Rússia e o massacre de civis na Ucrânia
Em uma guerra, a primeira coisa que morre é a verdade, logo
em seguida vem a compaixão e a caridade. Nesta segunda-feira a Rússia lançou
uma série de bombardeios contra alvos não militares, dizimando a vida de pelo
menos 30 pessoas. Mas a nota triste e perturbadora foi o bombardeio de um
hospital pediátrico na capital Kiev.
Uma das marcas tristes em qualquer guerra, é a quantidade de
inocentes vitimados durante o conflito. As baixas civis tornam-se uma equação
numérica ao longo do tempo e, com o passar do tempo, as pessoas que acompanham
o processo tendem a se dessensibilizar, tratando praticamente a questão como
trivial.
O conflito na Ucrânia tem sido marcado não somente por
mortes de civis, mas por ataques premeditados a estes alvos, justamente para
causar terror na população e assim pressionar cada vez mais o governo de Kiev.
Ainda no início da guerra, no dia 09 de março de 2022, o exército de Vladimir
Putin bombardeou o hospital infantil e maternidade da cidade de Mariupol. O
caso na época entrou na rota de desinformação, onde as máquinas criadas para
moldar a opinião pública, tentaram de todas as formas classificar o evento como
algo fabricado. A quantidade de formadores de opinião, inclusive no Brasil, que
compraram esta narrativa foi enorme.
Ainda em 2022, no mês de abril, veio à tona o que ficou
conhecido como o Massacre de Bucha, cidade localizada na região metropolitana
de Kiev, ocupada por tropas de assalta aéreo e paraquedistas da Rússia. O
objetivo principal era manter a cidade dominada, servir como apoio local das
tropas que chegariam por transportes aéreos pós-tomada do aeroporto de
Hostomel. O plano não saiu como o esperado, as tropas russas demoraram dias
para tomar o aeroporto, sofrendo pesadas baixas, o que possibilitou aos
ucranianos destruir a pista de pouso e inutilizar o aeroporto.
Neste cenário, as tropas russas estacionadas em Bucha
ficaram isoladas, aguardando o famoso comboio russo de quilômetros de extensão,
que chegaria à Kiev para tomar a capital. Como sabemos, esta estratégia também
foi aniquilada pelos ucranianos. Neste processo, as tropas estacionadas em
Bucha, cada vez mais sem suprimentos e apoio logístico, passaram a massacrar a
população local: prendendo sem discrição a maioria dos homens da cidade,
executando civis nas ruas e deixando seus corpos expostos para sem incinerados
ou mesmo comido por cães. Foram encontrados diversos civis executados de
joelhos com as mãos amarradas para trás em prédios da cidade.
Mais recentemente, no primeiro semestre de 2023, o Tribunal
Penal Internacional emitiu mandado de prisão contra Vladimir Putin e outras
autoridades russas pelo alegado sequestro de pelo menos vinte mil crianças, a
maioria delas retiradas de suas famílias arbitrariamente, para serem entregues
para adoção forçada a outras famílias dentro da Rússia.
Os casos são diversos e se empilham: ataque à mercado
popular, shopping centers, zonas de alimentação e tantos outros, o terror
contra civis distantes de zona de conflitos e alvos militares são praticamente
corriqueiros.
Nesta segunda-feira, 08 de julho de 2024, a Rússia atingiu
cidades em toda a Ucrânia com uma enxurrada de mísseis que mataram trinta e uma
pessoas no total e danificaram gravemente um hospital infantil em Kiev, em mais
um ataque condenado como implacável contra civis.
Dezenas de voluntários, médicos e socorristas escavavam os
escombros de uma parte do hospital pediátrico de Okhmatdyt, em uma busca
desesperada por sobreviventes após o bombardeio diurno incomum, puderam verificar
jornalistas da AFP no local. As equipes de resgate correram para se proteger
quando as sirenes soaram e uma nova explosão ocorreu após os primeiros
bombardeios, o ataque deixou quatro mortos em uma maternidade em outro distrito
de Kiev, conforme os serviços de emergência.
Milhares de pessoas correram para o local, pouco depois que
os sobreviventes do ataque saíram do abrigo subterrâneo do hospital infantil
Okhmatdyt, a multidão se reuniu para formar uma corrente humana e remover os
escombros com as mãos.
Moradores, equipes de resgate, militares e médicos cobertos
de sangue ajudaram a remover os escombros do hospital destruído. Dois blocos
hospitalares próximos também foram gravemente danificados pela explosão, com a
maioria das janelas explodidas e sangue derramando em suas paredes.
Algumas vítimas do atentando terrorista falaram sobre o que
viveram:
Enquanto os mísseis caíam sobre Kiev, Pavlo Holoviy correu
para o hospital infantil, onde seu filho se recuperava de uma operação recente.
Quando ele chegou, a fumaça ainda estava saindo dos escombros. O homem de 37
anos disse que era “impossível expressar” suas emoções depois de encontrar a
esposa e o filho seguros.
“Honestamente, o principal foi ver minha esposa e meu filho,
não prestei atenção ao resto”, disse Holoviy.
Natália Sheyan, falando à Agência EFE, ao lado do seu filho
declarou: “Meu filho Sasha estava na seção de traumatologia. Houve uma explosão
e tivemos que sair muito rápido. Havia muitas crianças feridas sob os
escombros”. Natália Sheyan explicou que o filho deve retornar ao tratamento
dentro de um mês, mas teme que isso não seja possível por causa da destruição
causada pelo ataque. “Seu médico também tem um ferimento na cabeça que ele
sofreu enquanto protegia outra criança durante a explosão. Não sei mais o que
dizer, estou em choque e não consigo entender como eles podem atacar um
hospital com crianças”.
De acordo com o prefeito de Kiev, Vitali Klitchko, até o
momento em que este vídeo foi gravado, foi confirmada a morte de dois adultos
no hospital infantil, um deles era médico. Além disso, houve pelo menos 16
feridos, incluindo sete crianças.
Vidros quebrados e gotas de sangue espalharam os corredores
e portas do hospital, onde equipes de emergência vasculharam o complexo em busca
de sobreviventes.
“As instalações estão destruídas. No momento, provavelmente
é impossível trabalhar”, disse Oleksandr, médico do hospital, à AFP.
Uma explosão foi ouvida mais tarde na capital, o que fez com
que socorristas e moradores ajudassem na operação de resgate.
Nos tijolos e ferros da ala hospitalar completamente
destruída no bombardeio russo, bombeiros, socorristas, médicos do hospital e
voluntários simples sem uniformes formaram uma corrente humana que se estendeu
para outra área menos afetada pelo ataque.
Mais tarde, as autoridades locais disseram que um segundo
centro médico foi atingido em Kiev, matando pelo menos quatro pessoas.
O Ministério da Defesa russo afirmou mais tarde que os danos
em Kiev foram causados por um míssil de defesa aérea ucraniano. O ministério
não forneceu provas para suas alegações, contradizendo o que os vídeos
mostraram.
O bombardeio russo ocorreu quando o presidente ucraniano,
Volodymyr Zelensky, desembarcou em Varsóvia, para assinar um acordo de
segurança com o primeiro-ministro Donald Tusk. Após a visita, estava programada
a sua ida para a cúpula da Otan em Washington, onde deve pedir mais apoio
militar aos aliados do país.
Em Varsóvia, o líder ucraniano pediu aos seus aliados “uma
resposta mais enérgica ao golpe que a Rússia mais uma vez desferiu à nossa
população, à nossa terra e às nossas crianças”.
A ONU condenou a onda de ataques dizendo ser “inconcebível
que crianças sejam mortas e feridas nesta guerra”, enquanto Josep Borrell, da
UE, atacou a Rússia por atacar “impiedosamente” civis. A França condenou os
ataques, com o Ministério das Relações Exteriores chamando de “bárbaro” o
bombardeio de um hospital infantil em Kiev.
“A Rússia não pode alegar que não sabe para onde voam seus
mísseis e deve ser responsabilizada por todos os seus crimes”, disse Zelensky
em outra mensagem publicada nas redes sociais.
Voltando um pouco no tempo e à máquina de desinformação, uma
dentre tantas justificativas para a invasão da Ucrânia por Vladimir Putin, era
salvar crianças inocentes que estavam sendo utilizadas como escravas para a
extração de adrenocromo mediante sofrimento físico e psicológico. O que serve
como prato cheio para agentes locais de desinformação no ocidente e isca para
os inocentes úteis que aceitam terem suas consciências adormecidas, em um
processo psicológico de transformar as vítimas inocentes da guerra em não
pessoas, e pior ainda, apenas estatísticas e efeito colateral aceitável.
Paulo Henrique Araujo
Analista político, palestrante e escritor; é o fundador do
portal PHVox e também apresenta os programas nosso canal do YouTube. É um
estudioso da história brasileira, principalmente referente ao período colonial
e monárquico, e da geopolítica latino-americana.
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