quinta-feira, 17 de julho de 2025

BRASILEIROS NA LITERATURA...

 

LITERATURA

Esse foi o primeiro poeta brasileiro: um gênio desconhecido

Esta é a envolvente história do primeiro poeta brasileiro que, séculos após sua morte, virou música de Caetano Veloso.

Gregório de Matos. Conhecido como O Boca do Inferno, Gregório de Matos foi ousado e subversivo, sendo até perseguido brevemente pela inquisição

HISTÓRIA

Penelope Nogueira

A literatura brasileira é um espelho da nossa história, marcada por encontros e confrontos culturais entre indígenas, colonizadores portugueses, africanos escravizados e outros povos que formaram o Brasil. Mas, ao se perguntar qual foi o ponto de partida dessa tradição literária, é comum buscar por uma figura inaugural. Quem foi o primeiro escritor genuinamente brasileiro? Quem deu voz literária ao território que começava a se formar sob o domínio português?

 

A resposta mais aceita entre os estudiosos nos leva ao século XVII e ao nome de Gregório de Matos Guerra — o primeiro grande poeta nascido no Brasil e um dos autores mais ousados e originais da língua portuguesa.

 

Quem foi Gregório de Matos?

Nascido em Salvador, Bahia, em 1636, Gregório de Matos foi um dos primeiros escritores brasileiros natos. Filho de uma família rica e influente, estudou em Coimbra, em Portugal, onde se formou em Direito. Após retornar ao Brasil, Gregório passou a viver entre o exercício da advocacia e a produção literária — embora sua fama tenha sido moldada, sobretudo, por seus versos ácidos, satíricos e críticos.

 

LITERATURA

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Por sua forma irreverente de escrever, Gregório ficou conhecido como “Boca do Inferno” — um apelido que fazia referência à sua língua ferina e à sua capacidade de criticar tudo e todos: clero, autoridades coloniais, ricos, falsos moralistas e até mesmo o povo.

Literatura Satírica e Barroca

Gregório de Matos é um dos maiores representantes do Barroco na literatura de língua portuguesa. Seu estilo é marcado por fortes contrastes (céu e inferno, carne e espírito, pecado e perdão), pelo uso intenso de figuras de linguagem e pela exploração de temas religiosos, amorosos e sociais.

 

Sua produção literária pode ser dividida em três grandes temas:

 

Poemas religiosos: expressando arrependimento e busca por salvação espiritual.

 

Poemas líricos e eróticos: exaltando o amor e, muitas vezes, o desejo carnal de forma ousada para a época.

 

Poemas satíricos: sua marca registrada, em que atacava políticos corruptos, religiosos hipócritas e a elite colonial baiana.

 

Gregório de Matos e o Brasil Colonial

Mais do que um poeta, Gregório de Matos foi um cronista da sociedade colonial brasileira. Em um tempo em que a literatura era produzida majoritariamente em Portugal e com forte influência europeia, Gregório teve a ousadia de escrever sobre o Brasil, usando linguagem popular, expressões locais e temas cotidianos.

Em seus versos, ele denunciava o abandono da cidade de Salvador, o abuso de poder das autoridades e a decadência moral da sociedade. Por isso, era tão amado por uns e odiado por outros. Suas críticas lhe renderam perseguições, exílio e censura.

 

Foi mandado para Angola como punição por suas críticas e, anos depois, proibida de viver na Bahia, terminando seus dias em Recife, onde morreu por volta de 1696.

 

Esquecido e redescoberto

Durante séculos, a obra de Gregório de Matos circulou apenas em manuscritos. A Igreja Católica e os setores mais conservadores da sociedade colonial trataram de esconder seus textos, considerados escandalosos e imorais.

 

Somente no século XX, sua produção começou a ser resgatada, estudada e valorizada como parte fundamental da formação da literatura brasileira. Hoje, ele é reconhecido como o primeiro poeta brasileiro de grande expressão, alguém que conseguiu transformar a realidade brasileira em poesia com voz própria — e crítica.

 

A Boca do Inferno e a Voz do Brasil

Gregório de Matos não apenas deu início à tradição poética brasileira, mas também foi um pioneiro no uso da literatura como forma de resistência, denúncia e expressão individual. Em uma época de censura, desigualdade e poder concentrado, ele usou a palavra como arma e a sátira como instrumento de justiça.

 

A redescoberta de sua obra permite compreender melhor o Brasil colonial e perceber que, desde o início, a literatura nacional nasceu crítica, inquieta, ousada — como o próprio Gregório.

 

Séculos mais tarde, outro brasileiro exilado, lutando contra a censura, utilizou da poesia de Gregório para denunciar os absurdos cometidos pelo governo ditatorial militar brasileiro. Caetano Veloso, exilado na Inglaterra, cantou em 'Triste Bahia' a saudade de seu país, seu estado, e misturou elementos das religiões afro-brasileiras nos versos do poeta.

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