“Sede
meus imitadores, como também eu sou de Cristo” (1 Cor. 11:1)
O
apóstolo Paulo é, na minha opinião, um dos homens mais extraordinários de todos
os tempos, pois revolucionou o mundo greco-romano com a mensagem do Evangelho e
continua, através dos seus escritos, a exercer uma enorme influência na igreja
e na sociedade. Podemos conhecê-lo através das 13 cartas que escreveu e do
livro dos Atos, onde a partir do capítulo 9 ele é o principal protagonista
humano. O seu nome judaico era Saulo, mas ele preferia usar o seu nome romano
Paulo (Paulus), que curiosamente não era o seu primeiro nome mas sim o
sobrenome, ou seja, o nome da família.
Paulo
era um homem cheio de energia, que provavelmente não se distinguia dos outros
homens do seu tempo pelo seu aspeto físico, mas possuía uma mente brilhante,
que não ficava atrás dos grandes filósofos da Antiguidade como Platão ou
Aristóteles. Falava várias línguas, nomeadamente grego, aramaico, hebraico e
talvez algum latim, e tinha gosto em escrever e ensinar. Ensinava muitas vezes
horas seguidas, até de madrugada (cf. At. 20:7).
Era
judeu de nascimento, da tribo de Benjamim, pertencia a um grupo religioso – os
fariseus (cf. Fil. 3:5), conhecidos pelo seu legalismo e sectarismo, pensando
que podiam alcançar a salvação e o favor de Deus através do cumprimento
escrupuloso da lei de Moisés e de um conjunto de regras e tradições que eles
próprios criaram ao longo dos séculos. Paulo foi um aluno dedicado de um dos
rabis mais ilustres e estimados do seu tempo chamado Gamaliel (cf. At. 22:3), e
era um homem profundamente religioso, que não se distinguia dos outros
fariseus, que poucos anos antes tinham sido responsáveis pela condenação de
Jesus à morte, e a prova disso é que participou na morte por apedrejamento de
Estevão, o primeiro mártir do cristianismo (cf. At. 7:58, 8:1).
Era
também cidadão romano por ter nascido na cidade de Tarso, atual Turquia (cf.
At. 22:3). Foi na cidade de Tarso, uma importante cidade comercial do Império
Romano, que Paulo aprendeu a arte de fazer tendas, que era provavelmente o
negócio da sua família, e que continuou a ser a sua principal fonte de
rendimentos ao longo da sua vida. Tarso era também um centro académico,
nomeadamente na área da filosofia, para onde tinham emigrado muitos filósofos
de Atenas cerca de 100 anos antes.
O
momento determinante na vida de Paulo aconteceu na estrada de Damasco, quando
se deslocava para essa cidade da Síria, onde havia uma comunidade judaica
numerosa, para prender os cristãos, acusados de heresia por anunciarem que
Jesus era o Messias, que Ele era Deus, que tinha sido morto numa cruz mas
ressuscitado ao terceiro dia. Nessa estrada, Paulo teve uma visão em que Cristo
lhe apareceu (Atos 9:2-6). Nessa ocasião, Paulo descobriu que o Senhor estava
vivo, tinha realmente ressuscitado, e como refere o teólogo Tom Wright, deixou
de ser um zeloso perseguidor dos seguidores de Cristo para passar a ser, ele
próprio, um zeloso seguidor de Jesus Cristo.
A
partir desse momento, a missão de Paulo na vida foi percorrer inúmeras cidades
do Império Romano, na primeira iniciativa missionária de todos os tempos,
anunciando que Jesus Cristo era o Messias que Deus tinha prometido enviar (cf.
At. 9:15).
Depois
do seu encontro com Cristo, Paulo passou de perseguidor a perseguido, correndo
o risco de ser morto pelos seus antigos amigos judeus (cf. At. 9:23-25). Mas
agora a sua vida tinha sido transformada por Jesus e ele estava disposto a
sacrificá-la pelo seu Senhor, conforme escreveu na carta aos Gálatas (2:20):
“Portanto, não sou mais eu quem vive, mas é Cristo quem vive em mim. E essa
vida que vivo agora no corpo, vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e se
entregou por mim”. Paulo estava preparado para morrer. E o mais extraordinário
é que, apesar do sofrimento, perseguição violenta e prisão, que experimentou em
várias ocasiões, das muitas tareias que levou e em alguns casos estar à beira
da morte (1 Cor. 11:23-27), Paulo continuou a amar os que o queriam matar,
sendo obediente ao mandamento do Senhor de amor ao próximo e não desistiu da
missão de que foi incumbido de anunciar o Evangelho.
A
mensagem que Paulo anunciava era sempre a mesma, em todos os locais: “Cristo
morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, foi sepultado, e
ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras” (1 Cor. 15:3-4). É este o
resumo da mensagem do Evangelho, tão simples que até uma criança a pode
entender, mas ao mesmo tempo incompreensível para sábios e inteligentes, se o
Espírito Santo não iluminar o seu entendimento.
Esta
mensagem da cruz era uma loucura no tempo de Paulo, e continua a ser em todos
os tempos (cf. 1 Cor. 1:18). Para os judeus, anunciar que Jesus era o Messias
esperado, que tinha sido morto numa cruz romana era inconcebível. Para os
gentios, no antigo império romano, anunciar que um judeu era o Rei dos Reis e
Senhor dos Senhores já era bastante ruim, porque os judeus de uma maneira geral
não eram bem vistos nas sociedades politeístas e idólatras do mundo antigo, sem
limitações de natureza moral. Além disso, anunciar que esse judeu especial
tinha sido crucificado, sendo a crucificação a forma mais vergonhosa e
desonrosa de morrer, era também inconcebível para os pagãos.
Paulo
era um homem de fé incondicional em Deus, e por isso realizou muitos milagres,
em nome de Jesus. Estão registadas várias curas e milagres no Novo Testamento
que se realizaram por seu intermédio, como a cegueira de Elimas, um mágico que
se estava a opor à proclamação do Evangelho (At. 13:8-11), a cura de um
paralítico de nascença, em Listra (At. 14:8-12), a expulsão de um demônio de
uma jovem escrava, que predizia o futuro (At.16:16-18), a ressurreição de
Eutico, um jovem que adormeceu e caiu de uma janela e morreu, enquanto Paulo
pregava, mas que voltou a viver e não ficou com sequelas do seu traumatismo
(At. 20:9-10), a picada de uma víbora, na ilha de Malta, não lhe causou dano
(At. 28:3-5), e o pai de Públio e outros doentes de Malta foram curados (At.
28:7-9). “Deus fazia milagres extraordinários por meio de Paulo, de modo que
até lenços e aventais que Paulo usava eram levados e colocados sobre os
enfermos. Estes eram curados de suas doenças, e os espíritos malignos saíam
deles” (At. 19:11-12), mas houve momentos na sua vida em que experimentou
sofrimento e desânimo, e refere ter um “espinho na carne” (2 Cor. 12:7), que
não sabemos se era uma doença física, como problemas de visão ou epilepsia, ou
alguma tentação, e não foi curado, para melhor experimentar a graça de Deus (2
Cor. 12:7).
Paulo
era um homem que conhecia e amava a Palavra de Deus. A principal fonte de
revelação de Paulo eram as Escrituras hebraicas, o nosso Antigo Testamento, que
ele conhecia desde a sua infância, o testemunho oral de outros cristãos e a
revelação direta de Deus. Pensa-se que o Evangelho de Marcos, o primeiro dos
quatro Evangelhos a ser escrito, foi concluído por altura da provável morte de
Paulo, por ordem do imperador romano. Por isso, durante a sua vida, ele só teve
acesso a poucos textos que constituem o Novo Testamento, além dos que ele próprio
escreveu, e por isso nós somos privilegiados, em relação a Paulo, por termos
acesso a toda a Palavra revelada de Deus, do Antigo e Novo Testamentos.
Paulo,
que viveu numa altura em que a filosofia grega era conhecida e valorizada no
Império Romano, certamente estaria de acordo com esta afirmação de A. W. Tozer:
“Um só dos eloquentes capítulos de Isaías ou dos inspirados Salmos de David
contêm mais ajuda real para a humanidade que toda a produção das mais
extraordinárias mentes da Grécia durante os séculos da sua glória”.
Paulo
era claramente um homem de oração. Todas as suas cartas demonstram o elevado
valor que ele colocava nessa disciplina espiritual. Ele exortou os crentes de
Tessalónica a “orarem sem cessar” (1 Tes. 5:17), porque estava perfeitamente
consciente que a oração é vital para cada cristão e uma arma eficaz na batalha
contra o Inimigo (Ef. 6:12).
Paulo
era também um homem que amava profundamente a Deus e ao próximo. Apesar da sua
autoridade e influência como apóstolo, e dos muitos milagres que Deus realizou
por seu intermédio, era um homem humilde, que amava os outros com um amor
genuíno. São muitas as manifestações do amor e afeto de Paulo pelos outros que
encontramos nas Escrituras (p. ex. 1 Tes. 2:7-8, Fil.1:8, 2 Tim. 1:4), além de
ser o autor do belíssimo trecho de 1 Coríntios 13, sobre a centralidade do amor
na vida do cristão.
É claro
que não era perfeito. Também houve momentos em que teve algumas zangas e
discussões, nomeadamente com Pedro (Gal. 2:11-14) e Barnabé (At. 15:36-39). Mas
era alguém que sabia amar e perdoar, pois Deus transformou o seu coração duro e
cheio de ódio quando perseguia os cristãos, num coração semelhante ao do Seu
Senhor Jesus Cristo. Por isso escreveu ao seu discípulo Timóteo, no final da
sua vida, quando estava de novo na prisão por causa do Evangelho: “Combati o
bom combate, acabei a carreira, guardei a fé” (2 Tim. 4:7).
A unção
de Deus que estava sobre Paulo está ao dispor de cada um de nós. Mas será que
estamos dispostos a pagar o preço?
Bibliografia
[1]
Bruce, F. F. Paulo o apóstolo da graça: sua vida, cartas e teologia. Edições Vida Nova, 2003.
[2] Longman III, Tremper (Ed). The Baker Illustrated
Bible Dictionary. Baker Publishing Group, 2013.
[3] Piper, John. Why I love the apostle Paul: 30
reasons. Crossway,
2019.
Wright,
N. T. Paulo: Uma Biografia. Thomas Nelson Brasil, 2018.
Jorge
Cruz é médico especialista em Angiologia e Cirurgia Vascular, doutor em
Bioética, membro do Comitê de Países de Língua Portuguesa da International
Christian Medical & Dental Association (ICMDA), membro honorário da
Associação Cristã Evangélica de Profissionais de Saúde (ACEPS-Portugal), membro
do Conselho Internacional da PRIME – Partnerships in International Medical
Education. Mora em Porto, Portugal.
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