Nascimento ל
17 de
novembro de 1896
Orsha,
Império Russo
(atual
Bielorrússia)
Morte 11 de junho de 1934 (37 a
Lev
Vygotsky
nos)
Moscou,
União Soviética.
Sepultamento Cemitério Novodevichy.
Nacionalidade russo e soviético
Cidadania Império Russo, União Soviética
Cônjuge Roza Noevna Vygodskaia
(nascida
Smekhova)
Alma
mater Universidade Imperial de
Moscou (1917, inacabado)
Universidade
Popular de Shaniavskii da Cidade de Moscou.
Ocupação psicólogo.
Empregador(a) Psychological
Institute of the Russian Academy of Education, Institute of Correctional
Pedagogy, Krupskaya Academy of Communist Education, Second Moscow State
University, Universidade Estatal de Moscovo
Orientado(a)(s) Alexander Luria, Alexei Leontiev
Instituições Universidade Estatal de Moscovo
Campo(s) psicologia, paidologia, defectologia e
crítica literária
Causa
da morte tuberculose
Lev
Semionovitch Vigotski (em russo: Лев Семёнович Выготский, transliteração: Lev
Semyonovich Vygotskij, sendo o sobrenome também transliterado como Vigotski,
Vygotski ou Vygotsky; Orsha, 17 de novembro de 1896 — Moscou, 11 de junho de
1934),[1] foi um psicólogo, proponente da Psicologia histórico-cultural.[2]
Pensador
importante em sua área e época, foi pioneiro no conceito de que o
desenvolvimento intelectual das crianças ocorre em função das interações
sociais e condições de vida. Veio a ser descoberto pelos meios acadêmico
ocidental muito ano após a sua morte, que ocorreu em 1934, por tuberculose, aos
37 anos. [3]
Suas
principais influências eram Baruch Spinoza, Wilhelm von Humboldt, Aleksandr
Potebnia, Alfred Adler, Kurt Koffka, Kurt Lewin, Max Wertheimer, Wolfgang
Köhler, Kurt Goldstein, Karl Marx e Jean Piaget. Pessoas que foram
influenciadas por Vigotski foram os participantes do Círculo Vygotsky, além de
Evald Ilienkov e Urie Bronfenbrenner.
Biografia
Algumas
áreas do cérebro humano envolvidas no processamento da linguagem: Área de Broca
(Azul), Área de Wernicke (Verde), Giro supramarginal (Amarelo), Giro angular
(Laranja), Córtex auditivo primário (Rosa).
Filho
de uma próspera família judia formou-se em Direito pela Universidade de Moscou
em 1918. Durante o seu período acadêmico estudou simultaneamente Literatura e
História na Universidade Popular de Shanyavskii.
No ano
de seu bacharelado em Direito (1918), retornou para Gomel, onde antes
lecionava. Seis anos mais tarde, em 1924, aos 28 anos de idade, desposou Roza
Smekhova, com quem teve duas filhas. Ainda em Gomel, ministrou um curso de
Psicologia no "Instituto de Treinamento de Professores" onde implantou
um laboratório de Psicologia. Sua formação em psicanálise foi omitida por conta
das perseguições de Stalin, que considerava as teorias de Sigmund Freud
(1856-1939) uma ideologia burguesa. Ainda em 1918 ele fundou uma editora e
publicou uma revista literária.
Apesar
de sua formação em Direito, destacou-se em sua época por suas críticas
literárias e análises do significado histórico e psicológico das obras de Arte,
trabalhos que posteriormente foram incorporados no livro "Psicologia da
Arte", escrito entre 1924 e 1926, incluindo naturalmente a tese de
doutorado sobre Psicologia da Arte, que defendeu em 1925.[5] O seu interesse
pela Psicologia levou-o a uma leitura crítica de toda produção teórica de sua
época, nomeadamente as teorias da "Gestalt", da Psicanálise e o
"Behaviorismo", além das ideias iniciais do epistemologia e psicólogo
suíço Jean Piaget. As obras desses autores são citadas e comentadas em seus
diversos trabalhos, tendo escrito prefácios para algumas das suas traduções ao
idioma russo.
Tendo vivido
a Revolução Russa de 1917, bem como estudado as obras de Karl Marx e Friedrich
Engels, a partir das proposições teóricas do materialismo histórico propôs a
reorganização da Psicologia, antevendo a tendência de unificação das Ciências
Humanas no que denominou como "psicologia cultural-histórica".
Entre
os seus trabalhos de campo incluem-se: às populações camponesas isoladas de seu
país, fazendo testes neuropsicológicos entre as aldeias nômades do Uzbequistão
e do Quirguistão (Ásia Central), antes e depois do realinhamento cultural e
socioeconômico da revolução socialista, que incluía alfabetização, cursos
rápidos de novas tecnologias, organização de brigadas, fazendas coletivas e
outros, como descreve Alexander Luria em seu ensaio sobre diferenças culturais
e o pensamento.
A
experiência vivida na formação de professores levou-o ao estudo dos distúrbios
de aprendizagem e de linguagem, das diversas formas de deficiências congênitas
e adquiridas, a exemplo da afasia. Complementando a sua formação para estudo da
etiologia de tais distúrbios, graduou-se em Medicina retomando o curso iniciado
e substituído por Direito em Moscou e retomado e concluído em Kharkov. O seu
interesse em Medicina estava associado à manutenção do grupo de pesquisa
(troika) de neuropsicologia com Alexander Luria e Alexei Nikolaievich Leontiev.
As suas principais contribuições à defectologia estão reunidas no livro
"Psicologia Pedagógica".
Graças
a uma conferência proferida no "II Congresso de Psicologia" em
Lenigrado, foi convidado a trabalhar no Instituto de Psicologia de Moscou. Seu
interesse simultâneo pelas funções mentais superiores, cultura, linguagem e
processos orgânicos cerebrais pesquisados por neurofisiologistas russos com
quem conviveu, especialmente Luria e Leotiev, em diversas contribuições no
"Instituto de Deficiências de Moscou", na direção do departamento de
Educação (especial) do Narkompros, entre outros institutos, além das
publicações sobre o tema, encontram-se reunidos em "A Formação Social da
Mente", onde aborda os problemas da gênese dos processos psicológicos
tipicamente humanos, analisando-os desde a infância à luz do seu contexto
histórico-cultural.
Após
sua morte, suas ideias foram repudiadas pelo governo soviético. No entanto,
seus alunos as preservaram para a posteridade.[4]
A
influência socialista e irrupção da sua proposição teórica
Vygotsky
é o grande fundador da escola soviética de psicologia histórico-cultural. Era
necessária, na época, a construção de uma ponte que ligasse a psicologia
"natural", mais quantitativa, à psicologia "mental", mais
subjetiva. Retornou a Moscou em 1924, envolvido em vários projetos.
Apesar
da vida curta, foi autor de uma obra muito importante, junto com Alexander
Luria e Alexei Leontiev – responsáveis pela disseminação dos textos de
Vygotsky, muitos deles destruídos com a ascensão de Stálin ao Kremlin. Devido à
censura soviética, seus trabalhos ganharam dimensão há pouco tempo, inclusive
dentro da Rússia. No Ocidente, a primeira tradução de um livro seu, Pensamento
e Linguagem, foi lançada em 1962 nos Estados Unidos.
Os seus
primeiros estudos foram voltados para a psicologia da arte. Extremamente culto,
tinha entre seus amigos o grande cineasta Sergei Eisenstein, admirador de seu
trabalho. Suas proposições para análise da obra de arte fazem um contraponto
com a teoria psicanalítica e estudos da mitologia (fábulas), linguística e
poética dos formalistas russos (1915-1920), sendo considerado pioneiro no que
se refere ao moderno estudo da arte literária. É possível que as restrições à
suas obras, pelo governo stalinista estejam associadas à censura da psicanálise
naquele país, a exemplo da perseguição e fechamento, em 1926, da clínica
psicanalítica para crianças de Sabina Spielrein (1885-1942), uma psicanalista
formada por C. G. Jung.
Para
Rego,[7] a proibição da edição das suas obras na União Soviética, entre 1936 e
1956, iniciou-se com a identificação deste como idealista, a partir das suas
críticas à utilização das teorias de Pavlov quanto às potencialidades de
condicionamento ambiental. Vygotskiy, apesar de concordar com a ideia da
plasticidade do homem face a cultura, argumentava com a cúpula do regime
estalinista sobre a capacidade humana de criar seu ambiente dando origem a
novas formas de consciência e (ou) organização. Somente com o fim da censura do
totalitário regime stalinista que começou a ser redescoberto iniciando-se pela
publicação de seu clássico Pensamento e linguagem.
O
contexto em que viveu Vygotsky ajuda a explicar o rumo que seu trabalho iria
tomar. As suas ideias foram desenvolvidas na União Soviética criada pela
Revolução Russa de 1917 e refletem o desejo de reescrever a psicologia, com
base no materialismo marxista. O projeto ambicioso e a constante ameaça da
morte (a tuberculose manifestou-se desde os 19 anos de idade e foi responsável
por sua morte prematura) deram ao seu trabalho, abrangente e profundo caráter
de urgência.
Hoje
sabemos quanto foi fundamental para o desenvolvimento da psicologia, em
especial na União Soviética, o diálogo que esse pensador estabeleceu com a
teoria marxista da sociedade. As concepções de Friedrich Engels sobre o
trabalho humano e uso de instrumentos como os meios pelos quais o homem
transforma a natureza, transformando a si mesmo numa perspectiva da evolução
das espécies. Somada às contribuições de Karl Marx sobre as influências das
mudanças históricas da sociedade e da vida material na consciência e
comportamento humano que são retomados e utilizados na compreensão de um dos
principais problemas propostos por Wilhelm Wundt (1832-1920) para a psicologia:
o estudo da consciência incluindo a percepção de estímulos e os comportamentos
complexos descritos na sua Psicologia dos povos (Volkerpsychologie).
É a
partir do conceito marxista de ideologia que faz uma de suas principais
críticas às proposições de Wundt para o estudo da linguagem, mitologia, arte,
religião, costumes e leis, que para ele é o estudo da ideologia e não do
psiquismo social – ou capacidade de vida social do ser humano, esse animal
político (zoon politicon) da proposição aristotélica citada por Marx. Para
Vygostky, porém, não se pode reduzir esse estudo à gênese das ideologias a partir
da economia política (o que foi entendido como críticas ao marxismo) nem propor
uma oposição entre o social e individual, como se fazia para diferenciar a
psicologia das demais ciências sociais. A psique é sempre efetivamente social e
efetivamente construída. A oposição social × individual deve ser substituída
por individual e coletiva, entendendo por coletivo as contribuições do
indivíduo à coletividade (histórica, cultural, institucional), como pode ser
visto na história da arte, o seu caráter intersubjetivo (interpessoal),
entendendo a psicologia social como psicologia diferencial, cuja meta é
identificar as diferenças individuais em indivíduos particulares, concordando
com Biékhtieriev quanto a reflexologia do indivíduo particular e a reflexologia
coletiva, onde obtêm-se os produtos sociais da atividade correlata de tais
indivíduos.[8]
Tais
proposições e problemas foram desenvolvidos a partir de proposta metodológica
própria e aplicações práticas, na análise interpretação das obras de arte e na
educação e reabilitação de danos neurológicos, por Vygotsky, ao contrário dos
demais teóricos de sua época, na demonstração de como a cultura torna-se parte
da natureza humana de cada pessoa através das funções psicológicas que
simultaneamente são resultado da atividade cerebral. Segundo ele, esse método
de estudo era denominado Psicologia histórico-cultural ou instrumental.[6]
Por
outro lado, a defectologia, com sua análise das diversas causas das
deficiências mentais e sensoriais, a especial contribuição que trouxe com a
noção de sistema funcional para localização cerebral das atividades no sistema
nervoso, revelam seu interesse na neurociência e continuidade da obra de Ivan
Petrovich Pavlov (1849-1929), prêmio Nobel (1904) de neurofisiologia, com o
início da teoria dos reflexos condicionados, inibições e atividade nervosa
superior. O que a escola de Vygotsky dera continuidade. Alexander Luria, em um
artigo sobre seu mestre e amigo Vygotsky, referindo-se ao interesse comum de
ambos pela neurologia e ao curso que realizavam na faculdade de medicina,
lamenta perder o amigo nesse caminho de médico que o tempo não lhe permitira
trilhar.[9] Vygotsky morreu de tuberculose antes de completar 38 anos, deixando
uma extensa e complexa obra, contudo inacabada, especialmente quanto aos
aspectos neuropsicológicos, incluindo a produção conjunta com Alexander Luria.
A
linguagem, a aprendizagem e os instrumentos psicológicos
Mediação
Relação
direta: estímulo (S) - resposta (R).
Relação
mediada: estímulo (S) - mediador (M) - resposta (R)
A
mediação, de acordo com Vygotsky, é a capacidade de colocar um intermediário
entre o sujeito e o objeto. Uma relação direta é estímulo → resposta, enquanto
uma relação mediada é estímulo → mediador → resposta. Ao longo do
desenvolvimento, a relação do homem com o mundo se torna cada vez mais mediada
e menos direta.[10]
Quando
colocamos a mão em uma chama e retiramos devido à dor, é uma relação direta
estímulo-resposta. Quando colocamos a mão em uma chama e retiramos ou porque
nos lembramos da memória da dor ou porque alguém nos disse para retirar, é uma
relação mediada, existindo um elemento intermediário.[11]
Para
Vygotsky, existem dois tipos de mediação:
Mediação
por instrumentos
Marcada
pela relação homem-natureza, em que o ser humano consegue utilizar instrumentos
(e.g faca, machado) para transformar a natureza a seu favor. Os instrumentos
tornam a atividade mais eficiente pois diminuem a força necessária e o tempo
necessário do resultado desejado. Por meio do trabalho, realizado com instrumentos,
desenvolvem-se as relações sociais do ser humano.[10]
Mediação
por signos
Para
Vygotsky, os signos, a linguagem simbólica desenvolvida pela espécie humana,
têm um papel similar ao dos instrumentos, pois tanto os instrumentos de
trabalho quanto os signos são construções da mente humana, que estabelecem uma
relação mediada entre o homem e sua realidade. Por esta similaridade, Vygotsky
denominava os signos de instrumentos simbólicos, com especial atenção à
linguagem que, para ele, configurava-se num sistema simbólico fundamental em
todos os grupos humanos e elaborado no curso da evolução da espécie e de sua
história social.
O uso
de signos na mediação torna a atividade mais eficiente, pois diminuem os
esforços necessários da memória e da cognição. A mediação por signos não nasce
conosco, ela deve ser desenvolvida. Além disso, os signos, ao longo do
desenvolvimento, podem ser internalizados pelo indivíduo.[10] Os signos são
articulados na sociedade em sistemas simbólicos. Ou seja, seu significado é decidido
culturalmente. Portanto, são símbolos de acordo com a semiótica de Peirce.
Assim, os símbolos são internalizados por meio da cultura e, consequentemente,
são compartilhados dentre os indivíduos da mesma cultura.[11] Por exemplo,
todos falantes de português concordam que a palavra 'cachorro' significa o
animal canino, embora não exista nenhuma relação concreta entre uma coisa e
outra. Desta forma, a cultura é a fornecedora de matéria-prima dos símbolos a
serem internalizados e, portanto, um dos principais fatores no desenvolvimento
psicológico do indivíduo.[10]
Um de
seus derradeiros trabalhos, História do desenvolvimento das funções nervosas
superiores, 1960, estuda os remanescentes de antigas formas de comportamento
que o homem moderno conservou, incluindo-as no sistema de outras formas
(superiores) de comportamento.
Linguagem
A
linguagem é uma espécie de ferramenta (sendo que, aqui, ferramenta é entendida
como uma construção social), capaz de transformar decisivamente os rumos de
nossa atividade, e a organização das funções psicológicas superiores (memória,
atenção, pensamento). Assim, o indivíduo, ao apropriar-se da linguagem da
cultura em que está inserido, altera qualitativamente seu modo de pensar, de
perceber o mundo, de memorizá-lo, etc. Por isso, a linguagem tem um ponto
central na teoria de Vygotsky, uma vez que, sem ela, o desenvolvimento
propriamente humano não ocorreria.
Para
Vygotsky, no desenvolvimento infantil, a capacidade de utilização de
instrumentos ou inteligência prática tem uma origem anterior à capacidade de
falar, e foram tratados por ele como processos separados e simultâneos. No seu
livro "A formação social da mente" (p.11 ed. 2008) observa-se que,
apesar da possibilidade de estes sistemas operarem independentemente na criança
pequena, no adulto eles mantêm uma unidade dialética, e se constituem como uma
verdadeira essência do comportamento humano complexo. O autor atribui à
atividade simbólica uma função organizadora específica: "que invade o
processo de uso do instrumento e produz formas fundamentalmente novas de
comportamento" (Vygotsky, 1999 op.cit.).
As suas
pesquisas sobre aprendizagem tiveram mais sentido na Pedagogia. Os processos de
desenvolvimento despertaram-lhe a atenção, e sempre procurou o aparecimento de
novas formas de organização psicológica, ao invés de reduzir a estrutura de
aprendizagem a elementos constitutivos.
Na área
educacional, a influência de Vygotsky também vem crescendo cada vez mais, dando
origem a experiências mais diversas. Não existe um método Vygotsky, mas há
diversos artigos e transcrições de conferências suas tratando do tema
educacional.[12] Como Piaget, o psicólogo bielorrusso é mais uma fonte de
inspiração do que um guia para os pedagogos.
Aprendizagem
Artigo
científico que utiliza a teoria histórico-cultural de Vygotsky como
fundamentação teórica para a construção de conceitos científicos
A
teoria histórico-cultural proposta originalmente por Vygotsky explica a
aprendizagem e o desenvolvimento como fenômenos humanos mediados semioticamente,
com ênfase na linguagem. Esta teoria apresenta circunstâncias importantes para
compreender a complexidade associada à aprendizagem conceitual em sala de aula,
como o reconhecimento de que os sujeitos modificam ativamente as forças ativas
que os transformam. Vygotsky defende que o desenvolvimento humano se dá na
relação sujeito e mundo, mas com a emergência da consciência, um fenômeno que
caracteriza o humano e que é social e cultural. Ao fazer parte da natureza, o
sujeito age sobre ela e a transforma em objeto da sua ação; torna-se ao mesmo
tempo autor e protagonista da sua história.[13][nota 1]
As
obras de Vygotsky incluem alguns conceitos que se tornaram incontornáveis na
área do desenvolvimento da aprendizagem. Um dos conceitos mais importantes é o
da Zona de desenvolvimento proximal, que se relaciona com a diferença entre o
que a criança consegue realizar sozinha (nível de desenvolvimento real) e
aquilo que é capaz de aprender e fazer com a ajuda de uma pessoa mais
experiente (nível de desenvolvimento potencial), representado por um adulto,
uma criança mais velha ou com maior facilidade de aprendizado. A Zona de
Desenvolvimento Proximal é, portanto, tudo o que a criança pode adquirir em
termos intelectuais quando lhe é dado o suporte educacional devido. Este
conceito será, posteriormente desenvolvido por Jerome Bruner, sendo hoje
designado por etapa de desenvolvimento.
Outra
contribuição vygotskiana de grande importância foi a relação que estabelece
entre pensamento e linguagem, desenvolvida no seu livro "Pensamento e
Linguagem". Entre suas contribuições a esse tema destaca-se a formação de
conceitos, ao qual dedica dois capítulos do referido livro, e a compreensão das
funções mentais enquanto sistemas funcionais, sem localização específica no
cérebro, órgão de grande plasticidade e dinâmica, variando ao longo da história
da humanidade e do desenvolvimento individual. Esta concepção foi
posteriormente bem-desenvolvida e bem-demonstrada do ponto de vista
neuropsicológico por seu discípulo e colaborador A. R. Luria.
Como
bom marxista que domina os princípios da lógica e da dialética pós Hegel
(1770-1831), o conceito de síntese também pode ser encontrado largamente na sua
obra. O autor define a síntese não apenas como a soma ou a justaposição de dois
ou mais elementos, e sim como a emergência de um produto totalmente novo gerado
a partir da interação entre elementos anteriores.
Vygotsky
particulariza o processo de ensino e aprendizagem na expressão
"obuchenie", uma expressão própria da língua russa que coloca aquele
que aprende e aquele que ensina numa relação interligada (que deu vezo para a
criação da teoria da Experiência da Aprendizagem Mediada - EAM). A ênfase em
situar quem aprende e aquele que ensina como partícipes de um mesmo processo
corrobora outro conceito-chave na teoria de Vygotsky, a mediação, como um
pressuposto da relação eu-outro social. A relação mediatizada não se dá
necessariamente pelo outro corpóreo, mas pela possibilidade de interação com
signos, símbolos culturais e objetos. Um dos pressupostos básicos desse autor é
que o ser humano constitui-se enquanto tal na sua relação com o outro. Para
Vygotsky, a aprendizagem relaciona-se ao desenvolvimento desde o nascimento,
sendo a principal causa para o desabrochar do desenvolvimento do ser.
Relação
com a teoria de Piaget
Alguns
pesquisadores acharam semelhanças entre o pensamento teórico de Vygotsky e
Piaget, porém o próprio Vygotsky, que conheceu a teoria de Piaget não
considerava que era semelhante à sua.[carece de fontes]
Vygotsky
considera que a aprendizagem é o elemento fundamental e antecessor ao
desenvolvimento e destaca a importância das relações sociais, valorizando
sempre a realização de tarefas coletivamente. Já Piaget considera o contrário
que o desenvolvimento é premissa para a aprendizagem, e esta vem para
incentivar o desenvolvimento, buscando visar a perspectiva biológica
(individual). Por terem pensamentos com princípios diversos não devem ser
confundidos, ambos têm extrema importância e são referências quando se fala em
aprendizagem e desenvolvimento, mesmo tendo como método princípios opostos.[14]
Críticas
Legado
original de Vigotski, escola "vigotskiana" americana e
neovigotskianismo ocidental
Uma
crítica à interpretação norte-americana das ideias de Vygotsky e, um pouco mais
tarde, à sua disseminação global apareceu na década de 1980.[15] As críticas do
início da década de 1980 aos estudiosos "vigotskianos" russos e
ocidentais continuaram durante a década de 1990.[16] Van der Veer &
Valsiner (1991) chamaram essas vertentes do pensamento vigotskiano de
"modas neo-vigotskianas na psicologia contemporânea"[17] e Cazden
(1996) as chamou de "tradições seletivas" na academia vigotskiana.[18]
Palincsar (1998) disse que a zona de desenvolvimento proximal foi "um dos
construtos mais usados e menos compreendidos a aparecer
na literatura educacional contemporânea",[19]
e Fischer & Mercer (1992) disseram que o construto foi "usado como um
pouco mais do que uma alternativa elegante à terminologia piagetiana ou ao
conceito de QI para descrever diferenças individuais em realização ou
potencial".[20]
Van der
Veer e Valsiner também sugerem uma distinção clara entre a noção original de
Vigotski de "zona blizhaishego razvitiia" (ZBR) e o que eles
consideram suas "interpretações superficiais" conhecidas
coletivamente como "zona de desenvolvimento proximal" (ZPD).[21][22]
Valsiner e Van der Veer também identificam certas declarações na literatura
vigotskiana como meras "declarações de fé", ou seja, declarações
vazias frequentemente repetidas. Enquanto Gillen (2000) fala de diferentes
"versões de Vygotsky"[23] e Van der Veer (2008) fala de
"múltiplas leituras de Vygotsky",[24] Gradler (2007) simplesmente
fala de "conceitos e inferências curiosamente atribuídos a Lev
Vygotsky".[25] Toomela (2000) chama a vertente conhecida como "teoria
da atividade" um "beco sem saída" para a psicologia
histórico-cultural[26] e, além disso, para o pensamento metodológico em
psicologia cultural.[27]
Gredler
& Schields (2004) questionam "se alguém realmente lê as palavras de
Vygotsky"[28] e Gredler (2012) pergunta se é "tarde demais para
entender Vygotsky para a sala de aula",[29] enquanto Rowlands (2000)
sugere "desvirar Vigotski pondo-o de cabeça em pé". De acordo com
Miller (2011), inconsistências, contradições e, às vezes, falhas fundamentais
na literatura "vigotskiana" foram reveladas em publicações críticas
sobre o assunto e são tipicamente associadas—mas certamente não limitadas—ao legado
norte-americano de Michael Cole e James Wertsch e seus associados.[30]
Smagorinsky (2011) fala de "desafios de reivindicar uma perspectiva
vigotskiana".[31]
Lambert
(2000) afirma que os escritos de Vygotsky sobre o jogo eram muito breves para
serem chamados de teoria e, além disso, dificilmente ainda são relevantes.[32]
De acordo com Zhang (2013), as teorias de Vygotsky são fundamentalmente falhas
de um ponto de vista linguístico contemporâneo[33][34] e Newman (2018) afirma
que "o apoio reivindicado de Vygotsky em relatos de aquisição de uma
segunda língua está mal colocado, primeiro por causa daquelas dificuldades e,
em segundo lugar, porque muitos que reivindicam o apoio de Vygotsky não
precisam ou mesmo usam sua teoria, mas em vez disso focam sua atenção em suas
observações empíricas e assumem incorretamente que se suas próprias observações
empíricas correspondem às de Vygotsky, então a teoria de Vygotsky pode ser
aceita".[35]
Movimento
revisionista dos estudos vigostkianos
Durante
o início do século XXI, várias reavaliações acadêmicas da versão popular (às
vezes depreciativamente denominada "culto de Vygotsky", "o culto
de Vygotsky" ou mesmo "o culto da personalidade em torno de
Vygotsky") do legado de Vygotsky foram realizadas e isso é referido como a
"revolução revisionista nos Estudos de Vygotsky".[36][37][38] Os
estudos de Vygotsky conduzidos dentro da estrutura da "virada
revisionista" durante a década de 2010 revelaram falsificações e
distorções sistemáticas e massivas do legado de Vygotsky, mas também
demonstraram uma diminuição rápida e dramática da popularidade desse autor nos
estudos internacionais que começaram em 2017. As razões desta crise ainda não
são totalmente claras e estão sendo discutidas nos círculos acadêmicos.[39][40]
O movimento
revisionista nos Estudos Vigostkianos foi denominado uma "revolução
revisionista"[41] para descrever uma tendência relativamente recente que
surgiu na década de 1990. Esta tendência está tipicamente associada à crescente
insatisfação com a qualidade e integridade acadêmica dos textos disponíveis de
Vygotsky e membros do Círculo de Vygotsky, incluindo suas traduções para o
inglês feitas de edições soviéticas amplamente erradas, distorcidas e até mesmo
em alguns casos falsificadas,[42][43] o que levanta sérias preocupações sobre a
confiabilidade dos textos de Vygotsky disponíveis em inglês.[44] No entanto, ao
contrário da literatura crítica que discute as interpretações ocidentais do
legado de Vygotsky, o alvo da crítica e o principal objeto de pesquisa nos
estudos da vertente revisionista são os textos de Vygotsky propriamente ditos:
os manuscritos, publicações originais da vida e as edições póstumas soviéticas
de Vygotsky que na maioria das vezes foram posteriormente traduzidos
acriticamente para outras línguas. A vertente revisionista é solidamente
fundamentada em uma série de estudos nos arquivos de Vygotsky que descobriram
materiais de Vygotsky previamente desconhecidos e não
publicados.[45][46][47][48][49][50][51][52][53]
Assim,
alguns estudos da vertente revisionista mostram que certas frases, termos e
expressões tipicamente associados ao legado vigotskiano como suas noções e
conceitos centrais—como "psicologia
histórico-cultural"[54][55][56][57] "teoria histórico-cultural",
"escola histórico-cultural", "funções psíquicas/mentais
superiores", "internalização", "zona de desenvolvimento
proximal", etc. de fato, ou ocupam não mais do que apenas algumas dezenas
de páginas dentro do coleção de seis volumes das obras de Vygotsky,[58][59] ou
nunca ocorrem nos próprios escritos de Vygotsky.[60] Outra série de estudos
revelou a qualidade questionável dos textos publicados de Vygotsky que, na
verdade, nunca foram concluídos e destinados à publicação por seu
autor,[61][62][63] mas foram publicados postumamente sem dar o devido
reconhecimento editorial de seus trabalhos inacabados, natureza transitória, e
com inúmeras intervenções editoriais e distorções do texto de
Vygotsky.[64][65][66][67][68][69][70] Outra série de publicações revela que
outro texto conhecido de Vygotsky, frequentemente apresentado como a obra
fundamental, foi retrotraduzido para o russo a partir de uma tradução em inglês
de um original perdido e passou pela escrita original de Vygotsky. Esse
episódio foi referido como "falsificação benigna".[71][72][73][74][75]
Novas
pesquisas oponentes
Em
contraste com a proposta de Vigotski, a teoria linguística de Noam Chomsky é
nativista e afirma que o ambiente possui papel limitado no desenvolvimento da
linguagem, servindo principalmente através de acionamentos das estruturas
inatas.[76]
Enquanto
Vigotski defendia a interconexão entre linguagem e pensamento, Steven Pinker
afirma que ambos são independentes e que uma linguagem do pensamento
("mentalês") pré-programada existe, separada de estruturas e léxicos
das línguas particulares.[77]
Obras
Primárias
Português
Vygotsky,
Lev (1987), Pensamento e Linguagem, SP: Martins Fontes (tradução da versão
resumida norte-americana).
———;
al. (1988), Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem, SP: Ícone/EDUSP.
———
(1997), Estudos sobre a História do Comportamento, Porto Alegre: Artmed.
———
(1999), Desenvolvimento Psicológico na Infância, SP: Martins.
———
(1999), Formação Social da Mente, SP: Martins Fontes.
———
(2001), Construção do Pensamento e da Linguagem, SP: Martins Fontes.
———
(2001), Psicologia da Arte, SP: Martins Fontes.
Psicologia
Pedagógica. Porto Alegre, Artmed, 2003.
Psicologia
Pedagógica. SP, WMF Martins Fontes, 2004.
Teoria
e Método em Psicologia. SP, Martins Fontes, 2004.
Pensamento
e Linguagem. SP, Martins Editora, 2008.
Imaginação
e Criação na Infância. SP, Ática, 2009 (Tradução de Zoia Prestes e Elizabeth
Tunes).
Imaginação
e Criação na Infância. SP, Expressão Popular, 2018 (Tradução de Zoia Prestes e
Elizabeth Tunes).
Sete
aulas de L. S. Vigotski sobre fundamentos da pedologia. RJ, E-papers, 2018
(Tradução de Zoia Prestes e Elizabeth Tunes).
Liev S.
Vigotski: escritos sobre arte (2022). Bauru: Mireveja, 2022. (Organização,
tradução e notas de Priscila Marques).
Inglês
Consciousness as a problem in the Psychology of
Behavior, ensaio, 1925.
Educational Psychology, 1926.
Historical meaning of the crisis in Psychology, 1927.
The Fundamental Problems of Defectology, artigo 1929.
———
(1929), The Problem of the Cultural Development of the Child [O problema do desenvolvimento
cultural da criança] (essay) (em inglês).
Luria,
AR; Vygotsky, Lev S (1930), Ape, Primitive Man, and Child: Essays in the
History of Behaviour [O macaco, o homem primitivo e a criança: ensaios na
História do comportamento] (em inglês).
Vygotsky,
Lev (1930), The Socialist alteration of Man [A alteração socialista do homem]
(em inglês).
———
(1931), Paedology of the Adolescent [Pedologia do adolescente] (em inglês).
Play and its role in the Mental development of the
Child, ensaio, 1933.
Thinking and Speech, 1934.
Tool and symbol in child development, 1934.
Mind in Society: The Development of Higher
Psychological Processes, 1978.
Thought and Language, 1986.
Vygotsky, Lev S (1987), The Collected Works
[Trabalhos] (em inglês), Marxists
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