Ficar em casa: as tentações da quarentena
Por João Leonel
Estamos
vivendo tempos de risco à saúde mundial, de quebra de bolsas de
valores, de corrida aos supermercados, de fechamento de escolas e
empresas, de isolamento humano.
Mais do que tudo, a
pandemia que enfrentamos afeta nossos valores. Valores humanos. Somos
desafiados a nos vermos e nos assumirmos como humanos neste dia sombrio
da humanidade.
Lembro-me de Jesus Cristo. De quando,
sendo Deus, manteve-se firmado em sua humanidade para enfrentar as
investidas do diabo no deserto (Lucas 4.1-13). Sozinho, isolado.
Naquele
momento a união com a humanidade que veio salvar estava em jogo. Jesus
seria o Cristo se, assumindo plenamente sua natureza humana, vencesse os
desejos mais básicos e, ao mesmo tempo, profundos e perversos do
coração humano.
Como nós, nestes tempos do novo coronavírus.
Jesus, em quarentena, foi tentado pelo diabo. Não era um tempo de descanso, de férias, de tempo livre.
Não nos enganemos. A reclusão, a quarentena a que estamos submetidos, nada tem de férias. É tempo de tentação.
Mesmo reconhecendo necessário ficarmos isolados, logo começamos a levantar nossas vozes em protesto.
O
primeiro deles é referente à nossa subsistência. Vemos em outros
países, mas no Brasil também, a preocupação com a estocagem de
alimentos. Estamos preocupados com o pão.
Se Jesus foi
tentado a transformar pedras em pães “ao final dos quarenta dias”,
quando teve fome (4.2), nós, séculos depois, com tecnologia e expertise
agropecuárias e uma forte indústria alimentícia, nos primeiros dias de
reclusão já pensamos em correr ao supermercado.
Neste momento de crise da humanidade é o pão que nos preocupa!
O
segundo protesto se dirige à passividade a que somos relegados. Nós,
seres produtivos, pessoas importantes em cargos e atividades sem as
quais a sociedade não sobreviverá, certamente concordaríamos e
aceitaríamos, de bom grado, que em lugar de lutarmos cotidianamente para
obter a “glória dos reinos do mundo” (4.5-6), ela nos fosse dada em um
passe de mágica.
>> Conselhos da Itália para florescer no isolamento <<
>> Conselhos da Itália para florescer no isolamento <<
Se
Jesus não aceitou glória que não fosse aquela advinda da cruz, nós
lutamos pela glória pessoal, que se manifesta em nossas relações
profissionais, sociais e até familiares.
Mas, agora, somos privados de tais relações!
Por
fim, nosso último protesto se dirige a Deus. Afinal, ele é nosso
protetor. É ele que se coloca ao nosso lado quando “caem mil ao nosso
lado e dez mil à nossa direita” (Sl 91.7). É ele que, segundo o salmo,
envia anjos para nos guardarem. Por isso, diz o diabo, Jesus pode se
jogar da torre do templo para que todos contemplem como Deus o
protegerá.
Somos tentados a, em uma versão distorcida e
manipuladora do cuidado que Deus promete nos conceder, deixarmos os
cuidados necessários diante da pandemia e assumirmos, por motivos
religiosos, posturas egoístas e perigosas para a sociedade.
Os quarenta dias, a quarentena, quando Jesus enfrentou as tentações do diabo, foram tempos de teste de sua humanidade.
O
período que devemos permanecer recolhidos em nossas casas testará em
profundidade nossa humanidade. Agir em descumprimento das orientações
que temos recebido revelará que, diferentemente de Jesus, somos pessoas
facilmente vencidas pela tentação.
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