Ainda há oportunidades para a atuação da igreja no Rio
Grande do Sul?
Há uma tendência natural de desmobilização após a fase aguda
das tragédias. A etapa seguinte é o nosso maior desafio!
Por Cassiano Luz
“Meu Deus, não sobrou nada... Por que tanto sofrimento...?”.
As palavras de Dona Gladis, viúva e trabalhadora braçal, ecoam na minha mente
desde aquela manhã de domingo, quase três meses atrás. Sua casa, em Cruzeiro do
Sul, RS, foi uma das 1.294 destruídas pela cheia do Rio Taquari, no início de
maio. Ela esperava encontrar qualquer coisa entre os escombros para guardar de
lembrança, mas só havia restos de tijolo e ferro retorcido.
Estamos completando três meses de resposta emergencial ao
desastre no Rio Grande do Sul, possivelmente a maior tragédia climática da
história do estado. Desde o alerta vermelho em 29 de abril, mais de 90% dos
municípios gaúchos foram afetados, com mais de 160 mortes e quase 100
desaparecidos. Estima-se que mais de meio milhão de pessoas foram impactadas.
Em visita recente ao Centro de Monitoramento de Alertas e
Desastres Nacionais, o CEMADEN, fomos alertados sobre o aumento dos eventos
climáticos extremos. O CEMADEN tem recebido pastores e influenciadores cristãos
para conscientizar sobre essa realidade crescente. Em nossas igrejas há uma
tendência de ideologização do tema, mas estamos lidando com um fato. Não se
trata de se teremos outra tragédia, mas quando e onde será.
Qual é o papel da Igreja de Jesus Cristo diante dessa realidade?
Identifico três posicionamentos comuns:
1. Mobilização e socorro: Com o apoio e protagonismo das
igrejas, neste período a Aliança Evangélica Brasileira recebeu e distribuiu
doações em mais de 35 caminhões e carretas, mobilizou mais de 1200 voluntários
de 22 estados, realizando mais de 2.900 acolhimentos, distribuindo mais de 120
toneladas de alimentos, realizando mais de 1.100 atendimentos de saúde, entre
muitas outras ações. O cenário de tragédia tem sido uma oportunidade para o
evangelho ser anunciado através das ações de misericórdia.
2. Socorro prioritário aos da fé: Alguns interpretam Gl 6.10
como a obrigação de socorrer primeiro aos irmãos na fé. O Aliança LAB tem se
debruçado sobre o cenário da igreja evangélica brasileira, que é predominantemente
pequena, pobre e periférica. Esse é o perfil de inúmeras igrejas atingidas
nesta tragédia, algumas totalmente destruídas. O programa Aliança pela Vida já
assistiu diretamente 224 igrejas que sofreram grandes perdas no Rio Grande do
Sul, e está iniciando uma campanha de apoio para famílias pastorais.
3. Não envolvimento: Há os que optam por não se envolver.
Destes, tenho ouvido diferentes argumentos, inclusive teológicos, dando conta
de que “o mundo jaz no maligno” (1Jo 5.19) e não valeria a pena empreender
esforços em prol do cuidado da criação, que preveniria a ocorrência e
intensidade destes desastres, a influência na gestão pública, manejo das
cidades e outras formas de prevenção, além dos esforços necessários para
socorro daqueles que foram duramente atingidos pelas tragédias.
Ouvi de um pastor, cujo prédio da igreja se tornou abrigo,
que não via a hora de a igreja ser liberada para “voltar a ser igreja”.
Sigo me perguntando: qual é o papel da igreja de Jesus
diante de toda essa realidade?
Há uma tendência natural de desmobilização após a fase aguda
das tragédias. A mídia é tomada por outras notícias, as pessoas esquecem. Por
isso, o período que chamamos de “fase 2”, acaba se tornando nosso maior
desafio!
Muitos moradores de cidades do Rio Grande do Sul seguem em
abrigos e há pouca perspectiva de reconstrução de infraestrutura e apoio às
famílias mais afetadas. A Aliança Evangélica tem o compromisso de permanecer no
estado, atuando na reconstrução, em parceria com o poder público, e colaborando
no planejamento e adaptações para prevenção de futuras tragédias. Você e sua
igreja podem fazer parte contribuindo pelo pix@aliancaevangelica.org.br e
enviando equipes de voluntários, que poderão contribuir de diferentes formas,
presencial ou remotamente.
Cassiano Luz, diretor executivo na Aliança Evangélica
Brasileira. @aliancaevangelicabr.
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