As vacinas e os tratamentos que são a esperança de derrotar o coronavírus
Enquanto Estados Unidos e China começam a testar a imunização em humanos, a OMS lança um esforço internacional para determinar quais são os tratamentos mais eficazes
Enquanto
centenas de milhões de pessoas recolhem-se em casa para contribuir no
combate à pandemia, pesquisadores estão enfurnados em hospitais e
laboratórios para desenvolver armas eficazes contra o coronavírus.
Pelo
mundo todo, incluindo no Brasil, dezenas de grupos trabalham neste
momento para criar uma vacina eficaz. Eles seguem caminhos e técnicas
distintos, mas o objetivo é comum, e as perspectivas, promissoras. Na
China e nos Estados Unidos, testes em humanos inclusive já começaram na semana passada (veja o quadro abaixo).
Não
há dúvida de que os cientistas conseguirão produzir uma ou mais vacinas
capazes de imunizar as populações contra o novo vírus, impedindo as
infecções e o aparecimentos dos sintomas da covid-19. No entanto, ainda
que uma empresa de Israel tenha prometido disponibilizar uma formulação
para breve, o mais provável é que só haja uma vacina disponível no prazo
de 12 a 18 meses. Esse é o tempo necessário para vencer todas as etapas
necessárias.
Enquanto a
dose imunizadora não vem, os pesquisadores também buscam encontrar
tratamentos eficazes para combater a doença em quem está infectado pelo
vírus, em um esforço para reduzir a contagem de vítimas, que já
ultrapassa os 15 mil mortos. A principal iniciativa nesse sentido é o
Projeto Solidariedade, da Organização Mundial de Saúde (OMS), desencadeado na semana passada.
A
OMS elegeu quatro medicações ou combinações de drogas que se mostraram
promissoras em debelar a covid-19 e lançou um inédito e gigantesco
mutirão internacional para testá-las e obter dados científicos robustos
sobre o que funciona melhor com a doença. A estratégia da organização é
examinar a eficácia de antivirais já existentes e de medicações que
estejam em desenvolvimento para tratar outros tipos de coronavírus, o
que é uma forma de colher resultados com a velocidade exigida pela
situação de emergência global (veja detalhes no quadro).
—
É importante obter respostas rapidamente e descobrir o que funciona e o
que não funciona — explicou Ana Maria Henao-Restrepo, do departamento
de imunização da OMS.
EM BUSCA DO TRATAMENTO
Na
semana passada, a Organização Mundial de Saúde (OMS) apresentou o
Projeto Solidariedade, uma mobilização inédita para a realização de
testes clínicos de possíveis medicações contra o coronavírus, envolvendo
serviços médicos de todo o mundo:
O que é o projeto:
Em pleno andamento da pandemia, a eficácia de tratamentos contra o
coronavírus será avaliada a partir de um esforço coordenado que vai
envolver hospitais de diferentes partes do planeta. A meta é abranger
milhares de pacientes e dezenas de países, de forma a obter dados
robustos em um curto período.
Como vai funcionar:
Foi estabelecida uma sistemática simples, para que mesmo hospitais
sobrecarregados pelo coronavírus tenham condições de participar. Quando
um paciente com covid-19 for diagnosticado e considerado elegível, o
médico alimentará o site da OMS com os dados dele. O profissional
indicará as drogas disponíveis, e o site determinará de forma randômica
qual tratamento usar. Os médicos deverão informar a evolução diária do
paciente. Essas informações serão comparadas para identificar o que
funciona e o que não funciona.
Quem vai participar:
Entre os países que já se engajaram estão França, Reino Unido,
Alemanha, Espanha, Bélgica, Holanda, Luxemburgo, Argentina, Irã e África
do Sul.
Quais são os tratamentos testados:
Em lugar de tentar desenvolver um tratamento do zero, o que levaria
anos, a OMS resolveu testar drogas ou combinações já aprovadas para
outras doenças ou substâncias em desenvolvimento que já se mostraram
promissoras contra doenças causadas por outros coronavírus (como sars e
mers). Foram elegidos quatro tratamentos, que podem mudar conforme os
resultados forem aparecendo:
REMDESIVIR
O que é:
Desenvolvido para combater o vírus Ebola, o Remdesivir não mostrou
eficácia durante um surto ocorrido no ano passado na República
Democrática do Congo. Mas ressurgiu como uma das principais apostas
contra o coronavírus.
Como age: O Remdesivir inibe uma enzima que é vital
para o vírus conseguir se replicar. Em 2017, fazendo testes em
laboratório e em animais, cientistas da Universidade da Carolina do
Norte (EUA) demonstraram que o composto conseguia realizar essa tarefa
nos coronavírus que causam a sars e a mers.
Por que está em estudo: Nos Estados Unidos, foram relatados alguns casos de pacientes graves da covid-19 que se recuperaram depois de receber o medicamento, entre eles o primeiro doente diagnosticado no país, um jovem que apresentou melhora um dia depois de o remédio ser ministrado. A aplicação é intravenosa e a toxicidade é baixa.
Por que está em estudo: Nos Estados Unidos, foram relatados alguns casos de pacientes graves da covid-19 que se recuperaram depois de receber o medicamento, entre eles o primeiro doente diagnosticado no país, um jovem que apresentou melhora um dia depois de o remédio ser ministrado. A aplicação é intravenosa e a toxicidade é baixa.
CLOROQUINA E HIDROXICLOROQUINA
O que são:
Esses dois medicamentos se tornaram famosos nos últimos dias. Na
sexta-feira, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou que
eles permitiriam virar o jogo contra a covid-19, o que provocou uma
corrida às farmácias. No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa) reclassificou as duas drogas como produtos especiais
de venda controlada, receosa de que o público a adquirisse para uso
preventivo, o que seria perigoso, e também porque pacientes que
realmente precisam das substâncias não as estavam mais encontrando à
venda.
A OMS originalmente não havia incluído a cloroquina e a hidroxicloroquina entre os compostos promissores contra a covid-19, mas mudou de posição devido à atenção que estavam recebendo em diversos países. Como agem: São remédios usados há décadas para o tratamento da malária. Eles atuam nos endossomos, compartimentos das células que o vírus pode usar para entrar. No entanto, essa não é a principal forma de entrada do novo coronavírus. Por que estão em estudo: Testes com células cultivadas em laboratório sugerem que as drogas têm efeito contra o coronavírus, mas em doses elevadas, bastante tóxicas. Pesquisadores chineses e franceses relataram sucesso em pacientes de covid-19, os primeiros com a cloroquina e os últimos com a hidroxicloroquina, mas as evidências ainda são consideradas fracas pela comunidade científica.
A OMS originalmente não havia incluído a cloroquina e a hidroxicloroquina entre os compostos promissores contra a covid-19, mas mudou de posição devido à atenção que estavam recebendo em diversos países. Como agem: São remédios usados há décadas para o tratamento da malária. Eles atuam nos endossomos, compartimentos das células que o vírus pode usar para entrar. No entanto, essa não é a principal forma de entrada do novo coronavírus. Por que estão em estudo: Testes com células cultivadas em laboratório sugerem que as drogas têm efeito contra o coronavírus, mas em doses elevadas, bastante tóxicas. Pesquisadores chineses e franceses relataram sucesso em pacientes de covid-19, os primeiros com a cloroquina e os últimos com a hidroxicloroquina, mas as evidências ainda são consideradas fracas pela comunidade científica.
RITONAVIR + LOPINAVIR
O que é: Essa combinação de drogas é usada há duas décadas no combate ao HIV.
Como agem: Os dois são inibidores de protease. O
lopinavir inibe uma enzima do HIV associada à multiplicação do vírus,
enquanto o ritonavir faz o lopinavir persistir ativo por mais tempo no
organismo.
Por que estão em estudo: A expectativa é que a
combinação seja eficaz para inibir a protease de outros vírus além do
HIV. Foi demonstrada eficácia no tratamento de saguis infectados com o
vírus da mers. Em Wuhan, na China, 199 pacientes receberam um tratamento
de duas pílulas ao dia, mas não houve grande diferença de resultado em
relação a pacientes que não tomaram essa medicação. No entanto, eram
pacientes em estado muito grave, e o combinado pode ter sido oferecido
tarde demais. Não é uma medicação tóxica, mas pode causar dano ao
fígado.
RITONAVIR + LOPINAVIR + INTERFERON-BETA
O que é:
O interferon-beta é usado no tratamento da esclerose múltipla. A ideia é
usar essa substância em combinação com o ritonavir e o lopinavir para
potencializar o combate ao novo coronavírus.
Como agem: O interferon-beta é uma molécula que atua na
regulação de inflamações, enquanto as outras duas drogas inibem
proteases associadas à multiplicações de vírus.
Por que estão em estudo: Como no caso da combinação
lopinavir/ritonavir, o interferon-beta mostrou eficácia na recuperação
de saguis infectados com mers. Já há um estudo em andamento na Arábia
Saudita em que as três drogas são usadas em conjunto para tratar mers.
No entanto, em pacientes graves de covid-19, há risco de que o
interferon-beta cause dano a tecidos.
AS VACINAS
Pelo
mundo todo, laboratórios trabalham para desenvolver vacinas contra o
novo coronavírus. Confira algumas das pesquisas em andamento:
China
Uma
vacina desenvolvida pela empresa CanSino Biologics e pela Academia
Militar de Ciências Médicas da China já foi testada em animais e,
segundo os pesquisadores, teve bons resultados de segurança e de
imunização.
Na sexta-feira (20), começaram os testes em humanos, com a aplicação em 108 voluntários saudáveis que não têm a doença, de 18 a 60 anos, em um hospital de Wuhan. Eles foram divididos em três grupos e serão acompanhados por seis meses.
A vacina começou a ser desenvolvida em janeiro, quando a China enfrentava um pico de casos, e se baseia no uso de antígenos específicos que podem gerar uma resposta imune, mas sem a presença de substâncias capazes de causar infecção.
A CanSino não estabeleceu um prazo, mas informou que trabalha para tornar a vacina disponível o mais rápido possível. A perspectiva é que uma única dose garanta a proteção.
Na sexta-feira (20), começaram os testes em humanos, com a aplicação em 108 voluntários saudáveis que não têm a doença, de 18 a 60 anos, em um hospital de Wuhan. Eles foram divididos em três grupos e serão acompanhados por seis meses.
A vacina começou a ser desenvolvida em janeiro, quando a China enfrentava um pico de casos, e se baseia no uso de antígenos específicos que podem gerar uma resposta imune, mas sem a presença de substâncias capazes de causar infecção.
A CanSino não estabeleceu um prazo, mas informou que trabalha para tornar a vacina disponível o mais rápido possível. A perspectiva é que uma única dose garanta a proteção.
Estados Unidos
Em
16 de março, uma vacina financiada pelo Instituto Nacional de Saúde dos
Estados Unidos e desenvolvida pela empresa de biotecnologia Moderna
começou a se testada em 45 adultos saudáveis, de 18 a 55 anos. Uma
segunda dose, no braço, será aplicada depois de 28 dias. Nesta primeira
fase, os voluntários serão observados por seis semanas, para verificar a
segurança das doses. Na fase seguinte, será avaliada a eficácia.
A vacina norte-americana foi desenvolvida em tempo recorde porque se baseou em estudos já feitos sobre outros tipos de coronavírus, para o combate da sars e da mers. Ela utiliza a técnica de RNA mensageiro, em que se copia o código genético do vírus em vez de usar o vírus atenuado ou inativado.
Até a vacina estar disponível, acredita-se que será necessário pelo menos um ano.
A vacina norte-americana foi desenvolvida em tempo recorde porque se baseou em estudos já feitos sobre outros tipos de coronavírus, para o combate da sars e da mers. Ela utiliza a técnica de RNA mensageiro, em que se copia o código genético do vírus em vez de usar o vírus atenuado ou inativado.
Até a vacina estar disponível, acredita-se que será necessário pelo menos um ano.
Israel
Dez
dias atrás, um grupo de cientistas israelenses ganhou manchetes mundo
afora ao anunciar que teria pronta uma vacina contra o coronavírus em
"questão de semanas". O grupo atua no Instituto de Pesquisa da Galileia
(Migal), financiado pelo governo de Israel.
A estratégia do Migal consiste em adaptar uma vacina já existente usada na prevenção da bronquite infecciosa das galinhas, com base na similitude genética do coronavírus das aves e do novo coronavírus humano. Os pesquisadores afirmaram que em fevereiro, num lance de sorte, fizeram uma importante descoberta que permitiria ajustar a vacina que já existe, acelerando muito o desenvolvimento.
O anúncio foi de que os testes em humanos começariam em oito a 10 semanas, com a expectativa de que a vacina esteja disponível em um prazo de 90 dias.
A estratégia do Migal consiste em adaptar uma vacina já existente usada na prevenção da bronquite infecciosa das galinhas, com base na similitude genética do coronavírus das aves e do novo coronavírus humano. Os pesquisadores afirmaram que em fevereiro, num lance de sorte, fizeram uma importante descoberta que permitiria ajustar a vacina que já existe, acelerando muito o desenvolvimento.
O anúncio foi de que os testes em humanos começariam em oito a 10 semanas, com a expectativa de que a vacina esteja disponível em um prazo de 90 dias.
Alemanha
No
meio de março, veio a público a informação de que o presidente
norte-americano Donald Trump havia tentado obter os direitos exclusivos
de uma vacina em desenvolvimento pela farmacêutica alemã CureVac. A
empresa negou ter recebido qualquer oferta do governo dos Estados
Unidos, mas autoridades alemãs e o principal acionista da companhia
insistiram que houve a tentativa.
O episódio chamou atenção para as pesquisas que vêm sendo realizadas pela CureVac, que, segundo sua executiva Mariola Fotin-Mleczek, encontra-se em uma posição única para "combater qualquer doença infecciosa, não importa se sazonal ou pandêmica", graças ao domínio de técnicas de combinação de RNA mensageiro, conhecimento de doenças e produção de vacinas.
Depois da suposta investida norte-americana, a Comissão Europeia concedeu 80 milhões de euros à empresa, que planeja iniciar os testes de sua vacina em junho. A expectativa é que a CureVac possa produzir milhões de doses a baixo custo.
O episódio chamou atenção para as pesquisas que vêm sendo realizadas pela CureVac, que, segundo sua executiva Mariola Fotin-Mleczek, encontra-se em uma posição única para "combater qualquer doença infecciosa, não importa se sazonal ou pandêmica", graças ao domínio de técnicas de combinação de RNA mensageiro, conhecimento de doenças e produção de vacinas.
Depois da suposta investida norte-americana, a Comissão Europeia concedeu 80 milhões de euros à empresa, que planeja iniciar os testes de sua vacina em junho. A expectativa é que a CureVac possa produzir milhões de doses a baixo custo.
Brasil
O
Laboratório de Imunologia do Instituto do Coração da Universidade de
São Paulo (USP) trabalha no desenvolvimento de uma vacina a partir de
partículas semelhantes a vírus, as chamadas VLPs. O pesquisador
responsável, Gustavo Cabral, disse à Agência Fapesp que as vacinas
tradicionais, baseadas em vírus atenuados ou inativados, são muito
efetivas, mas, dado o fato de o novo corona ser um vírus pouco
conhecido, é mais seguro evitar a inserção de material genético no
organismo humano. A estratégia adotada na USP é usar as VLPs, que, por
serem parecidas a vírus, são facilmente reconhecidas pelo sistema
imunológico, mas sem ter DNA de vírus. As partículas serão inoculadas
com antígenos de coronavírus, que fazem o organismo produzir anticorpos,
ou seja, uma resposta imunológica que, espera-se, seja capaz de
desencadear uma resposta imune ao coronavírus real.
Os pesquisadores dizem que poderiam testar a vacina em animais nos próximos meses.
Os pesquisadores dizem que poderiam testar a vacina em animais nos próximos meses.
Sem comentários:
Enviar um comentário