sexta-feira, 27 de setembro de 2019

BOCAGE POETA PORTUGUÊS.




 

SONETO DOS DONATIVOS
Cristo morreu há mil e tantos anos;
Foi descido da cruz, depois enterrado;
E ainda assim, a pedir não tem cessado
Para o sepulcro dele os franciscanos!
Tornou a ressurgir dentre os humanos;
Subiu da terra ao céu, lá está sentado;
 E à saúde dele sepultado
Comem à nossa custa estes maganos;
Pensam os que lhes dão a sua esmola
Que ela se gasta na função mais pia…
Quanto vos enganais, oh gente tola!
O altar mor com dois cotos (*) se alumia; (ilumina)
E o fradinho com a puta, que o consola,
Gasta de noite o que lhe dais de dia.


SONETO ASQUEROSO
Piolhos cria o cabelo mais dourado;
Branca remela o olho mais vistoso;
Pelo nariz do rosto mais formoso
O monco se divisa pendurado.
Se estes poemas fossem escritos hoje, por um escritor contemporâneo nacional, seriam seguramente parte de uma obra polémica. Logo, imagine-se o impacto no tempo em que foi realizada. Numa época dum puritanismo castrador, envolvido por uma moral católica limitadora, onde as regras e leis estabelecidas eram ainda reféns do espectro da Inquisição, que ainda governava as mentes das pessoas.

 

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