domingo, 19 de maio de 2024

REFLEXÃO...03

 

Rio Grande do Sul: a rebelião anti-estado chegou?

A tragédia no Rio Grande do Sul está iniciando um novo marco na história recente do Brasil, talvez estejamos assistindo, onze anos depois, uma nova versão do “não é pelos vinte centavos”. A lentidão, burocracia e ineficiência estatal está cada vez mais visível e o cidadão cada vez mais percebendo o quanto o Estado inchado é desnecessário.

 

Uma característica histórica do povo brasileiro é a sua visão de que o seu governante deve ser um norte moral da nação. Apesar de muito contestada, esta é uma herança do sistema monárquico brasileiro, sustentada propositalmente pelos militares, responsáveis pelo golpe de Estado que implantou a República em nosso país.

 

A República brasileira foi implantada por membros de um inexpressivo partido republicano e por um pequeno grupo de positivistas militares, que utilizaram de seu posto para mover tropas contra o Chefe do Gabinete de Ministros e contra Dom Pedro II. Nesta ocasião muitos dos soldados envolvidos não sabiam o real motivo de suas ações, mas estavam obedecendo ordens.

 

Dom Pedro II e Princesa Isabel, contavam com o apoio popular na casa de 85%. A família Imperial fora expulsa do país na calada da noite, por medo dos golpistas de enfrentarem uma revolta popular. Ao proclamarem a república, não tiveram a coragem de declarar abertamente suas intenções políticas e de organização do Estado brasileiro. Prometeram ao povo que seriam consultados para ele decidir qual o regime político seria adotado, deixando assim a possibilidade de retorno à Monarquia. Infelizmente, a promessa demorou 103 anos para ser cumprida e sabemos o final desta história.

 

 

Ao longo destes 103 anos, assistimos um regime falho, que alterou a organização do Estado no segundo reinado de uma aristocracia, ainda que falha, para uma oligarquia, caracterizada por um pequeno grupo de interesse ou lobby que controla as políticas sociais e econômicas em benefício de interesses próprios. Esses grupos monopolizam o mercado econômico, político e cultural de um país, mesmo sendo a democracia o sistema político vigente.

 

Ao longo de 135 anos de República, o Brasil já passou por diversos ditadores, constituições e Presidentes, mas os mesmos grupos e famílias oligárquicas permanecem no poder, sempre oferecendo uma migalha “democrática” do voto que, em um total de 513 deputados, o povo elegeu somente 28 diretamente pelo voto nas últimas eleições de 2022.

 

Este cenário, porém, vem mudando drasticamente na última década no Brasil, e isto traduz profundamente o que esta acontecendo no Rio Grande do Sul atualmente. O sistema republicano brasileiro sempre prezou pela imagem de governo forte, centralizador e que era a coluna de sustentação do povo, aquele sem o qual não seria possível a sobrevivência do cidadão comum. O brasileiro foi doutrinado a enxergar o Estado como um pai que lhe oferece tudo “de graça” e oferta todos os “direitos adquiridos” para o bem maior e proteção, afinal, o Estado só quer o bem de seu povo.

 

Este processo politico-retórico, foi amplamente utilizado pelos sub-grupos da oligarquia, como os sindicatos e a máquina estatal do funcionarismo público. Para aumentar o alcance desta propaganda e visão de nação, quase a totalidade de concessões de rádio e afiliadas de emissoras de televisão no Brasil foram concedidas para membros da oligarquia, em boa parte clãs familiares políticos.

 

Nos últimos dez anos, a tecnologia mudou drasticamente estes dois pontos de controle estatal. A tecnologia possibilitou a criação de diversos meios de trabalho antes inimagináveis, literalmente em todas as áreas. Médicos que antes tinham como aspiração trabalhar com carteira assinada em grandes hospitais, hoje atendem pacientes em qualquer lugar do mundo, de qualquer lugar do mundo, sem a necessidade de um consultório fixo e ganham muito mais por isso. Um operário, tão usado pelos marxistas, não precisa mais da falsa luta de classes patrão-empregado, na qual os sindicatos eram os juízes e operadores políticos dos oligarcas. O operário percebeu que mesmo sem os “direitos adquiridos”, ele definia a sua carga de trabalho e conseguia ganhar muito mais, que seu esforço ditaria o seu ganho. Em suma, deu-se conta de que não precisava da tutela do Estado e da “proteção” da CLT.

 

Na outra ponta, as redes sociais retiraram o cabresto de boa parte da população no campo da informação, criando a possibilidade de diversos jornalistas independentes trabalharem sem a edição política das redações. A população virou uma massa de repórteres amadores com um simples celular e o trabalho de estabelecer uma narrativa central ficou bem mais difícil.

 

Como evolução natural deste processo, nos últimos anos começou a tornar-se comum, notícias de iniciativas populares, em que um grupo de cidadãos passaram a resolver os seus próprios problemas locais, sem esperar pelo poder público. Construindo pontes, pavimentando ruas e tantos outros exemplos.

 

 

Neste ano de 2024, estamos assistindo a uma das maiores tragédias de nossa história, até o momento classificada como desastre natural, mas com fortes indícios de negligência ou incapacidade estatal de evitar o desastre. O mundo está comovido com a situação do Rio Grande do Sul.

 

Diante do desastre e a emergência, o enorme e burocrático aparato estatal brasileiro mostrou-se lento no socorro nos primeiros dias de caos, levando a iniciativa privada e a população a tomar a frente e trabalhar para resolver o problema, mesmo que descoordenada, salvar milhares de vidas. Para isso, contou com a tecnologia para receber apoio direto de brasileiros de todos os lugares e de todas as formas, até mesmo localizando pelas redes sociais quem estava necessitando de resgate e operando com grupos de resgate locais.

 

Boa parte do trabalho foi realizada pela população civil, pela união do povo e o censo de caridade cristã, tão presente no brasileiro. Este cenário criou um grande problema para o poder público brasileiro: pois através das redes sociais, foi possível para as vítimas do desastre mostrarem a lentidão do gigante e burocrático Estado em resolver os problemas, e, da mesma forma, o restante da população perceber o quanto ela estaria desamparada pelo Estado em situação similar.

 

Não existe nada pior para o Estado do que a população perceber o quanto ele não é necessário, ao menos na proporção ao qual se vende. O povo do Rio Grande do Sul e brasileiros que se deslocaram para a região conseguiram criar meios de ação e diversas áreas: saúde, abrigos, alimentação, resgate e acredite, segurança pública. Em meio as enchentes, moradores criaram grupos armados para combater os grupos criminosos.

 

Para piorar a situação, a burocracia estatal, além de lenta, passou a atrapalhar o processo, com caminhões com doações sendo multados por não terem a Nota Fiscal das doações ou por estarem acima do limite do peso. Este caso que gerou o primeiro grande embate do poder público e das militâncias de redação contra o povo. Uma extensa campanha de lavagem cerebral foi iniciada, classificando toda e qualquer denúncia como fake News, que estão custando vidas. O governo, emite ordens de investigação e criminalização de cidadãos comuns por suas opiniões e ações de apoio à população.

 

A rede Globo de Televisão, faz coro à perseguição estatal, mas a cada falsa acusação, em menos de vinte quatro horas era desmentida. A situação do Estado tornou-se tão crítica, que passou a apelar por diversos meios a uma urgência para regular os meios de comunicação. Pois precisa, segundo a sua retórica, salvar vidas das pessoas contra as milícias digitais.

 

Indo além do desastre no Rio Grande do Sul, o governo, desde o primeiro dia de sua administração, está trabalhando para retirar a sua independência laboral, atuando de todas as formas acabar com o trabalho independente e voltar ao cabresto dos sindicatos e alimentar o leviatã faminto dos impostos. Para isso dá o nome de defesa dos direitos do trabalhador.

 

A verdade é justamente o inverso, o Estado brasileiro e o discurso populista do PT está sob escrutínio, mais do que isto, a oligarquia brasileira precisa salvar-se das mãos desacorrentadas do povo brasileiro. Como ousam sentirem-se livres do controle estatal e dos grupos de interesses que sempre cuidaram do povo?

 

O brasileiro, cada vez mais, está sentindo o ar da liberdade batendo em seu rosto, está gostando disto e assustando o Estado, que desesperado, tenta de todas as formas convencer a população do quanto é necessário, nem que para isso seja com uma chibata na mão e repressão. É preciso silenciar, reprimir e oferecer salvação, pois o povo não sabe o que quer, porque não ouve o que precisa saber, e meus caros… o povo está ouvindo e vendo o que precisa saber.

 

 

Paulo Henrique Araujo

Analista político, palestrante e escritor; é o fundador do portal PHVox e também apresenta os programas ao vivo em nosso canal do YouTube. É um estudioso da história brasileira, principalmente referente ao período colonial e monárquico, e da geopolítica latino-americana

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