sexta-feira, 30 de maio de 2025

REFLEXÃO...01

 

Nenhum lugar e todos os lugares ao mesmo tempo


Cresci em constante movimento. Sempre de passagem

 

Por Rebeca Shammah

 

O Meu Lugar No Mundo

 

O meu lugar no mundo… Que lugar é esse?

 

Por muito tempo, essa pergunta me assombrou. Eu nunca soube como respondê-la de verdade.

 

Sou filha de missionário. Minha mãe atendeu ao chamado de missões quando eu tinha apenas sete anos. Ela deixou tudo para trás, e levou somente a mim, sua filha pequenina, para anunciar o Evangelho onde Deus a conduzisse. Vivi em diferentes lugares durante a minha vida, Bolívia, Senegal, Burkina-Faso, França.

 

E assim cresci, em constante movimento. Sempre de passagem. Sempre indo, mas nunca voltando. Todos os dias aprendi a viver fora da zona de conforto, me adaptar a novos lugares, novas culturas, novas vidas.

 

Minha casa? Nenhum lugar… e todos os lugares ao mesmo tempo.

 

Ao viver assim, às vezes fica difícil entender qual é realmente o nosso lugar.E a pergunta sempre ecoava: de onde vim? Para onde vou?

 

Dizem serem as raízes que nos sustentam, que nos fazem crescer e florescer naquilo que fomos chamados a ser. Mas, se for assim, será que talvez eu esteja perdida pelo vasto oceano em movimento?

 

Por nunca me sentir parte de lugar nenhum, sempre me vi como um barquinho à deriva, à procura de um porto que me acolhesse e que entendesse até aquelas partes de mim que eu mesma não consigo explicar. Mas de tanto eu ir para lugares tão distantes, sentia que nunca poderia encontrar esse porto. Quanto mais eu buscava pertencer, mais percebia que nenhum lugar era suficientemente meu.

 

E talvez você se pergunte: como alguém que nunca se sentiu pertencer a lugar algum, poderia encontrar seu verdadeiro lugar no mundo?

 

Minha história foi tecida de despedidas, recomeços e constantes reinvenções. Cada partida deixava marcas, cada chegada trazia incertezas. Mas, foi nesse constante ir e vir que fui entendendo que talvez eu não fosse feita para ancorar em terra firme. E que tudo isso não significava que eu estava perdida. Na verdade, eu nunca estive. Pelo contrário, aquele barquinho frágil, solto no vasto oceano, nunca navegou sozinho, pois nele havia um Capitão: Jesus. Ele não acalmou todas as águas revoltas, mas foi minha âncora em meio à tempestade. Foi o abrigo quando tudo ao meu redor era transitório, o porto seguro quando o chão parecia desaparecer sob meus pés. Ele me mostrou que era Ele quem me guiava. E, mais do que isso, me ensinou a não fixar meus olhos no vento que rasgava as velas ou na fúria da tempestade, mas no propósito por trás de cada experiência. Em tudo, Ele estava me moldando, usando minha vida para que Sua obra se realizasse.

 

E foi assim que entendi qual era o meu lugar no mundo e esse nunca foi um ponto no mapa, nem uma terra que pudesse chamar de minha, mas sim viver para a honra e glória dele. Seguir o Seu chamado, deixar-me ser conduzida por Sua voz.

 

Aprendi que não fomos criados para fincar raízes permanentes nesta terra, mas para ir, para anunciar o Evangelho àqueles que ainda precisam ouvir sobre o amor de Deus. E sim, isso exige renúncia, saudades, despedidas, mas enquanto nossa alma estiver ancorada em Seu amor, nunca estaremos perdidos.

 

As experiências que vivi ao lado da minha mãe abriram meus olhos para a realidade de um mundo que ainda clama por conhecer Jesus. Percebi o quanto ainda há corações sedentos, e como a seara é grande e poucos são os ceifeiros. O medo e a incerteza sempre estarão por perto. Mas Aquele que nos envia é maior que qualquer temor, maior que nossas dúvidas, maior que tudo aquilo que tenta nos parar. E no fim, tudo vale a pena. Se for por uma vida, se for por uma alma que encontra a verdade, tudo isso faz valer a pena.

 

Para mim, cada partida, cada despedida, tudo valeu a pena. E em cada perda aparente eu ganhei muito mais. Cada vez que eu vivenciava experiências extraordinárias no campo missionário onde eu via a glória de Deus se manifestar através das nossas vidas eu tinha a certeza de que foi para isso que fomos chamados. E se minha mãe não tivesse ido, talvez muitas vidas não teriam conhecido Jesus. Isso arde em mim. Isso me faz querer ir também.

 

Entreguei minha vida para Deus e a obra missionária, porque foi dentro deste sonho que ele me moldou. Decidi que minhas escolhas e decisões de vida seriam para honra e glória do Senhor e é por isso que minha profissão eu também entreguei para a obra missionária. Atualmente estou no último ano da faculdade, sou mestranda em psicopatologia clínica psicanalítica, um caminho que sei que Deus escolheu. Antes mesmo de começar, consagrei-me a Ele: seria instrumento em Suas mãos para alcançar corações feridos. Deus me mostrou que minha profissão seria uma extensão do meu chamado. Que Ele me levaria a lugares onde, com a escuta, com o cuidado, com o olhar, eu poderia ser um canal do Seu amor.

 

Foi na ausência de pertencimento que Deus me revelou que o verdadeiro lar de uma alma missionária não está em um lugar físico, mas em viver plenamente no centro da Sua vontade. Não pertenço a nenhum canto desta terra, mas me entrego por completo a todos os lugares onde Ele deseja me usar. Porque meu lar não é chão, é propósito; não é terra, é missão.

 

Imagem: Museum of New Zealand Te Papa Tongarewa (@tepapa)

 

Rebeca Shammah, filha de missionária e mestranda em psicopatologia clínica psicanalítica.

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