sexta-feira, 21 de abril de 2023

ESCRAVIDÃO E O ISLAMISMO...

 

 
ESCRAVIDÃO BRASILEIRA E O ISLAMISMO
Dionê Leony Machado
10ª. Parte
Março de 2023


Revoltas dos escravos no Brasil do século 19.

Comuns nos mundos rural e urbano, as rebeliões revelam como negros escravizados, libertos e livres interpretaram e transformaram a realidade de seu tempo.
As revoltas escravas são parte importante da história social e política brasileira. Legado vivo das lutas negras no país, elas desafiaram a ordem escravista ao reivindicar a liberdade dos escravizados e colocar em prática as visões de mundo de comunidades despossuídas ao longo do século 19. Lideradas por homens e mulheres africanos e/ou nascidos no Brasil, os levantes não foram casos excepcionais, mas sim parte do cotidiano de uma sociedade formada pelo tráfico de africanos e dominação sobre negros e indígenas.
Comuns nos mundos rural e urbano, as revoltas revelam como negros escravizados, libertos e livres interpretaram e transformaram a realidade de seu tempo. Ao se oporem à violência senhorial, muitos colocaram à prova leituras atentas do cenário político doméstico e internacional. Assim como os quilombos – comunidades de escravizados fugidos aos quais por vezes estavam ligadas -, as conspirações escravas demonstram a sofisticação do pensamento estratégico dos escravizados; o papel de diversas religiões na formação de identidades negras; a pluralidade étnica africana; as funções do letramento e, sobretudo, a força do ativismo diário do povo negro pelo direito à vida e à liberdade no Brasil.
1807
Salvador e Recôncavo, BA
Em maio, escravizados haussá projetam um levante para o dia de Corpus Christi em vários bairros de Salvador e engenhos do Recôncavo. Em Santo Amaro, os rebeldes diziam ter um “embaixador”. Quando o movimento foi desmontado, foram encontrados arcos, flechas e um tambor.
1809
Salvador e Recôncavo, BA
Em janeiro, escravizados haussás fogem em massa da capital e de Nazaré das Farinhas. Entre dezenas de mortos e feridos, mais de 100 rebeldes são presos.
1814
Salvador, BA
Em fevereiro, quilombolas e escravizados das armações de pesca, perto de Itapuã, atacam a Vila de Itapoá. De maioria haussá, incluindo cinco mulheres, eles marcharam em direção ao Recôncavo, incendiando mais de uma centena de engenhos, plantações e casas. Liderada pelo muçulmano de malomi João e pelo liberto Francisco Cidade, a revolta se estendeu até maio e deixou um saldo de mais de 50 mortos.
Recife, PE
Revolta envolvendo trabalhadores urbanos escravizados e libertos. Planejada para 29 de junho, dia do Espírito Santo, tinha entre suas lideranças o liberto Domingos do Carmo, “rei do Congo e de todas as nações do gentio da Guiné”.
1816
Salvador e Recôncavo, BA
Em fevereiro, outra revolta fecha o ciclo de rebeliões haussás. Escravizados dos engenhos de Santo Amaro e São Francisco do Conde botam fogo em fazendas de cana e casas da região.
1822
Salvador, Itaparica e São Mateus, BA
Em maio, 250 escravizados do engenho Boa Vista se levantam em Itaparica. Em dezembro do mesmo ano, escravizados atacam tropas brasileiras estacionadas em Mata Escura e Saboeiro, freguesia de Pirajá e cerca de 50 deles são fuzilados pelo general Pierre Labatut.
1826-1830
Salvador e Recôncavo, BA
Inúmeras revoltas protagonizadas especialmente por escravizados nagôs nos engenhos do Recôncavo. Em 1826, nagôs do quilombo do Urubu, no Cabula, organizam um ataque a Salvador no Natal. Um dos líderes é Zeferina, “rainha” do quilombo onde também existia um candomblé. Em 1828, escravizados atacam as armações de Itapuã e se revoltam nos engenhos de Iguape. Mais de 40 rebeldes são mortos. Em 1830, nagôs atacam armazéns de escravos novos no Taboão. Cerca de 50 rebeldes são mortos.
1832
São Carlos (Campinas), SP
Em fevereiro, escravizados em 15 fazendas nas margens do rio Atibaia planejam uma revolta para a Páscoa. Em São Paulo, contavam com a adesão do liberto João Barbeiro. Os cativos do Congo e nascidos no Brasil tinham conhecimento da lei do fim do tráfico e até da abolição da escravidão indígena em São Paulo, ambas de 1831. “Pai Diogo” era visto como líder, presidindo reuniões, arrecadando dinheiro e fazendo mezinhas (preparado de raízes) para “fechar o corpo dos insurgentes” e acalmar os senhores.
1833
Carrancas, MG
Em 13 de maio, os escravizados da família Junqueira se levantaram nas fazendas Campo Alegre, Bela Vista e Bom Jardim, no sul de Minas. Liderados por Ventura Mina, rebeldes africanos e nascidos no Brasil assassinam diversos membros da família senhorial, incluindo o deputado Gabriel Francisco Junqueira. Conhecendo a conjuntura política do período regencial, tomam conta das propriedades em que trabalhavam, certos de que os restauradores que acabavam de realizar uma sedição militar em Ouro Preto os ajudariam a conseguir a liberdade.
1835
Salvador, BA
Na noite de 24 para 25 de janeiro, cerca de 600 escravizados e libertos, em sua maioria nagô e adeptos do Islã, tomam a cidade de Salvador. Os chamados malês (africanos mulçumanos) organizam a revolta para o final do mês sagrado do Ramadã, durante a festa do Lailat al-Qadr, a Noite da Glória, que coincidia com o domingo de Nossa Senhora da Guia. Cerca de 70 rebeldes morreram e mais de 500 sofreram prisão, açoites ou deportação. Este foi o levante urbano mais importante das Américas no século 19.
1835-1840
Cabanagem, PA
Lideranças negras como Félix, Cristóvão e Belizário tomam a frente de batalhões de escravizados e quilombolas nas lutas dos cabanos contra as tropas da Regência. Levantes no Acará e na Fazenda Pernambuco, propriedade Carmelita no Guamá, foram significativos.
1838
Vassouras, RJ
Em novembro, centenas de escravizados africanos e nascidos no Brasil dos cafezais de Manuel Francisco Xavier e Paulo Gomes de Ribeiro Avelar se reúnem nas matas de Paty do Alferes para formar um quilombo. Eram liderados pelo ferreiro Manoel Congo, também chamado de “pai” ou “mestre”, a quem atribuíam o poder de se tornar invisível.
1838-1841
Balaiada, MA
Escravizados, livres e quilombolas pegam em armas para lutar durante a revolta popular da Balaiada. Chegando a comandar cerca de 3.000 negros fugidos, o liberto Cosme Bento das Chagas se junta aos balaios e incentiva a insurreição nas fazendas maranhenses. Chagas se intitulava “tutor e imperador da liberdade”, chegando a fundar uma escola de ler e escrever no quilombo da Lagoa-Amarela, na comarca do Brejo.
1846
Recife, PE
Conspiração liderada por escravizados pertencentes à seita religiosa de Agostinho José Pereira, o chamado Divino Mestre. A polícia encontra na casa do pregador protestante uma bíblia em que estavam marcadas passagens sobre o fim da escravidão, textos sobre o Haiti e versos chamados de “ABC”. Agostinho alfabetizou muitos de seus seguidores.
1848
Ciclo de conspirações negras no Vale do Paraíba
Na fronteira entre as províncias do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, diversas conspirações foram descobertas. Em Vassouras, o movimento tinha origem num culto religioso centro-africano e de raízes kongo/Mbundu. Falava-se na intervenção de Santo Antônio enquanto os rebeldes de Itu invocavam a São Benedito. Marcada para o dia de São João, a revolta previa o envenenamento dos senhores e ligava-se às discussões sobre o fim do tráfico atlântico para o Brasil.
1849
São José do Queimado, hoje município da Serra, ES
Em 19 de março, Chico Prego, João da Viúva e Elisiário lideraram mais de 300 escravizados em revolta após uma promessa não concretizada de liberdade feita pelo missionário italiano Gregório José Maria de Bene. O frei iria negociar a alforria daqueles que trabalharam na construção de uma igreja inaugurada durante a festa de São José. A repressão foi violenta – fugitivos foram arrastados pelo chão por muitas léguas -, mas alguns sobreviventes fundaram o Quilombo de Rosa d’Água em Cariacica.
1853
Bahia e Pernambuco
Dados os fortíssimos rumores de conspiração em Salvador, alguns africanos libertos são presos e deportados por serem suspeitos. Em Pernambuco, nas vilas de Nazaré e Pau d’Alho, escritos árabes são encontrados entre a comunidade islâmica escravizada. O alufá Rufino José Maria (ou Abuncare) foi preso sob suspeita de participação na revolta.
1854
Taubaté, Pindamonhangaba e São Roque, SP
Em 17 de abril, dia de São Benedito, escravizados de Taubaté planejam atacar a praça da matriz, nomear um rei e seguir armados para Pindamonhangaba. Em São Roque, a revolta tinha raízes em comunidades religiosas onde rebeldes eram iniciados por “Pai Gavião,” um espírito que falava através do liberto africano José Cabinda.
1858
Santana do Livramento, RS
Escravizados em combinação com o negro castelhano Francisco Antonio Dias, conhecido como Antonio Barbat, planejam uma fuga em massa para o Estado Oriental (Uruguai). O sinal para que os rebeldes pudessem reconhecer uns aos outros seria o cabelo raspado à navalha na circunferência da cabeça.
1859
Capivari, Encruzilhada e Herval, RS
Em março, escravizados, desertores e criminosos fugidos planejavam atacar as vilas e fugir para o Estado Oriental (Uruguai).
1860
Itapemirim, ES
Em agosto, autoridades descobriram uma revolta organizada por homens e mulheres escravizados pertencentes às “Sociedades Pemba” nas fazendas da região.
1861
Anajatuba, Viana e Turiaçu, MA
Escravizados e libertos de Anajatuba planejam uma revolta inspirada na Guerra de Secessão nos EUA. Depois de ver navios americanos ancorados em São Luís, rebeldes param de trabalhar ao imaginar que tropas americanas viriam ajudá-los a conseguir a liberdade. Quilombolas de Turiaçu e Viana circulam informação sobre a guerra.
1862
Muribeca, PE
Insurreição planejada por escravos aquilombados dos Engenhos Guararapes, Conceição e Recreio. Muitos acreditavam que o governo imperial e a Inglaterra apoiariam sua luta pela liberdade e liam coletivamente os jornais da época.
1863
Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, Maranhão e Pará
Ciclo de conspirações negras em conexão à chamada Questão Christie. Escravizados planejavam lutar ao lado da Inglaterra numa eventual guerra contra o Brasil. Em Pelotas, o liberto Sebastião Maria foi preso por falar em ingleses contrários à escravidão. Em Campinas, uma insurreição foi sufocada na Fazenda Atibaia. Nas demais províncias, escravizados e quilombolas fogem em massa.
1863-1864
Taquari, RS
Insurreição planejada para o período eleitoral em novembro. Escravizados planejavam reunir-se no cemitério de onde arrancariam barras de ferro para usar como lanças e depois de atacar Taquari para conseguir dinheiro, armamento e fardamento oficial, finalmente fugindo “com os castelhanos” para o Estado Oriental (Uruguai).
1864
Serro e Diamantina, MG
Em outubro, artesãos das fazendas do Serro e escravizados das minas de diamante em Diamantina insurgiram-se em conjunto com o Quilombo dos Ferreiros e libertos. Inspirados pelas notícias vindas dos jornais a respeito da Guerra de Secessão nos EUA, os rebeldes resistiram ao cerco armado por dois meses em São João da Chapada. Entre os líderes, estavam a quilombola Vitorão, além do marceneiro José Cabrinha e o alfaiate Adão, ambos letrados e autores de cartas durante o levante.
1864-1865
Revoltas em fazendas da Ordem do Carmo, SP, PR e PA
Em maio, escravizados da Fazenda Capão Alto, na vila paranaense de Castro, recusaram-se a acompanhar o representante de novos arrendatários para São Paulo. Em dezembro, cativos da Fazenda Gaecá, perto de São Sebastião, atacaram a sede por desconfiar que seriam vendidos “para serra acima” pelo administrador. Em julho de 1865, na Fazenda Pernambuco, arredores de Belém, escravizados atacaram o feitor e se aquilombaram, influenciados por notícias sobre a Guerra de Secessão nos EUA.
1865
Minas Gerais
Os cativos falam “em liberdade, em Lopez do Paraguai, e muitas outras coisas perigosas.” Mais de 20 conspirações negras ocorreram na província, em conexão com a Guerra do Paraguai, incluindo novamente o Serro.
1867
Viana, MA
Insurreição quilombola liderada pelos escravizados do mocambo São Benedito do Céu, nas matas de Viana e Turiaçu. Em julho, inspirados na Guerra do Paraguai, incendiaram as fazendas Timbó, Santa Bárbara e Santo Inácio. Os quilombolas esperavam o apoio dos índios Gamela e forçaram um feitor a escrever uma carta para as autoridades maranhenses onde diziam “nos achamos em campo a tratar da Liberdade dos Cativos, pois a muito que esperamos por ela.”
1868
Porto Alegre, RS
Revolta organizada para eclodir na noite de São João, em junho. Os rebeldes planejavam atacar a cidade divididos em quatro divisões de lanceiros, visando o Quartel da Guarda Nacional, o Laboratório Pirotécnico e o Arsenal de Guerra. Prisioneiros de guerra paraguaios foram contatados pelos escravizados.
1871
Rio de Janeiro, Espírito Santo, São Paulo, Maranhão e Minas Gerais
Conspirações em conexão com a passagem da Lei do Ventre Livre. No Rio, na fazenda de João de Souza Botelho, escravizados exigem pagamento de salários a título de se acharem forros. Em Turiaçu, Santa Helena e São Bento, MA, outros fogem em massa para os quilombos. Por se acharem libertos, escravizados planejam levantes em Queimado, Mangaraí, Cachoeiro de Itapemirim e Cariacica, ES. Em SP, rumores se espalham em Espírito Santo do Pinhal e São Roque. Em MG, escravizados de fazendas de Sabará, Caeté, Jaguari, e Leopoldina se rebelam. Em Santa Luzia, os rebeldes pretendiam “gritar a República e ficarem forros.”
1881
Resende, Areas, Bananal, Silveiras e Queluz, RJ e SP
Em março, uma revolta é descoberta na Freguesia de Campo Belo, em Resende, de onde se espalha para várias fazendas na fronteira entre Rio e São Paulo. Três homens brancos são indiciados ao lado dos escravizados que pretendiam ir à Corte Imperial “gritar a liberdade.”
1882
Campinas, SP
Liderados pelo liberto Felipe Santiago, os 120 escravizados da Fazenda do Castelo, em Campinas, rebelam-se aos gritos de “Mata branco” e “Viva a Liberdade,” matando a família do administrador da fazenda. A revolta estava ligada a uma sociedade de cunho milenarista chamada “Arasia.” Setenta e quatro suspeitos foram presos.
1885
Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul
Em setembro, descobre-se uma insurreição escrava influenciada por uma sociedade secreta abolicionista chamada “Incógnitos.” Com sede na Corte, a sociedade esperava obter participação popular em várias províncias. Os rebeldes diziam contar com o apoio do Imperador, figuras políticas e do Conde d’Eu. No Natal de 1885, focos de revolta aparecem em Limeira, Mogi Mirim e Casa Branca, SP, onde os escravizados diziam seguir o Rei Pilintra.
1887-1888
São Paulo e outras províncias
Ciclo de revoltas, fugas em massa das fazendas, aquilombamento, marchas e confrontos em vilas paulistas. Em Araras, por exemplo, os escravizados da Fazenda Empíreo apresentam-se ao Juiz de Órfãos reivindicando liberdade, salários e boa alimentação. Revoltas se espalham pelo Brasil representando a crise final do escravismo.


Revoltas escravas no Brasil do século 19
Isadora Mota
31 mai 2021(atualizado 30 jun 2021 às 18h40)
Comuns nos mundos rural e urbano, as rebeliões revelam como negros escravizados, libertos e livres interpretaram e transformaram a realidade de seu tempo.
As revoltas escravas são parte importante da história social e política brasileira. Legado vivo das lutas negras no país, elas desafiaram a ordem escravista ao reivindicar a liberdade dos escravizados e colocar em prática as visões de mundo de comunidades despossuídas ao longo do século 19. Lideradas por homens e mulheres africanos e/ou nascidos no Brasil, os levantes não foram casos excepcionais, mas sim parte do cotidiano de uma sociedade formada pelo tráfico de africanos e dominação sobre negros e indígenas.
Comuns nos mundos rural e urbano, as revoltas revelam como negros escravizados, libertos e livres interpretaram e transformaram a realidade de seu tempo. Ao se oporem à violência senhorial, muitos colocaram à prova leituras atentas do cenário político doméstico e internacional. Assim como os quilombos – comunidades de escravizados fugidos aos quais por vezes estavam ligadas -, as conspirações escravas demonstram a sofisticação do pensamento estratégico dos escravizados; o papel de diversas religiões na formação de identidades negras; a pluralidade étnica africana; as funções do letramento e, sobretudo, a força do ativismo diário do povo negro pelo direito à vida e à liberdade no Brasil.
1807
Salvador e Recôncavo, BA
Em maio, escravizados haussá projetam um levante para o dia de Corpus Christi em vários bairros de Salvador e engenhos do Recôncavo. Em Santo Amaro, os rebeldes diziam ter um “embaixador”. Quando o movimento foi desmontado, foram encontrados arcos, flechas e um tambor.
1809
Salvador e Recôncavo, BA
Em janeiro, escravizados haussás fogem em massa da capital e de Nazaré das Farinhas. Entre dezenas de mortos e feridos, mais de 100 rebeldes são presos.
1814
Salvador, BA
Em fevereiro, quilombolas e escravizados das armações de pesca, perto de Itapuã, atacam a Vila de Itapoá. De maioria haussá, incluindo cinco mulheres, eles marcharam em direção ao Recôncavo, incendiando mais de uma centena de engenhos, plantações e casas. Liderada pelo muçulmano de malomi João e pelo liberto Francisco Cidade, a revolta se estendeu até maio e deixou um saldo de mais de 50 mortos.
Recife, PE
Revolta envolvendo trabalhadores urbanos escravizados e libertos. Planejada para 29 de junho, dia do Espírito Santo, tinha entre suas lideranças o liberto Domingos do Carmo, “rei do Congo e de todas as nações do gentio da Guiné”.
1816
Salvador e Recôncavo, BA
Em fevereiro, outra revolta fecha o ciclo de rebeliões haussás. Escravizados dos engenhos de Santo Amaro e São Francisco do Conde botam fogo em fazendas de cana e casas da região.
1822
Salvador, Itaparica e São Mateus, BA
Em maio, 250 escravizados do engenho Boa Vista se levantam em Itaparica. Em dezembro do mesmo ano, escravizados atacam tropas brasileiras estacionadas em Mata Escura e Saboeiro, freguesia de Pirajá e cerca de 50 deles são fuzilados pelo general Pierre Labatut.
1826-1830
Salvador e Recôncavo, BA
Inúmeras revoltas protagonizadas especialmente por escravizados nagôs nos engenhos do Recôncavo. Em 1826, nagôs do quilombo do Urubu, no Cabula, organizam um ataque a Salvador no Natal. Um dos líderes é Zeferina, “rainha” do quilombo onde também existia um candomblé. Em 1828, escravizados atacam as armações de Itapuã e se revoltam nos engenhos de Iguape. Mais de 40 rebeldes são mortos. Em 1830, nagôs atacam armazéns de escravos novos no Taboão. Cerca de 50 rebeldes são mortos.
1832
São Carlos (Campinas), SP
Em fevereiro, escravizados em 15 fazendas nas margens do rio Atibaia planejam uma revolta para a Páscoa. Em São Paulo, contavam com a adesão do liberto João Barbeiro. Os cativos do Congo e nascidos no Brasil tinham conhecimento da lei do fim do tráfico e até da abolição da escravidão indígena em São Paulo, ambas de 1831. “Pai Diogo” era visto como líder, presidindo reuniões, arrecadando dinheiro e fazendo mezinhas (preparado de raízes) para “fechar o corpo dos insurgentes” e acalmar os senhores.
1833
Carrancas, MG
Em 13 de maio, os escravizados da família Junqueira se levantaram nas fazendas Campo Alegre, Bela Vista e Bom Jardim, no sul de Minas. Liderados por Ventura Mina, rebeldes africanos e nascidos no Brasil assassinam diversos membros da família senhorial, incluindo o deputado Gabriel Francisco Junqueira. Conhecendo a conjuntura política do período regencial, tomam conta das propriedades em que trabalhavam, certos de que os restauradores que acabavam de realizar uma sedição militar em Ouro Preto os ajudariam a conseguir a liberdade.
1835
Salvador, BA
Na noite de 24 para 25 de janeiro, cerca de 600 escravizados e libertos, em sua maioria nagô e adeptos do Islã, tomam a cidade de Salvador. Os chamados malês (africanos mulçumanos) organizam a revolta para o final do mês sagrado do Ramadã, durante a festa do Lailat al-Qadr, a Noite da Glória, que coincidia com o domingo de Nossa Senhora da Guia. Cerca de 70 rebeldes morreram e mais de 500 sofreram prisão, açoites ou deportação. Este foi o levante urbano mais importante das Américas no século 19.
1835-1840
Cabanagem, PA
Lideranças negras como Félix, Cristóvão e Belizário tomam a frente de batalhões de escravizados e quilombolas nas lutas dos cabanos contra as tropas da Regência. Levantes no Acará e na Fazenda Pernambuco, propriedade Carmelita no Guamá, foram significativos.
1838
Vassouras, RJ
Em novembro, centenas de escravizados africanos e nascidos no Brasil dos cafezais de Manuel Francisco Xavier e Paulo Gomes de Ribeiro Avelar se reúnem nas matas de Paty do Alferes para formar um quilombo. Eram liderados pelo ferreiro Manoel Congo, também chamado de “pai” ou “mestre”, a quem atribuíam o poder de se tornar invisível.
1838-1841
Balaiada, MA
Escravizados, livres e quilombolas pegam em armas para lutar durante a revolta popular da Balaiada. Chegando a comandar cerca de 3.000 negros fugidos, o liberto Cosme Bento das Chagas se junta aos balaios e incentiva a insurreição nas fazendas maranhenses. Chagas se intitulava “tutor e imperador da liberdade”, chegando a fundar uma escola de ler e escrever no quilombo da Lagoa-Amarela, na comarca do Brejo.
1846
Recife, PE
Conspiração liderada por escravizados pertencentes à seita religiosa de Agostinho José Pereira, o chamado Divino Mestre. A polícia encontra na casa do pregador protestante uma bíblia em que estavam marcadas passagens sobre o fim da escravidão, textos sobre o Haiti e versos chamados de “ABC”. Agostinho alfabetizou muitos de seus seguidores.
1848
Ciclo de conspirações negras no Vale do Paraíba
Na fronteira entre as províncias do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, diversas conspirações foram descobertas. Em Vassouras, o movimento tinha origem num culto religioso centro-africano e de raízes kongo/Mbundu. Falava-se na intervenção de Santo Antônio enquanto os rebeldes de Itu invocavam a São Benedito. Marcada para o dia de São João, a revolta previa o envenenamento dos senhores e ligava-se às discussões sobre o fim do tráfico atlântico para o Brasil.
1849
São José do Queimado, hoje município da Serra, ES
Em 19 de março, Chico Prego, João da Viúva e Elisiário lideraram mais de 300 escravizados em revolta após uma promessa não concretizada de liberdade feita pelo missionário italiano Gregório José Maria de Bene. O frei iria negociar a alforria daqueles que trabalharam na construção de uma igreja inaugurada durante a festa de São José. A repressão foi violenta – fugitivos foram arrastados pelo chão por muitas léguas -, mas alguns sobreviventes fundaram o Quilombo de Rosa d’Água em Cariacica.
1853
Bahia e Pernambuco
Dados os fortíssimos rumores de conspiração em Salvador, alguns africanos libertos são presos e deportados por serem suspeitos. Em Pernambuco, nas vilas de Nazaré e Pau d’Alho, escritos árabes são encontrados entre a comunidade islâmica escravizada. O alufá Rufino José Maria (ou Abuncare) foi preso sob suspeita de participação na revolta.
1854
Taubaté, Pindamonhangaba e São Roque, SP
Em 17 de abril, dia de São Benedito, escravizados de Taubaté planejam atacar a praça da matriz, nomear um rei e seguir armados para Pindamonhangaba. Em São Roque, a revolta tinha raízes em comunidades religiosas onde rebeldes eram iniciados por “Pai Gavião,” um espírito que falava através do liberto africano José Cabinda.
1858
Santana do Livramento, RS
Escravizados em combinação com o negro castelhano Francisco Antonio Dias, conhecido como Antonio Barbat, planejam uma fuga em massa para o Estado Oriental (Uruguai). O sinal para que os rebeldes pudessem reconhecer uns aos outros seria o cabelo raspado à navalha na circunferência da cabeça.
1859
Capivari, Encruzilhada e Herval, RS
Em março, escravizados, desertores e criminosos fugidos planejavam atacar as vilas e fugir para o Estado Oriental (Uruguai).
1860
Itapemirim, ES
Em agosto, autoridades descobriram uma revolta organizada por homens e mulheres escravizados pertencentes às “Sociedades Pemba” nas fazendas da região.
1861
Anajatuba, Viana e Turiaçu, MA
Escravizados e libertos de Anajatuba planejam uma revolta inspirada na Guerra de Secessão nos EUA. Depois de ver navios americanos ancorados em São Luís, rebeldes param de trabalhar ao imaginar que tropas americanas viriam ajudá-los a conseguir a liberdade. Quilombolas de Turiaçu e Viana circulam informação sobre a guerra.
1862
Muribeca, PE
Insurreição planejada por escravos aquilombados dos Engenhos Guararapes, Conceição e Recreio. Muitos acreditavam que o governo imperial e a Inglaterra apoiariam sua luta pela liberdade e liam coletivamente os jornais da época.
1863
Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, Maranhão e Pará
Ciclo de conspirações negras em conexão à chamada Questão Christie. Escravizados planejavam lutar ao lado da Inglaterra numa eventual guerra contra o Brasil. Em Pelotas, o liberto Sebastião Maria foi preso por falar em ingleses contrários à escravidão. Em Campinas, uma insurreição foi sufocada na Fazenda Atibaia. Nas demais províncias, escravizados e quilombolas fogem em massa.
1863-1864
Taquari, RS
Insurreição planejada para o período eleitoral em novembro. Escravizados planejavam reunir-se no cemitério de onde arrancariam barras de ferro para usar como lanças e depois de atacar Taquari para conseguir dinheiro, armamento e fardamento oficial, finalmente fugindo “com os castelhanos” para o Estado Oriental (Uruguai).
1864
Serro e Diamantina, MG
Em outubro, artesãos das fazendas do Serro e escravizados das minas de diamante em Diamantina insurgiram-se em conjunto com o Quilombo dos Ferreiros e libertos. Inspirados pelas notícias vindas dos jornais a respeito da Guerra de Secessão nos EUA, os rebeldes resistiram ao cerco armado por dois meses em São João da Chapada. Entre os líderes, estavam a quilombola Vitorão, além do marceneiro José Cabrinha e o alfaiate Adão, ambos letrados e autores de cartas durante o levante.
1864-1865
Revoltas em fazendas da Ordem do Carmo, SP, PR e PA
Em maio, escravizados da Fazenda Capão Alto, na vila paranaense de Castro, recusaram-se a acompanhar o representante de novos arrendatários para São Paulo. Em dezembro, cativos da Fazenda Gaecá, perto de São Sebastião, atacaram a sede por desconfiar que seriam vendidos “para serra acima” pelo administrador. Em julho de 1865, na Fazenda Pernambuco, arredores de Belém, escravizados atacaram o feitor e se aquilombaram, influenciados por notícias sobre a Guerra de Secessão nos EUA.
1865
Minas Gerais
Os cativos falam “em liberdade, em Lopez do Paraguai, e muitas outras coisas perigosas.” Mais de 20 conspirações negras ocorreram na província, em conexão com a Guerra do Paraguai, incluindo novamente o Serro.
1867
Viana, MA
Insurreição quilombola liderada pelos escravizados do mocambo São Benedito do Céu, nas matas de Viana e Turiaçu. Em julho, inspirados na Guerra do Paraguai, incendiaram as fazendas Timbó, Santa Bárbara e Santo Inácio. Os quilombolas esperavam o apoio dos índios Gamela e forçaram um feitor a escrever uma carta para as autoridades maranhenses onde diziam “nos achamos em campo a tratar da Liberdade dos Cativos, pois a muito que esperamos por ela.”
1868
Porto Alegre, RS
Revolta organizada para eclodir na noite de São João, em junho. Os rebeldes planejavam atacar a cidade divididos em quatro divisões de lanceiros, visando o Quartel da Guarda Nacional, o Laboratório Pirotécnico e o Arsenal de Guerra. Prisioneiros de guerra paraguaios foram contatados pelos escravizados.
1871
Rio de Janeiro, Espírito Santo, São Paulo, Maranhão e Minas Gerais
Conspirações em conexão com a passagem da Lei do Ventre Livre. No Rio, na fazenda de João de Souza Botelho, escravizados exigem pagamento de salários a título de se acharem forros. Em Turiaçu, Santa Helena e São Bento, MA, outros fogem em massa para os quilombos. Por se acharem libertos, escravizados planejam levantes em Queimado, Mangaraí, Cachoeiro de Itapemirim e Cariacica, ES. Em SP, rumores se espalham em Espírito Santo do Pinhal e São Roque. Em MG, escravizados de fazendas de Sabará, Caeté, Jaguari, e Leopoldina se rebelam. Em Santa Luzia, os rebeldes pretendiam “gritar a República e ficarem forros.”
1881
Resende, Areas, Bananal, Silveiras e Queluz, RJ e SP
Em março, uma revolta é descoberta na Freguesia de Campo Belo, em Resende, de onde se espalha para várias fazendas na fronteira entre Rio e São Paulo. Três homens brancos são indiciados ao lado dos escravizados que pretendiam ir à Corte Imperial “gritar a liberdade.”
1882
Campinas, SP
Liderados pelo liberto Felipe Santiago, os 120 escravizados da Fazenda do Castelo, em Campinas, rebelam-se aos gritos de “Mata branco” e “Viva a Liberdade,” matando a família do administrador da fazenda. A revolta estava ligada a uma sociedade de cunho milenarista chamada “Arasia.” Setenta e quatro suspeitos foram presos.
1885
Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul
Em setembro, descobre-se uma insurreição escrava influenciada por uma sociedade secreta abolicionista chamada “Incógnito.” Com sede na Corte, a sociedade esperava obter participação popular em várias províncias. Os rebeldes diziam contar com o apoio do Imperador, figuras políticas e do Conde d’Eu. No Natal de 1885, focos de revolta aparecem em Limeira, Mogi Mirim e Casa Branca, SP, onde os escravizados diziam seguir o Rei Pilintra.
1887-1888
São Paulo e outras províncias
Ciclo de revoltas, fugas em massa das fazendas, aquilombamento, marchas e confrontos em vilas paulistas. Em Araras, por exemplo, os escravizados da Fazenda Empíreos apresentam-se ao Juiz de Órfãos reivindicando liberdade, salários e boa alimentação. Revoltas se espalham pelo Brasil representando a crise final do escravismo.

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