Ele estava na Suíça para o lançamento do mais
recente livro, As 5 faces do perdão, quando começou a receber, por
mensagens, os próprios vídeos. Eram de uma entrevista feita em novembro do ano
passado que viralizou nos últimos dias. O psicólogo clínico por formação
Rossandro Klinjey, de Campina Grande (PB), começou a carreira como professor
universitário, descobriu um talento para falar em público e, desde então,
trabalha como palestrante em escolas, empresas e órgãos públicos.
Aos poucos, expandiu o trabalho para os livros e
também para as redes sociais, onde acumula quase 100 mil seguidores. Klinjey
conta que o objetivo era trazer o universo do “mundo emocional” para palestras
e livros que pudessem ser compreendidos por qualquer pessoa.
Como o senhor trabalha esse fenômeno das redes
sociais?
Penso no bem estar que essa informação poderia
provocar nas pessoas que não estão perto de mim. A informação não é minha, não
criei nada disso, é o que dizem as pesquisas e a ciência. Mas trago o conteúdo
de uma forma palatável e compreensível. Falo bastante de coisas que mudaram
para melhor na família, como o diálogo e paz, mas coisas que precisam
continuar, como respeito.
Rede social é um ambiente neutro como outros, pode
ser um instrumento para o que quiser, desde instruções para fazer uma bomba do
ataque terrorista de um lobo solitário até melhoria de vida. Depende de como você
usa essa ferramenta. A educação dos filhos é uma demanda crescente no mundo
ocidental. Percebo o quanto os pais estão perdidos, desde a geração de 1980 pra
cá. E o preço disso é muito alto.
Quais são as dificuldades de trabalhar nessa área?
A vida é mais fácil do que as pessoas falam. Não
sei se sou positivo demais. Coisas acontecem comigo sem que eu faça esforço
muito grande, para ser sincero. Maior dificuldade foi ser visto continuando na
minha cidade. Morar em Brasília ou São Paulo talvez fosse mais viável devido ao
aeroporto, mas aqui [Campina Grande] estão minha esposa, as pessoas que amo. O
reabastecimento afetivo não posso levar comigo, preciso de raiz porque árvore
não sobe sem raiz, a raiz me nutre.
Sinto uma reação irônica ao sotaque mas ao final as
pessoas esquecem de onde eu sou. Hoje não me sinto afetado pelo preconceito, é
só uma preconcepção, ignorância no sentido de ignorar e desconhecer, mas aí
conhecem e entendem. Perguntam se onde eu moro tem Coca-Cola, se ando de carro.
Hoje vejo isso como brincadeiras, é mais cômico do que trágico.
Como é a rotina de palestrante?
As pessoas veem só o lado glamuroso, mas não veem
os voos com horários complexos, a ausência em casa, o dormir pouco. A parte
cansativa é mais física. Emocionalmente é muito rico, encontro amigos em vários
lugares, aprendo em cada palestra, conheço pessoas incríveis. Sou um jovem do
interior da Paraíba e o Nordeste é muito discriminado, por isso eu não
subestimo inteligência de ninguém. Dou a mesma palestra nos Estados Unidos e na
minha cidade, porque todo canto tem gente inteligente que merece respeito. Ser
de uma região discriminada traz esse benefício.
Como o senhor decide o tema dos vídeos?
Decidi os temas dos primeiros vídeos, depois perguntei
o que as pessoas acharam, o que queriam ouvir. A interação é grande na
internet, as pessoas mandam muitos temas, então eu listo esses conteúdos. E
quando acontece um evento mais incisivo, procuro produzir um vídeo que
reverbere.
A educação é um tema muito frequente dos seus
vídeos e palestras. Por que o senhor trabalha com esse assunto?
Por efeito dominó, quando a família não dá certo,
isso repercute na escola e na sequência, pelas falhas e gaps morais que as
famílias têm dado aos filhos, as crianças não respeitam educadores e a
educação. Como reverberação disso no mundo do trabalho e na sociedade em geral,
vemos pessoas sem compromisso e sem ética. Falo para os pais que ainda dá
tempo: é preciso força, energia e investimento emocional, mas ainda dá tempo de
resgatar os filhos.
O senhor mencionou falhas e gaps morais na educação
dos filhos. Pode dar algum exemplo?
Quando os pais não explicam para a criança que ela
não pode ter tudo o que quer no tempo que ela quer, não ensina as frustrações.
E pessoas assim não desenvolvem imunidade. Fazendo uma analogia, nos Estados
Unidos, por exemplo, eles usam muito álcool gel e lá pipocam as doenças
autoimunes. As crianças têm sistema imune deficiente porque não foram expostas
às bactérias na época certa. Isso é como não ouvir “não” na infância.
As pessoas que não aprendem normas do cotidiano se
tornam incapazes de respeitar qualquer norma e frustração. Há loucura de
imaginar que todo mundo tem que ser feliz e ter tudo o que querem. Pais cobrem
de amor entre aspas, mas é um amor doente
Quais são as perguntas e problemas que te trazem
com mais frequência?
No ambiente corporativo, é convivência, ética, a
ideia de competência técnica, compromisso. E a meritocracia, que hoje é vista
mais com um viés político e de ideologia, mas falta entender que de fato
precisamos entregar resultados.
Nas escolas, os professores sentem angústia, sentem
que falam para o nada e que esta geração tem indiferença com as aulas, olham
com entojo. Muitos professores se afastam por depressão. Gosto de ir às escolas
porque digo coisas que a escola não pode. Falo das teorias e da experiência
prática, de exemplos do cotidiano do que vai refletir no futuro. Muitos pais
ficam chocados, mas acho isso positivo, porque eles tomam medidas que mudam o
comportamento dos filhos. Sempre digo aos pais que tiveram relação difícil com
os próprios pais que o pior erro é esquecer a educação que os tornou quem são.
Você tem que fazer adequações ao tempo, história e cultura, mas não abrir mão
de tudo. Algumas coisas são perenes para o essencial da construção da família.
Qual é o tema mais difícil de abordar?
Perdão. É um tema difícil porque as pessoas sabem
muito do ponto de vista filosófico e teórico, mas perdem o foco do perdão na
vida. É uma escolha emocional e tratar isso de uma perspectiva racional não faz
a pessoa mudar. Eu acho interessante falar o que não é perdoar. Perdoar não é
esquecer, nesse caso você só ressignifica a cena. Perdoar não é deixar de
sentir dor. Por exemplo, a Cissa Guimarães pode ter perdoado o jovem que matou
o filho dela, mas ele não volta, a saudade continua… Ela mostra que conseguiu
seguir a vida, perdoar, como se dissesse: “Você tirou de mim muita coisa, mas
não tira isso também, não tira a minha dignidade”. Perdoar também não é
concordar com o que o outro fez. Você pode perdoar e chamar a polícia no caso
de um crime, não pode eximir o outro de responsabilidade, porque assim não
contribuiria para o crescimento emocional da pessoa.
Os estudos da psicossomática, ciência que une
psicologia e medicina, mostram o quanto o comportamento imprime no organismo
certas doenças. Quando você arquiva e rescinde, imprime cotidianamente. Essa é
uma escolha que é dolorosa e compreensível, mas atinge muito quem está
sentindo, não quem provocou.
Qual mensagem final o senhor quer deixar?
Acho que o que me chamou atenção quando comecei a
assistir a muitas palestras é que vejo pessoas como o Mário Sérgio Cortella
virando YouTuber e penso que o país está mudando. Vejo professores virando
fenômeno da internet, o país está mudado. Estes são sinais positivos mas não
definitivos, ainda temos uma longa caminhada, mas o país finalmente resolve
encarar. Quero ser apenas alguém que contribui com isso, independente do nível.
Quero ser brasileiro, morar aqui, construir aqui a dignidade e a segurança que
vemos lá fora.
https://youtu.be/NiQQ9Mn-d5l
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