Durante
toda a dinastia dos Bragança, as imagens oficiais dos reis eram
marcadas pela inutilização da Coroa Real. Entenda o motivo
André NogueiraPublicado em 08/08/2019,
Dom João VI - Wikimedia Commons
A
Coroa é um símbolo de suma importância para as monarquias, ela
representa e marca o poder do Rei. Diversos reis na História foram
retratados por imagens e símbolos e a Coroa é tradicionalmente um
elemento imagético no universo de signos régios. Este não é o caso das representações em imagem dos reis de Portugal desde a restauração e a independência do país após anos de União Ibérica. A
partir de 1640, ano do fim da União, assume em Portugal a Casa Real de
Bragança, linhagem que governou o Império Português até a dissolução da
monarquia em 1910. A tradição dos Bragança não era muito distinta do
restante a cultura política de outras partes da Europa: monarcas
absolutistas que negociavam as bases de seu poder com as cortes e
sustentavam a exploração marítima de suas colônias ultramarinas. Porém, a nível imagético, a distinção da representação dos reis de Portugal é significativa. Para
além da pintura, os reis de Portugal não eram formalmente coroados,
sendo conclamados em sua posição a partir do título de Dom. A tradição
existe desde a fundação da monarquia bragantina, com D. João IV, em
1640. Na decorrência de sua coroação, o rei se recusou a colocar
em sua cabeça o símbolo da monarquia e, ao invés disso, colocou a coroa
nos pés da estátua da Virgem Maria, a declarando “Rainha de Portugal” e
“Guardiã da Coroa”. Hoje
se discute se o ato foi uma posição da fé declarada do monarca ou uma
forma de articular a unidade de Portugal a partir da tradição católica
como forma de manutenção da independência em relação à Espanha. N. Sra. de Fátima coroada / Crédito: José Ferreira Thedim No
caso da imagem de Dom José I, a relação é mais clara. O rei posa sem a
coroa, mas o cetro que segura está apoiado na mesa onde a coroa está
depositada: D. José Emanuel / Crédito: Wikimedia Commons Além
de apontar diretamente para a Coroa, a disposição dos elementos do
quadro demonstra uma relação entre Rei e Coroa que é, ao mesmo tempo, de
associação e de distância. O mesmo se vê no retrato pintado por
Pompeo Batoni, representação do rei Dom João V, o Magnânimo. O Rei usa
em sua cabeça a tradicional peruca da nobreza, que declara o poder e a
riqueza moral do monarca, mas a coroa permanece na mesa, onde se apoia o
cetro real: À esquerda, pintura na íntegra e, à direita, detalhe da coroa do rei João V / Crédito: Wikimedia Commons
A
relação entre o campo simbólico da representação do rei e a tradição
política pronunciada pela monarquia é um elemento básico para entender o
campo da monarquia dos Bragança. Isso, pois, é elementar na concepção
política do monarca português o fator mitológico que fundamenta o
universo político de Portugal, nos séculos bragantinos. É impossível
entender a política em Portugal sem somar à equação a ascensão, a partir
do século XVII, do Sebastianismo. Contam as histórias tradicionais que Dom Sebastião I de Portugal, foi um dos grandes nomes da Reconquista ibérica
e batalhou incessantemente pela vitória do mundo católico. Em sua
última destreza, Sebastião partiu para a guerra com os mouros em
Alcácer-Quibir (atualmente Marrocos), onde morreu em batalha. Entretanto,
no mito desse rei, defende-se que Sebastião nunca morreu, pois seu
corpo nunca foi encontrado. Na verdade, o rei não havia morrido, mas
apenas desaparecido e, como um Messias, seu destino era um dia retornar a
Portugal e assumir novamente a Coroa. O Sebastianismo, portanto, é
a crença mitológica do retorno futuro de Sebastião como Rei de
Portugal. Segundo essa lógica, o verdadeiro rei da nação portuguesa é
Sebastião, o “rei adormecido”. Enquanto isso, os sucessores de
Sebastião e reis temporários do Império seriam, no limite, guardiões da
Coroa Portuguesa na espera do retorno do verdadeiro rei. O Sebastianismo
teve grande influência em Portugal e também no Brasil. Nesse universo político, o rei de Portugal guarda a coroa enquanto a Virgem Maria,
ou a Nossa Senhora de Fátima, consideradas padroeiras de Portugal e mãe
de Cristo, é abençoadora do reinado português e mantenedora da
sacralidade da Coroa. Nesse sentido, é possível entender a representação
imagética dos reis. Veja, por exemplo, a imagem de Pedro III, o
Edificador: Pedro III e Maria I / Crédito: Wikimedia Commons O
retrato de Pedro III, a representação é clara: mais do que possuindo,
mas não usando, a Coroa, o monarca protege o símbolo da monarquia,
segurando-a como se a guardasse, enquanto expõe em seu peito a Cruz da
Ordem de Cristo. O
Rei de Portugal seria, portanto, um representante nobre da Coroa que
serve de guardião da instituição sacra da monarquia lusitana, enquanto
aguarda o verdadeiro dono da Coroa, único que poderia coloca-la na
cabeça e ser declarado monarca absoluto do Império Português,
representante digno do Poder, o Rei Sebastião. A Nossa Senhora,
nesse caso, apareceria como equivalente, no campo do divino, ao poder
simbólico de Sebastião, pois ambos se confundem simbolicamente com a
própria ideia de “Portugal” como nação monárquica e católica. Saiba mais sobre o Período Joanino pelas obras abaixo: 1. Dicionário do Brasil Joanino - https://amzn.to/2PPAldt 2. Dom João VI no Brasil - https://amzn.to/35vjlj2 3. D. João VI - https://amzn.to/36GBI4K 4. Versalhes Tropical - https://amzn.to/35sWPHN págin
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