“Eu sou uma
ilha” Paulo
Vila Maior
In https://fbcdn-sphotos-a-a.akamaihd.net/hphotos-ak-ash3/525541_538083532878470_1490278426_n.jpg
Sou um
território minúsculo. Só vejo mar à minha volta. E, todavia, não sou invadido
pelas águas corrosivas, não deixo que o salitre se insinue na ossatura que é
meu salvo-conduto no meio do mar.
Vejo-o, o
mar, de todas as formas e feitios, os dias seguidos. Quando a bonança vem
encavalitada no anticiclone, o mar faz-se chão. Convivemos, trocamos palavras
de circunstância, umas vezes. Noutras vezes, quando o mar entristecido mal
consegue bater nas pedras gastas que me protegem, quer que seja seu confessor.
Debita a amargura que o consome – talvez porque foi habituado a ser tratado com
respeito, o mar assim alcandorado ao trono onde é indomável. Dessas vezes, tão
chão, nem consegue respingar umas lágrimas que se vejam para rimar com a
melancolia que dele se apoderou. Coriáceo, dou ouvidos aos lamentos.
Algumas
vezes o mar me pediu conselho. Mas eu sou mau a dar conselhos. Devia ser o mar
a dá-los, os conselhos. Porque eu nasci ilha e ilha hei de partir sem memória.
A insular condição é irremediável. Tal como ao mar alinharam o indomável
atributo, de mim, ilha que sou, diz-se que fui feito para apascentar a solidão.
Não há ilhas à minha volta, sequer. Ilhas que pudesse namorar de longe,
arroteando um amor platónico que ao menos servia para dissolver a monotonia da
solidão. E não choro, não por falta de lágrimas como ao mar acontece quando
está tão chão. Não choro porque, pétreo que sou, não me foi concedida a graça
das lágrimas. Ganhei reputação de duro por suportar as fúrias do intempestivo
mar quando, derrotado o anticiclone, ele se renova desde o fundo mais fundo e
se atiça com ondas majestosas contra os meus contrafortes.
A solidão
ensinou-me a não ter medo do medo. Nem quando as ondas se esmagam com
estrépito, ou quando ameaçam submergir-me num abraço medonho. Eu sei que as
tempestades passam. Aprendi a passar os dias tingidos pelas tempestades.
Aprendi, até, a conviver com o mar quando ele vegeta no esquecimento e me
atemoriza com o seu desarranjo tempestuoso. Sempre me disseram, desde a tenra
idade em que as evocações chegam à memória, que uma ilha tem de ser uma
fortaleza inteira. Im
Porque,
numa ilha, a solidão não tem o sentido dos lugares onde a solidão faz sentido.
Sem comentários:
Enviar um comentário