O termo
tupinambá pode ser usado de duas formas. Pode ser designativo dos povos
indígenas brasileiros que, por volta do século XVI, habitavam duas regiões da
costa brasileira: a primeira ia desde a margem direita do rio São Francisco até
o Recôncavo Baiano;[1] a segunda ia do cabo de São Tomé, no atual estado do Rio
de Janeiro, até São Sebastião, hoje o estado de São Paulo. Esse segundo grupo
também era denominado de tamoio.[2][3] Ao todo, ambos os grupos compunham-se de
100.000 indivíduos e eram a nação indígena mais conhecida de toda a costa
brasileira pelos navegadores europeus do século XVI.[1] Mas tupinambá também
pode se referir a todos os povos que, durante o início do contato colonial
português, falavam alguma variante do idioma tupi antigo, desde o Pará até o
sul do país, aproximadamente até o paralelo de 27 graus (segundo informações do
cronista Pero de Magalhães Gândavo). Entre esses povos estavam os tupiniquins,
potiguaras, tupinambás, temiminós, caetés, tabajaras, tamoios, tupinaés etc.[4]
Tupinambá
Cerimônia
religiosa de índios tupinambás em gravura de Theodor de Bry
População
total
4.669[carece
de fontes]
Regiões
com população significativa
Municípios
de Ilhéus, Buerarema e Una, no estado da Bahia, Baixo Tapajós no estado do Pará
no Brasil
Línguas
Tupi
antigo, Nheengatu,Português
Religiões
Religião
étnica Tupinambá, Catolicismo
Etnia
Tupi-guarani
Atualmente
povos tupinambás vivem na vila de Olivença no estado da Bahia,[5] no Baixo rio
Tapajós no estado do Pará[6] e em algumas regiões urbanas do sudeste como Rio
de janeiro e Espirito Santo.[carece de fontes]
O
escritor Eduardo Bueno, baseado nos escritos de Teodoro Sampaio, afirma que o
termo "tupinambá" é oriundo do tupi tubüb-abá, que significa
"descendentes dos primeiros pais",[7] através da junção dos termos
tuba (pai),[8] ypy (primeiro)[8] e abá (homem).[9]
Em
sentido diverso, o tupinólogo Eduardo Navarro em seu Dicionário de Tupi Antigo
(2013) sugere a etimologia "todos da família dos tupis", através da
junção de tupi (tupi), anama (família) e mbá (todos).[10]
Origens
Quando
os europeus chegaram ao que viria a ser o Brasil, encontraram uma população
ameríndia bastante homogênea em termos culturais e linguísticos, distribuída
grosso modo ao longo de toda a costa e na bacia Paraná-Paraguai. A despeito
dessa homogeneidade, divisaram-se dois grandes blocos subdividindo essa
população: ao sul, os guaranis, que ocupavam a bacia supracitada e o litoral,
desde a Lagoa dos Patos até Cananeia, no atual estado de São Paulo; e os Tupi
que dominavam a faixa litorânea desde Iguape até, pelo menos,a costa do Ceará.
Este continuum tupi-guarani só era interrompido em alguns pontos do litoral:
próximo ao estuário do Prata pelos Charrua, na foz do rio Paraíba pelos
Goitacá, pelos Aimoré no sul da Bahia e norte do Espírito Santo, e pelos
Tremembé na faixa entre Ceará e Maranhão.[11]
Essas
populações eram chamadas tapuia, um termo genérico para índios não Tupi, e
dominavam originalmente o litoral, tendo sido daí expulsas — com as poucas
exceções citadas acima — no bojo da conquista Tupi.
Possíveis
rotas migratórias tupinambás.[11]
Existem
dois grandes modelos desse processo de expansão tupi-guarani na costa
brasileira. A ideia dominante é a de um movimento migratório de sul para norte,
a partir da bacia Paraná-Paraguai, onde tupinambás e guaranis teriam se
separado. Métraux sugere que a dispersão litorânea era um fato recente na época
da Conquista, dada a identidade cultural entre os vários grupos que ocupavam a
costa.[12] O segundo modelo, mais recente e baseado na interpretação de dados
arqueológicos, inverte o sentido do deslocamento tupinambá. Brochado acredita
que,a partir de um nicho originário amazônico, teríamos dois movimentos
migratórios de orientações diversas: os proto-guaranis teriam rumado para o sul
via Madeira-Guaporé e atingido o rio Paraguai, espalhando-se ao longo de sua
bacia desde o início da era cristã (ou, em estimativas mais conservadoras, a
partir do século V); já os proto-tupinambás teriam descido o Amazonas até sua
foz, expandindo-se, em seguida, pela estreita faixa costeira em sentido
oeste-leste, e depois norte-sul. A ocupação total do litoral teria ocorrido
entre 700-900 d.C. e 1000-1200 d.C, quando os grupos Tupi mais ao sul teriam
sua expansão barrada pelos guaranis.[13][11]
Esse
segundo modelo baseia-se numa hipótese forte — a de uma longa separação (mais
de 1500 anos) entre tupinambás e guaranis — que se choca com um certo consenso
estabelecido, baseado na proximidade linguística e cultural dessas populações.
Cabe, pois, a Brochado o ônus da prova, e, apesar de sua alimentação
convincente, suas evidências são frágeis: são poucas as datações por
radiocarbono de cerâmica atribuída aos Tupi; não há uma diferença substantiva
entre as datações mais antigas no Rio de Janeiro (980 ± 100 d.C), e as do
extremo nordeste da costa (SOO ±65 d.C); não há nenhum sítio datado atribuído
aos tupinambás, entre a foz do Amazonas e o Rio Grande do Norte (os cronistas
falam de uma ocupação Tupi tardia do Pará e do Maranhão, por indígenas do
nordeste que fugiam da opressão colonial).[14][15] Resta-nos aguardar, assim, o
prosseguimento dos trabalhos arqueológicos.[11]
Organização
social
Pouco
se sabe a respeito da composição e do funcionamento da tribo como unidade
inclusiva. A única coisa evidente é que ela abrangia certo número de unidades
menores, as "aldeias" (ou grupos locais), distanciadas no espaço mas
unidas entre si por laços de parentesco e pelos interesses comuns que eles
pressupunham, nas relações com a natureza, na preservação da integração tribal
e na comunicação com o sagrado. Na vida quotidiana os indivíduos podiam agir,
largamente, como membros da ordem existencial criada pelo grupo local. Mas, em
assuntos relacionados com o deslocamento da tribo de uma região para outra, a
circulação das mulheres entre as parentelas, a realização de uma expedição
guerreira, o sacrifício de inimigos etc., as ações eram reguladas pela teia de
interesses comuns.[16]
Habitação
Conselho
dos chefes sob o luar em Ubatuba, para decidir sobre a morte de Hans
Staden.[17]
Os
tupinambás, no início do contato com os portugueses, moravam em malocas. Cada
grupo local tupinambá se compunha de cerca de 6 a 8 malocas. A população dessas
tribos girava em torno de 200 indivíduos, mas podia atingir até 600.[18] As
malocas teriam uma largura constante, variando seu comprimento de acordo com o
número de moradores agrupados nas subdivisões internas reservadas aos lares
políginos, de vinte a quarenta em cada maloca, conforme as estimativas mais
baixas. O acesso e a saída dos indivíduos eram feitas por três aberturas, duas
localizadas nas extremidades e, outra, no centro da maloca. Enquanto duravam os
materiais de que eram construídas, proporcionavam boa renovação do ar e abrigo
confortável contra a inclemência do sol ou os excessos da chuva.[16]
Os
grupos locais compunham-se, em média, de quatro a sete malocas ou habitações
coletivas. Estas eram dispostas no solo de modo a deixar uma área quadrangular
livre, o terreiro, bastante amplo para a realização de Cerimônias como as
reuniões do conselho de chefes, o massacre e a ingestão das vítimas, as
atividades religiosas lideradas pelos pajés, as festas tribais, etc., as quais,
muitas vezes, também envolviam a participação dos membros dos grupos locais
vizinhos. Em zonas sujeitas ao ataque de grupos tribais hostis, as malocas eram
circundadas por uma estacada ou caiçara, feita com troncos de palmeiras
rachados, ou por um duplo sistema de paliçadas, entre os quais colocavam
estrepes agudos e cortantes.[16]
Economia
No
início do período colonial a sociedade tupinambá vivia da caça, coleta, pesca,
além de praticar a agricultura, sobretudo de tubérculos, como a mandioca e a
horticultura, possuindo o equipamento material que permitia a realização dessas
atividades econômicas.[16]
A
divisão de trabalho era por sexo, cabendo aos homens as primeiras atividades e
às mulheres o trabalho agrícola, exceto a abertura das clareiras para plantar,
feita à base da "queimada", tarefa essencialmente masculina. O
plantio e a colheita, o preparo das comidas e o artesanato (confecção de vasos
de argila, redes, etc) eram trabalhos femininos. Instrumentos de guerra - arcos
e flechas, maças, lanças - eram feitos pelos homens. Os artefatos de guerra ou
de trabalho eram de madeira e pedra, e desta última eram inclusive os machados
com que cortavam madeira para vários fins.[18]
Os
tupinambás ignoravam a exploração econômica do trabalho escravo. Seus cativos
eram tratados como membros do "nosso grupo" até a data do sacrifício.
Comumente podiam fazer mutirões onde os vizinhos eram convocados a trabalhar em
grandes trabalhos como preparação de roças ou malocas, onde trabalhavam até dez
horas e depois bebiam cauim em comemoração. Isso podia se repetir por quantos
dias fosse necessário. Esse tipo de trabalho era pago da mesma forma, conforme
a necessidade de cada um dos que ajudaram anteriormente.[16]
Costumes
Apesar
de terem raízes comuns, as diversas tribos que compunham a nação tupinambá
lutavam constantemente entre si, movidas por um intenso desejo de vingança, que
resultava sempre em guerras sangrentas em que os prisioneiros eram capturados
para serem devorados em rituais antropofágicos. Autores como o alemão Hans
Staden ("História verdadeira e descrição de uma terra de
selvagens...")[19] e os franceses Jean de Léry ("História de uma
viagem feita à terra do Brasil") e André Thevet ("As singularidades
da França Antártica..."), todos do século XVI, além das cartas jesuíticas
da época, nos dão notícias muito precisas acerca de quem eram e de como viviam
os tais índios.
No
livro As incríveis aventuras e estranhos infortúnios de Anthony Knivet há a
seguinte narrativa:
(...)
[os franceses] deixavam entre os gentios [tupinambás] alguns mancebos para
aprenderem a língua e poderem servir na terra (...) os quais se amancebaram na
terra (...) e viveram como gentios com muitas mulheres, dos quais inçou a terra
de mamelucos, que nasceram, viveram e morreram como gentios, e há hoje muitos
de seus descendentes, que são louros, alvos e sardos e, havidos por índios
tupinambás, e são mais bárbaros do que eles.[20]
Em
todas os povos tupis, eram comuns as referências a "heróis civilizadores",
como chama Alfred Métraux em seu livro "A Religião dos Tupinambás e suas
relações com a de outras tribos tupi-guaranis". Esses heróis eram
divindades que haviam criado ou dado início à civilização indígena (Meire
Humane e Pae Zomé — mito ameríndio comum em toda a América Meridional). Também
era comum a intercessão dos pajés junto aos espíritos através do uso dos
marocás, chocalhos místicos cujo uso era obrigatório em qualquer cerimônia.
Os
tupinambás da Região Sudeste do Brasil tinham um vasto território, que se
estendia desde o rio Juqueriquerê, em São Sebastião/Caraguatatuba, no estado de
São Paulo, até o cabo de São Tomé, no estado do Rio de Janeiro. Contudo, o
grosso da nação tupinambá assentava-se ao redor da Baía da Guanabara e em Cabo
Frio, onde fabricavam o gecay, que era a mistura de sal e pimenta que os índios
vendiam aos franceses (chamados pelos tupis de maíra, nome originário de Meire
Humane), com os quais se aliaram quando estes estabeleceram a colônia da França
Antártica na Baía de Guanabara.
Confederação
dos Tamoios
Distribuição
dos grupos de língua tupi na costa brasileira no século XVI
Ver
artigo principal: Confederação dos Tamoios
As
tentativas de escravização dos índios para servirem nos engenhos de açúcar no
núcleo vicentino levaram à união das tribos numa confederação sob o comando de
Cunhambebe chamada de "Confederação dos Tamoios", englobando todas as
aldeias tupis desde o Vale do Paraíba Paulista até o Cabo de São Tomé, com
invejável poderio de guerra.
É nesse
ínterim que Nóbrega e Anchieta teriam sido levados por José Adorno de barco até
Iperoig (atual Ubatuba), para tentar fazer as pazes com os índios. Segundo a
tradição, Nóbrega voltou até São Vicente com Cunhambebe e o padre José de
Anchieta ficou cativo dos tupis em Ubatuba. Nesse período, ele teria escrito o
"Poema da Virgem". Supostamente, fatos lendários e fantásticos teriam
ocorrido nesta época do cativeiro, como o milagre de Anchieta, como o levitar
entre os índios, que horrorizados, queriam que ele dali se retirasse pois
pensavam tratar-se de um feiticeiro.
Seja
como for, os padres, com muita diplomacia, conseguiram desmantelar a
Confederação dos Tamoios, promovendo a Paz de Iperoig, o primeiro tratado de
paz das Américas. Diz-se que, depois de feitas as pazes, Nóbrega advertiu os
índios de que, se voltassem atrás na palavra empenhada, seriam todos
destruídos, profecia que, de fato, se concretizou. Quando os portugueses
atacaram os franceses do Rio de Janeiro, estes últimos pediram ajuda aos
índios, que acudiram seus aliados. Isso levou ao extermínio dos tupinambás que
moravam em aldeias em torno da Baía da Guanabara, na segunda metade do século
XVI. Os que conseguiram se salvar foram os que se embrenharam nos matos com
alguns franceses e os índios tupis de Ubatuba que, para não ajudarem os irmãos
do Rio e não correrem riscos, ou fugiram pelas matas ou foram assimilados pelos
colonos em Ubatuba, gerando a atual população caiçara daquela região, assim
como a população cabocla do Vale do Paraíba.
Contudo,
o golpe fatal nos tupis foi o ataque ao último reduto francês em Cabo Frio, com
a destruição de todas as aldeias. Tudo destruído com fogo e passado ao
"fio da espada". Por esses motivos e por algumas declarações que
denotariam, em tese, a conivência com o extermínio indígena, é que o padre José
de Anchieta tem sido considerado muito polêmico até os dias atuais, embora,
noutras oportunidades, tenha declarado que se entendia melhor com os índios do
que com os portugueses.
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