Devagar com o andor que o santo é de barro
Por Alan Caldas – Editor
É ditado popular. Diz-se quando alguém vai além do razoável.
E por que se diz?
Porque o andor pode estar podre ou comido pelos cupins. Se for muito rápido, chacoalha e quebra, e lá se vai o coitadinho do santo, uma linda imagem de barro que facilmente se destroça.
Devagar com o andor...
Cresci ouvindo isso. E agora gostaria de escrever uns pensamentos, e me vem essa lembrança:
- Alan, devagar com o andor que o santo é de barro.
Pensamentos não têm mais exigência de solidez intelectual. Já notou?
Vivemos a fase em que a “solidez” dos argumentos só interessam ao interesse pessoal de cada um.
Se me é favorável é sólido e válido. Se não me é favorável é oco e descartável. Simples assim. A verdade hoje é o que interessa que seja verdade. Mesmo que seja falso, se favorecer a pessoa ela aceita como verdadeiro.
Por exemplo:
Jair Bolsonaro foi eleito com magníficos milhões de votos. Coisa linda. Seu andor carrega a esperança de dezenas de milhões de brasileiros. E ele disputou no voto. Na honra. Na duríssima escolha social. E se elegeu com garbo.
Agora, porém, inventa confrontos. Põe os que gostam dele contra as instituições, que representam a toda a população. Bolsonaro foi eleito, mas parece querer governar sem oposição. Isso não é novo em governo. É velho. Nenhum governante quer oposição. Governar sozinho é que é bem bom. Mas isso não é democracia. Na democracia, governar é mais tenso.
O general Golbery do Couto e Silva, por exemplo, o gênio intelectual dos governos militares de 1964, disse que governar com democracia é difícil. Disse o óbvio mas nem sempre sabido. Golbery sabia que governo é prato que se come pelas beiradas, como mingau quente. Inteligente que era, Golbery sacou que a distensão do regime seria a morte do governo militar. E, dito e feito. Caiu. E caiu porque? Porque o santo da caserna era igualmente de barro.
Golbery faz falta. Diferente dos grotescos e grosseiros, um governante inteligente e polido deixa sempre saudade.
Bolsonaro não percebeu ainda que o andor governamental carrega um santo de barro. Não viu que tentar criar confronto contra as instituições pode acordar os zumbis, pode fazer a população perceber mais claramente que o Conto de Fadas que o Estado como um todo nos conta e quer que acreditemos que seja verdade, é, de fato, um pesadelo de terror e insanidade econômico e social.
Toda essa cantilena e balbúrdia podem deixar às claras as cavernosas contradições deste país. Pode furar o véu da ideologia, e o que virá para a realidade ninguém controlará. Pode fazer acordar quem não interessa ao Sistema acordar, e esse ser poderá se dar conta de que o Brasil é o país do demérito, não do mérito. E, acima de tudo, pode fazer as pessoas perceberem que carregamos santos de barro com um andor para lá de podre.
Excite as mentes demais e elas acordarão. E só um tolo abriria um paradoxo incontrolável numa sociedade que precisa de paz e resignação para continuar existindo.
Creio que alguém deveria carinhosamente dizer ao nosso presidente aquilo que toda família que presta diz para seus filhos, quando os vê indo além da medida do razoável:
- Devagar com o andor, o santo é de barro!
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