diferentes formas de
punições ao aborto, dependendo da fase embrionária em que fosse praticado. Com
os descobrimentos científicos do século XVII, o cristianismo alterou sua visão
de mundo. Não a ponto de abalar as bases de sustentação, mas especialmente
quanto ao momento da entrada da alma no feto e a posição da Igreja com relação
ao aborto terapêutico. A posição da Igreja Católica permanece, na sua essência,
inalterada. Poucas vozes dentro da Igreja Católica levantam-se em favor de que a
última palavra deve ser dada às mulheres e homens diretamente envolvidos na
situação.[5]
IslamismoEditar
O Islã proíbe o aborto porque é uma intervenção que põe termo a uma
vida. A única exceção é o caso que a prática seja necessária para salvar a mãe
(aborto terapêutico).[10] O islamismo
também considera diferentes fases de desenvolvimento do embrião para o cálculo
da indenização no direito muçulmano clássico.[5]
Aborto no BrasilEditar
No Brasil, a história do aborto não foi muito diferente da história do
ocidente. Desde 1940 é considerado um delito pelo Código Penal e passível de
prisão, para as mulheres que se submetem e para quem o realiza. A
excepcionalidade se dá somente em três casos: quando a gravidez é resultado de
estupro (a mulher tem o direito de escolher interromper a gravidez ou
mantê-la), para salvar a vida da mulher e, a partir de 2012, gravidez de feto
anencéfalo (a mulher tem o direito de optar pelo prosseguimento da gestação ou
por interrompê-la). Embora desde 1940 a lei permita o aborto para gravidez
resultante de estupro, somente em 1989 foi aberto o primeiro serviço de
atendimento às mulheres para o aborto legal, na cidade de São Paulo. Esse
serviço permaneceu como único até 1994, ano em que foi aberto, também em São
Paulo outro serviço de atendimento a mulheres vítimas de violência.
Resumo do Google.
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