Como pais de quatro filhos, eu e minha esposa
estudamos diversos livros sobre o assunto e tivemos contínua oportunidade de
praticar a criação bíblica de filhos ao longo de 30 anos de casamento.
Resolvemos, então, compartilhar um pouco desse aprendizado com você. Vamos
iniciar com os fundamentos da educação de filhos.
Para a edificação geral dos filhos, é essencial que
construamos a vida deles sobre a base da Palavra de Deus. Vemos isso claramente
em 2Tm 3.15-17:
… desde a infância, sabes as sagradas letras, que
podem tornar-te sábio para a salvação pela fé em Cristo Jesus. Toda a Escritura
é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção,
para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e
perfeitamente habilitado para toda boa obra.
Embora esta passagem específica seja mais geral
(aplica-se à missão do pastor na edificação dos crentes), ela revela o processo
divino de instrução e deve ser aplicada pelos pais aos seus filhos. Só a Bíblia
pode gerar pessoas que conhecem o caminho para a salvação (v. 15), que buscam
viver uma vida justa (v. 16), e que são habilitadas para toda boa obra
determinada por Deus (v. 17; cf. 2.21; Ef 2.10). Focaremos aqui no versículo
16, que nos apresenta a sequência bíblica de ensino, repreensão, correção e
educação na justiça. Neste processo de formação dos filhos, o par inicial de
palavras (ensino e repreensão) trata das crenças e ideias, das questões mais
teóricas. A segunda dupla de vocábulos (correção e educação) trata da conduta
de vida, das questões práticas do dia-a-dia. Desta forma, a educação dos filhos
abrange tanto teoria quanto prática.
Vamos examinar esses passos mais de perto.
Os quatro passos da educação de filhos
Assim, o primeiro passo é o ensino dos princípios de
Deus para a vida. O ensino ou doutrinação (didaskalia) visa instruir qual o
caminho a seguir por meio do conteúdo das Escrituras e do exemplo dos que
viveram antes. É o que Paulo afirma: “tudo quanto, outrora, foi escrito para o
nosso ensino foi escrito” (Rm 15.4; cf. 1Co 10.11). É o aprendizado da Torá
(que significa instrução) recomendado ao justo (Sl 1.2; Js 1.7-8). Desde os
cinco anos de idade, os pais judeus inculcavam a Escritura em seus filhos;
obviamente, o foco principal estava na Torá (o nosso Pentateuco), que é o
centro e o fundamento do Antigo Testamento. Por isso Paulo exorta Timóteo a
permanecer firme naquilo que havia aprendido desde a infância (2Tm 3.14-15).
Este ensino da “sã doutrina” não é simplesmente
decorar o catecismo ou algum sistema doutrinário; é o ensino prático da verdade
de Deus. A preocupação dos pais deve ser de levar a criança a compreender o
caráter de Deus revelado nas Escrituras e o seu propósito eterno de nos tornar
semelhantes a seu filho Jesus (Rm 8.29). Isso inclui questões mais abstratas (à
medida que a criança cresce), mas deve ser uma instrução muito direta sobre
como a vida deve ser vivida. Em especial, as narrativas do AT revelam muito
sobre quem é o nosso Deus e o que ele espera de nós. Se você tiver acesso à língua
inglesa, há uma rica disponibilidade de ficção bíblica que ajuda os pais a
contarem as histórias bíblicas aos seus filhos. Podemos lhe recomendar bons
autores.
O segundo passo é a repreensão (elegmós). Ela visa
mostrar a alguém seu pecado e convocá-lo ao arrependimento (1Tm 5.20); Paulo
expande esse conceito em 2Tm 4.2 (prega, corrige, exorta, repreende). O foco
aqui está em refutar o erro teórico, a confusão de conceitos, a incapacidade de
aplicar o ensino recebido e levar à consciência do próprio erro. Essa exortação
é uma argumentação verbal que dissipa dúvidas sobre o que é certo e errado,
estimulando o ouvinte a seguir o que é justo (Tt 1.13; 2Tm 2.24-26). Os pais
devem admoestar oralmente seu filho, deixando claro que ele está agindo
incorretamente e lembrando-o do ensino recebido antes. Por outro lado, é
preciso recordar que o convencimento do pecado é uma operação do Espírito Santo
(Jo 16.8); devemos ser sensíveis à sua direção para podermos ser usados
graciosamente por ele para esse fim. Diversos princípios bíblicos adicionais
sobre a repreensão sábia se aplicam aqui; examinaremos alguns em outro momento.
O terceiro passo é a correção ou aperfeiçoamento
(epanórthosis). Essa palavra enfatiza a parte comportamental daquilo que é
verbalizado na repreensão. Significa uma restauração ao caminho correto, uma
mudança de conduta. A correção deve tirar a criança da prática do erro e
trazê-la de volta à prática do que é reto. Isto é, não basta indicar à criança
qual foi o erro, mas é necessário lhe dar passos concretos de retorno ao
procedimento acertado. Deus usa a disciplina para que seus filhos andem na luz
(2Tm 2.25; Pv 3.11-12). É nesse acerto comportamental que se encaixa a possível
aplicação do castigo físico, que trataremos depois.
O último passo é a educação (paideia) na justiça.
Essa educação é o treinamento prático, moral e diário que produz um caráter
justo e santo (e que é fruto da graça divina, Tt 2.12). Paulo está nos dando o
caminho para a criação de filhos virtuosos (paideia é o mesmo termo que ele usa
em Ef 6.4: “criai-os na disciplina… do Senhor”). A cada circunstância diária,
devemos treinar a criança a fazer escolhas sábias, fortalecer suas virtudes e
mortificar sua propensão ao mal. Esse é o ponto culminante do processo que
começa com a parte teórica e se realiza no ensino prático sobre a vida.
Deste modo, a parte inicial e muito importante da
educação dos filhos é o ensino da verdade (parte positiva) e a refutação do
erro (parte negativa). A segunda parte, porém, não é menos importante; consiste
na mudança de conduta e na disciplina de um viver justo. Do mesmo modo, ela
envolve uma parte negativa (a mudança da conduta errada) e uma positiva (a
formação do caráter virtuoso). É por isso que Paulo pode afirmar que a Bíblia é
“útil” para a formação do ser humano. Ela é proveitosa para gerar vida
abundante hoje e eternamente (1Tm 4.8).
Aplicação do processo no cotidiano
Tudo isso é muito instrutivo. Mas dá para ser um
pouco mais específico?
O processo de educação dos filhos começa muito antes
de você pensar em tê-los. É necessário viver uma vida baseada na Palavra de
Deus para poder edificar os filhos sobre este mesmo fundamento. Então, em
primeiro lugar, faça uma análise da sua própria vida e entre na “escola de
Deus”. Você só poderá ensinar aos seus filhos aquilo que está praticando na sua
vida, pois as crianças já nascem com um radar para detectar hipocrisia.
Considerando que você tenta seguir os princípios
bíblicos na sua vida, a cada situação vivida com seus filhos, siga estes
passos:
Ensine o que a criança deve fazer (Pv 22.6). Isso é
tão óbvio que parece dispensável comentar. Contudo, muitos pais parecem
imaginar que seu filho saberá fazer as escolhas corretas intuitivamente. Mas,
se você não ensinou o que fazer, como pode esperar que ele faça a escolha
correta? Ainda que Deus possa usar muitos meios para educar o seu filho, a sua
missão sacerdotal como pai e mãe é a de ensinar o caminho correto quantas vezes
for preciso, de forma insistida, repetida, passo a passo. Foi para isso que o
Senhor entregou essa criança aos seus cuidados. Você deve ensinar pelo exemplo
(sempre a parte mais importante e mais efetiva) e pela instrução verbal e
comportamental. Isso funciona para todas as idades.
Repreenda a conduta errada várias vezes, instruindo
o seu filho verbalmente a voltar ao caminho ensinado antes. Quando você percebe
que há intencionalidade no erro da criança, então a desobediência já não é por
ignorância ou falta de lembrete. É necessário fazer uma correção de conduta.
Nessa exortação, busque entender as motivações do seu filho, demonstradas pela
sua atitude (aprenda a ler as entrelinhas da ação externa).
Corrija o comportamento errado. Após o ensino e a
repreensão, é necessário haver correção de conduta. Aqui há abordagens variadas;
a antiga e tradicional é o uso da vara. Contudo, diante da realidade atual,
esse tema precisa ser discutido mais longamente, o que faremos em outro momento
e com mais detalhes. De qualquer forma, é necessário impor medidas restritivas
e/ou corretivas que, de um modo muito prático, indiquem à criança que seu
comportamento está incorreto e não pode ser validado por Deus e por seus pais
(que são os agentes imediatos de Deus na vida do filho).
Relembre constantemente qual é o alvo maior: seu
objetivo é formar em seu filho um caráter justo, santo e amoroso, como o do
nosso Senhor Deus. A educação dos filhos não visa torná-los bem sucedidos na
vida segundo o padrão do mundo, mas sim bem sucedidos segundo o padrão das
Escrituras. Você precisa constantemente reavaliar qual é o paradigma que você
está aplicando para ensinar seus filhos no dia-a-dia.
Depois de fazer isso uma vez, como ensina o rótulo
do xampu, lave, enxágue e repita… 😊
Considerações finais
A educação dos filhos é uma missão muito importante
dada a você; essa missão só cede prioridade a dois outros relacionamentos: o
com o próprio Deus e o com o seu cônjuge. Lembre, como indicado antes, que você
só pode edificar o seu filho se você mesmo está dentro do processo bíblico de
transformação de caráter. O ensino hipócrita (que não pratica o que afirma) é
um instrumento certeiro para gerar em seu filho um coração rebelde e
angustiado; muitas vezes isso só se revelará na adolescência ou na juventude.
O processo de educar filhos também é uma das
provações da vida! Por meio desse processo Deus transforma o caráter dos pais e
nos torna muito, muito mais humildes. Pessoas sem filhos geralmente têm muitas
soluções para os problemas dos filhos dos outros. Os pais novos, embora se
sintam perdidos às vezes, frequentemente acham que sabem o caminho. Os pais
mais antigos, com filhos adultos, admitem – quando se permitem ser sinceros –
que tomaram decisões erradas e que agiriam melhor com o conhecimento obtido com
a experiência. Lidar com filhos nos ensina que somos frágeis, inseguros e
insensatos; carecemos constantemente da graça e do fortalecimento do Senhor.
Todavia, esse é o paradoxo: só aprendemos a educar os filhos ao educá-los! O
único meio de errar menos neste processo é confiar nas diretivas apresentadas
na Palavra de Deus.
Se você tem dúvidas e dificuldades nesta área,
busque ajuda com os pastores e com os líderes de sua igreja!
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