Calúnia, difamação e
injúria: os crimes contra a honra.
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Wellington Saraiva in Direito Penal, Direito Processual
Penal
Introdução
Os crimes contra a honra são, basicamente, a calúnia,
a difamação e a injúria, definidos nos artigos 138 a 140 do
Código Penal.
Na calúnia, o autor do delito atribui ao
ofendido uma conduta que é definida na lei como criminosa. Por exemplo, João,
sabendo ser falsa a afirmação, diz que Carla, servidora pública, recebeu dinheiro
para acelerar o andamento de um requerimento administrativo. Existe calúnia
nesse caso, porque a conduta atribuída por João corresponde ao crime de
corrupção passiva.
Na difamação, o agente atribui ao ofendido
uma conduta ofensiva à reputação, mas que não corresponde a crime (pois, nesse
caso, seria calúnia).
Na injúria, o agente ofende a dignidade ou o
decoro do ofendido por qualquer meio. Ocorre, por exemplo, se Júlia se dirige a
Luís e o chama de “desonesto, sem vergonha”.
Configuração do crime e intenção de
ofender
Em todos os casos, o autor da ofensa deve ter a intenção
de ofender, isto é, o ânimo de atingir a honra do ofendido. Não
haverá crime se ele tiver mencionado os fatos possivelmente ofensivos com outra
finalidade, como ocorre, por exemplo, quando um funcionário público comunica à
autoridade competente que alguém pode ter cometido um ato ilícito; quando
alguém faz apenas uma brincadeira, sem intenção de ofender; quando alguém
precisa defender-se de uma acusação ou quando faz crítica a outra pessoa. Caso
especial é o dos jornalistas e pessoas que escrevem críticas na imprensa
(inclusive pela internet). Os tribunais costumam entender – com razão – que
deve haver maior tolerância à crítica nesses casos, em virtude da garantia
constitucional da liberdade de imprensa (artigo 220 da Constituição). Em
qualquer caso, tudo dependerá da forma como os fatos sejam ditos, pois, se
houver excesso de linguagem, o crime poderá estar configurado.
A caracterização de crime contra a honra muitas
vezes depende de avaliação subjetiva e sutil sobre a possível ofensa. As mesmas
afirmações podem caracterizar ou não o delito, a depender das palavras e da
forma com que foram emitidas. Muitas vezes, a diferença entre o crime e o mero
desabafo ou exercício da liberdade de expressão está nos detalhes. As mesmas
palavras – e até palavras chulas (os “palavrões”) – podem ser ditas de forma
ofensiva ou não e até de maneira carinhosa. Tudo dependerá da relação entre as
pessoas, do contexto e do modo como foram ditas.
Para que os crimes de calúnia e difamação se
configurem, é necessário que a ofensa chegue ao conhecimento de uma terceira
pessoa, além da própria vítima. Se a ofensa for dirigida pelo autor do fato
diretamente à vítima e a ninguém mais, não há o crime. Na injúria, a situação é
diferente. O crime pode caracterizar-se pela ofensa diretamente à vítima. Será
necessário, porém, que a ofensa possa ser provada, pois, do contrário, a
investigação resultará inútil e não poderá haver processo criminal capaz de
gerar resultado.
Os tribunais brasileiros costumam entender que não
ocorre crime contra a honra quando pessoas trocam ofensas durante discussão (é
o que se chama de retorsão imediata), mas isso também dependerá do exame
das circunstâncias.
Ação penal
A ação penal nos crimes contra a honra, em
geral, é de iniciativa privada. O próprio ofendido precisa contratar
advogado para ajuizá-la.
A ação cabe ao Ministério Público nos casos em que
a ofensa seja feita contra o(a) Presidente da República ou contra chefe de
governo estrangeiro. Também caberá ao Ministério Público se for contra
funcionário público, por causa de suas funções, e, no caso de injúria, se
utilizar elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou condição
de pessoa idosa ou com deficiência. Nesses casos, porém, o ofendido precisará
manifestar ao Ministério Público sua intenção de que este promova a
ação; essa manifestação chama-se tecnicamente de representação. Veja este texto para entender as diferenças entre ação penal pública e privada.
Portanto, nos crimes contra a honra entre
particulares, a ação penal é privada e se
inicia por meio de uma petição chamada queixa. Esta precisa ser proposta
por advogado.
Exceção da verdade
Em alguns casos, apenas nos crimes de calúnia
e difamação, o autor da ofensa pode defender-se no processo dizendo que
a afirmação é verdadeira. É o que se chama de exceção da verdade. O
termo “exceção” significa, aí, uma forma de defesa processual.
Por exemplo: Maria publica na internet texto no
qual afirma que João é corrupto. Caso João a processe por calúnia, Maria poderá
defender-se por meio da exceção da verdade, na qual procurará provar que João
de fato cometeu crime de corrupção. Se conseguir, Maria será absolvida da
acusação de crime contra a honra, pois terá provado que sua afirmação sobre o
crime de João era verdadeira.
Denunciação caluniosa
Existe um crime assemelhado aos delitos contra a
honra, denominado denunciação caluniosa, o qual, na verdade, é
considerado pelo Código Penal como crime contra a administração da justiça.
Ele ocorre quando alguém, sabendo que uma pessoa é inocente, dá causa a
investigação policial, a processo judicial, a investigação administrativa, a
inquérito civil ou a ação de improbidade administrativa contra ela,
atribuindo-lhe crime.
Ofensas pela internet
Atualmente, sobretudo por causa da interação às
vezes inadequada de pessoas em redes sociais, tem sido frequente o
cometimento de crimes contra a honra pela internet. Assim como nas
ofensas na presença de alguém, também se pode cometer essa espécie de delito
pela internet. Da mesma forma, tudo dependerá das circunstâncias específicas em
que a ofensa foi proferida e da forma como ocorreu. Caberá ao advogado do
ofendido analisar a melhor providência a adotar.
Para saber mais, veja o texto Responsabilidade por ofensas, danos e
atos na internet.
O que fazer se você for ofendido
Se alguém cometer crime contra sua honra, é
possível ajuizar ação penal contra o ofensor. Se você já possuir as provas do
fato e os dados de identificação do ofensor, poderá imediatamente contratar
advogado para que analise os fatos e, se for o caso, ajuíze a ação penal. De
qualquer modo, caberá a ele examinar as
circunstâncias e escolher a melhor alternativa processual.
Se o advogado entender que não há
elementos suficientes para promover de imediato a ação penal e que, portanto,
será necessário investigação sobre a ofensa, ele poderá registrar boletim de
ocorrência ou formular notícia‑crime para que a polícia, por meio de
inquérito, esclareça os fatos.
Para saber mais, veja o texto O que fazer se você for vítima de crime.
Ação civil de indenização
Se você for vítima de ofensa, não existe apenas a
opção de processar o responsável na esfera criminal. Poderá também ajuizar ação
civil de indenização contra ele ou ela.
Na verdade, a indenização pela agressão à honra
pode ser fixada pelo juiz na própria ação criminal. Ocorre que as
características do processo criminal e a pena baixa fixada na lei para os
crimes contra a honra podem tornar a ação penal ineficiente. Em entendimento
com seu advogado, poderá concluir que é mais vantajoso promover ação
indenizatória em paralelo com a ação criminal ou apenas a primeira.
Prazos
A maioria dos direitos e ações judiciais está
limitada a prazos em que podem ser exercidos. No caso de crime contra a
honra, o ofendido, se quiser, precisa exercer o direito de queixa no
prazo de seis meses do dia em que tomar conhecimento de quem seja o
autor da ofensa, de acordo com o artigo 38 do Código de Processo Penal. Se não
souber quem é o autor, nesse mesmo prazo precisa comunicar o fato à polícia,
para que seja investigado. Após esse prazo, ocorre a decadência do
direito de queixa do ofendido.
Se o prazo não for obedecido, não será mais
possível promover ação penal pela ofensa. Restará, porém, a possibilidade de
ação civil de indenização pelo dano moral. Para essa, o prazo é de três anos
da data da ofensa, consoante o artigo 206, § 3.º [o símbolo “§” lê-se como
“parágrafo”], inciso V, do Código Civil. Essa norma fixa esse prazo de prescrição
para as ações destinadas à reparação civil de danos.
Ofensas em ambiente de trabalho
Às vezes, ofensas são cometidas no local de trabalho,
seja em órgãos e entes públicos, seja em empresas particulares. No segundo
caso, além das consequências criminais, pode caber também ação de indenização
contra a própria empresa pelo dano moral, se a ofensa tiver sido
praticada por um representante dela (um gerente, supervisor, diretor etc.).
Nesse caso, é necessário procurar o sindicato ou um advogado trabalhista de
confiança, para que ele avalie a situação e decisa sobre a viabilidade de ação
para isso, a ser proposta na Justiça do Trabalho.
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