4-Cátaros,
Albigenses e Valdenses (uma história que precisa ser contada ou, porque deixei
de ser católico) – 4ª. Parte ...
Por
mais que tentem, os inimigos das verdades bíblicas não conseguem impedir sua
divulgação. “A palavra de Deus não está amarrada”, diz 2 Timóteo 2:9.
Conhecido
como "Povo do Livro ", as Sagradas Escrituras é o que encarna a fé
dos valdenses - eles viveram e morreram por ela. Eles foram torturados,
exilados e martirizados e, ainda assim, a fé que os levou dos Vales Alpinos da
Itália, para lugares tão longínquos como a Colônia Valdense do sudoeste do
Uruguai, até o sopé das Montanhas Apalaches no oeste da Carolina do Norte,
sempre sobreviveu. A Trilha da Fé é a sua história - cada exposição testemunhar
a jornada que os levou, desde o tempo dos apóstolos, buscar a liberdade
religiosa cristã e o bem estar para suas famílias.
Os
valdenses acreditavam, e acreditam que a Bíblia é aberta à interpretação por
parte de todos e eles levaram a sério a missão de compartilhar a mensagem a
todo o mundo. Durante séculos, eles procuraram a servir a Deus, compartilhando
o seu amor e espalhando sua Palavra. Um povo pacífico, eles encontraram-se
frequentemente em guerra, pois procuraram ser fiel à sua fé. Eles adoravam em
segredo por medo de ser capturados e mortos, memorizando as Escrituras na
preparação de que suas Bíblias podiam ser queimadas. Mais de uma vez na
história, os governantes pensavam eles haviam sido erradicados, mas de tempos
em tempos, surgiu um remanescente para continuar.
Os
Valdenses
Durante
toda a Idade Média, numerosos grupos de irmãos se separaram da cristandade
oficial para procurar uma forma de cristianismo mais puro e apegado à
simplicidade evangélica, dando preferência em respeitar a autoridade da Palavra
de Deus, do que a dos decretos das autoridades eclesiásticas, por entenderem
que a Bíblia é superior às tradições da Igreja.
Na
primeira parte desta série de postagens, com o estudo sobre as irmandades dos
cátaros e dos albigenses, pudemos conhecer o alto preço que muitos deles
tiveram que pagar, por causa da sua fidelidade à Palavra de Deus ou,
simplesmente, por querem viver separados da igreja oficial de Roma. Ao longo da
história humana na era cristã, o caminho da fé tem sido regado, frequentemente,
com o sangue do seu martírio.
Na
Europa ocidental, tanto os albigenses, quanto os cátaros cresciam,
especialmente na França e na Espanha. Já, nos vales alpinos, do norte da Itália
e do sul da Suíça, por sua vez, por vários séculos prosperaram outro grupo de
irmãos de características um tanto quanto diferenciada dos primeiros, aos quais
a história denominou pelo termo "Valdenses".
Na
verdade, podemos afirmar que, diferente dos cátaros e albigenses, cujos
remanescentes precisaram evoluir até aderirem a uma igreja surgida da reforma
protestante no século XVI, quando não seguiram uma linha diferente que
desembocou na formação de novas irmandades, tais como a Franco-maçonaria, os
valdenses continuaram sempre existindo em linha direta, até os dias de hoje,
como comunidade cristã de certo modo fiel, se comparados à sua forma original.
Aqueles
que tiverem a oportunidade de visitar a cidade de Roma na atualidade, terá uma
certa dificuldade de encontrar igrejas evangélicas ali: a maioria das pessoas
que habitam de Roma, e que tenham alguma religião que possa ser considerada
cristã são, em sua grande maioria, católicos romanos.
Igreja
Evangélica Valdense da Praça Cavour - Roma
As
poucas igrejas evangélicas existentes na Roma atual são, em geral, de cultos em
língua inglesa, como a Batista, dos norte-americanos e a Presbiteriana, dos
escoceses, ambas frequentadas, em grande parte, por pessoas que se encontram em
trânsito pela velha cidade.
A única
comunidade evangélica de Roma, onde se fala o italiano e onde se pode conviver
com as pessoas do local é a Igreja Evangélica Valdense da Praça Cavour.
A
Origem dos Valdenses
Por
volta da mesma época em que Pedro de Bruys foi queimado vivo por uma multidão
enfurecida por ter ousado criticar os costumes da Igreja católica (ver a
postagem anterior: Cátaros, Albigenses e Valdenses (uma história que precisa
ser contada ou, porque deixei de ser católico) – Parte 1/2), nascia um outro
personagem que, tempos depois, exerceria uma forte influência na divulgação das
verdades bíblicas pela Europa. O seu sobrenome era Valdès ou, também conhecido
como Pedro Valdo.
A
cidade de Lyon, fundada pelos romanos há mais de dois mil anos, é hoje a
segunda maior cidade da França e importante centro econômico, cultural e
gastronômico. Fica às margens do rio “Rhône” (Ródano) e tem cerca de quinhentos
mil habitantes, que chegam a um milhão e meio, se considerarmos toda a área
urbana ao seu redor. Pode-se dizer que foi em Lyon que teve origem o grupo que
pode ser considerado hoje a denominação protestante mais antiga que existe, a
chamada Igreja Evangélica Valdense.
Por
volta do ano 1170, Pedro Valdo já havia se tornado um rico comerciante e banqueiro
da cidade e, em 1173, teve contato com uma tradução do Novo Testamento para a
dialeto francês da época passando a dedicar-se em estudá-la. Depois de uma
atenta leitura foi impactado profundamente pelas palavras do Senhor Jesus em
Mateus 19:21, "Se quer ser perfeito, vai, vende tudo o que tem e dê-o aos
pobres e terás um tesouro no céu; e depois vêm e me segue".(1)
Assim,
ele resolveu encomendar tradução manuscrita de partes da Bíblia do latim para o
dialeto do sudoeste da França e começar a pregar o Evangelho pelas ruas de
Lyon, mesmo sem ser sacerdote, para em seguida, abrir mão de todos os seus
bens, vendendo-os e doando aos pobres, com exceção daquilo que fosse necessário
para o sustento de sua família, deixando parte dos bens para sua esposa e prosseguindo
no trabalho de pregação. Diferentemente de Pedro de Bruys e de Henrique de
Lausanne, Pedro Valdo era completamente leigo.
Alguns
habitantes de Lyon ficavam tão emocionados de ouvir a mensagem da Bíblia
discursada na sua própria língua materna, que também decidiram renunciar a seus
pertences e devotaram a vida à divulgação das verdades bíblicas e, com isso,
foi sendo formado um grupo de seguidores. O grupo liderado por Valdo ficou
conhecido como “os pobres de Lyon” (ou “homens pobres de Lyon”, ou ainda “os
pobres de espírito”) e, posteriormente, viriam a ser denominados como “Os
Valdenses”.
Nesse
aspecto, o que Valdo fez não foi muito diferente daquilo que Francisco de Assis
faria, no século seguinte, na Itália, renunciando aos bens materiais e se dedicando
aos pobres. Todavia, desde o início, os valdenses afirmavam sobre o direito de
cada comunidade de fieis de ter a Bíblia acessível em sua própria língua, sendo
esta a ser considerada a fonte de toda autoridade eclesiástica.
O que
chama atenção neles é a atitude que tinham diante da Bíblia. Estavam menos
interessados em interpretar a Bíblia e mais em obedecê-la e pôr em prática o
que eles entendiam como mandamento divino para eles. Tanto Valdo quanto os seus
seguidores eram leigos, e, naquela época, era um monopólio da Igreja oficial a
pregação e a interpretação das Escrituras. Mas eles insistiam em continuar
pregando o Evangelho, apesar da proibição da Igreja e, em 1179 pediram ao Papa
Alexandre III uma licença especial para continuar com os seus trabalhos, mas
esta foi negada.
A
Igreja achou esses eventos muito perturbadores e, em 1184, esse zeloso grupo
composto de homens e mulheres da cidade de Lyon, que mais tarde passariam a ser
chamados de valdenses, foi excomungado pelo papa e expulsos de suas casas pelo
então bispo de Lyon. Como eles já eram desapegados de casas, essa medida, na
realidade, serviu apenas para dar a oportunidade de divulgação da mensagem da
Bíblia em outras regiões.
Por
fim, não só os seguidores de Valdo, mas também de Pedro de Bruys e de Henrique
de Lausanne, bem como outros dissidentes, podiam ser encontrados em muitas
partes da Europa, antes mesmo do final do século XII. Ao serem expulsos de
Lyon, Pedro Valdo e alguns de seus seguidores encontraram refúgio nos Alpes, na
região italiana do Piemonte. Outros seguiram para a Alemanha, a Europa Central
e Oriental. A perseguição fez os valdenses estabelecer-se, principalmente, em
zonas rurais.
De
fato, os numerosos irmãos perseguidos, conhecidos pelos diferentes nomes que
lhes eram dados por seus perseguidores, chegaram, com o tempo, a constituir um
testemunho unido e de vasto alcance, fora da cristandade organizada. Outros
importantes defensores das verdades bíblicas surgiram nos séculos posteriores,
tais como John Wycliffe (1330-1384), William Tyndale (1494-1536).
Mas os
Valdenses não pretendiam, a princípio, se separar da igreja Católica, apenas
buscavam profundamente saber como agradar a Deus, tanto que por mais de
trezentos anos continuaram fazendo parte dela, apenas tendo seus próprios
costumes de simplicidade evangélica e, sendo deixada a margem, faziam contraste
com uma igreja corrompida, cujo maior costume era a opulência e a associação
com a nobreza.
Segundo
o historiador Euan Cameron, parece que os pregadores valdenses não se “opunham
à Igreja Católica em si”. Eles apenas “queriam pregar e ensinar”. Historiadores
dizem que o movimento foi praticamente impelido para a heresia por uma série de
decretos, que progressiva e permanentemente o marginalizaram. As condenações feitas
pela Igreja culminaram no anátema emitido pelo Quarto Concílio de Latrão contra
os valdenses em 1215.
Só
muito tempo depois, com a Reforma Protestante, no início do século XVI, é que
eles se identificaram com os ensinamentos de Lutero e de Calvino e aderiram à
Reforma. Quando se juntaram ao nascente protestantismo no Sínodo de Chanforan
em 1532, desde então, os valdenses subscrevem ao Calvinismo.
No
século XVII, no contexto das guerras de religião, os Valdenses foram exilados
dos Alpes, onde estavam estabelecidos há séculos, e quase chegaram a ser
eliminados completamente. Mas sobreviveram às perseguições, voltaram aos Alpes
e mantiveram até hoje a fé evangélica. São hoje uma das principais igrejas
protestantes na Itália e estão presentes, em menor número, em países como a
Argentina, o Uruguai e os Estados Unidos.
Os
Valdenses Dos Vales Alpinos
Típico
Vilarejo das Encostas dos Alpes do Piemonte (atual)
Pedro
de Valdo entrou em íntima relação com população dos vales alpinos que passaria
a ser denominada como Valdenses, e, possivelmente por essa razão, muitos
historiadores o consideraram o seu fundador. Todavia, existem razões para crer
que, na verdade, Pedro Valdo encontrou ali um povo evangélico formado já em bom
número, apesar da coincidência do seu sobrenome 'Valdo' e o nome 'Valdenses'.
Muitos
creem que o suposto em contrário vem, senão, do costume das autoridades
políticas e eclesiásticas de querer ver, sempre, um fundador ou líder na origem
de todo movimento, seja este movimento espiritual ou, meramente social. De
fato, o nome 'Valdenses' parece derivar melhor do francês 'Vallois' (pessoas
dos vales), que aparece em muitos manuscritos dos valdenses do Piemonte,
anteriores a Pedro de Valdo. De fato, os valdenses são uma congregação de cristãos
dos Vales do Piemonte, cujas origens ainda são muito debatidas.
Próximo
das montanhas, cerca de 45 quilômetro a sudoeste da cidade piemontesa de Turim
(em Italiano, Torino), abrindo-se diante
do que parece ser um grande portal da montanha, encontra-se a entrada para o
principal território dos vales Valdenses (ver imagem de satélite - Google Earth
- mais adiante). Saindo de Turim, para chegar ali, o caminho passa pela pequena
Pinerolo (que ainda não está em território valdense). A partir de Pinerolo, três
vales levam a áreas valdenses: O Vale Chisone, para o noroeste (que leva sobre
os Alpes para a França), o Vale Germanesca, e o Vale Pellice, a oeste de Torre
Pellice e além.
Vista
Panorâmica sobre parte de Torre Pellice, atual
Os
vales dos valdenses tem montanhas íngremes separando-os e nem sempre é possível
atravessar de carro a partir de um vale para o outro. Torre Pellice, na junção
do Rio Pellice e do Vale do Angrogna, é um bom lugar para começar uma visita a
esses vales. Elevando-se sobre a cidade encontramos Castelluzzo, o afloramento
rochoso na montanha, e uma fortaleza para os valdenses nos momentos de luta..
As barras de la Tagliola é uma caverna no alto da montanha, ao pé do rochedo,
utilizada em tempos passados como um refúgio da perseguição. Ao lado do Museu Valdense
existe uma escola Valdense.
Apesar
de que, a Igreja Cristã na Gália (França), só aparecer pela primeira vez na
história, em conexão com a perseguição contra os cristãos ocorrida em Lugdunum
(atual Lyon, França), o então centro religioso da Gália romana, sob Marco
Aurélio, no ano de 177 d.C., acredita-se que discípulos dos apóstolos semearam
as boas novas de Cristo nos Vales Valdenses, provavelmente desde 58-59 d.C.,
quando eles viajavam através dos Alpes Cotianos, em direção a Gália e outras
partes da Europa. O único registro daquela perseguição de 177 d.C., ocorrida
não apenas na cidade de Lyon, mas também em Venne, é uma carta preservada em
História Eclesiástica de Eusébio, livro 5, capítulo 1.
Quanto
ao adjetivo 'Cotianos', associado ao substantivo Alpes, ele vem de Marcus
Julius Cottius, um rei das tribos ligurianas, que eram os habitantes naturais
daquela região montanhosa no primeiro século antes de Cristo. Essas tribos, de
origem étnica Celto-Ligúria, foram os fundadores a cidade de Torino (ou Turim,
que hoje é a quarta maior cidade da Itália).
De
fato, a então pequena cidade de Turim já existia desde, pelo menos, 218 A.C,
quando há registros de que ela foi atacada, e parcialmente destruída por
Hannibal, o púnico comandante militar cartaginês, durante a sua campanha dos
Alpes. Posteriormente, as tribos Celto-Ligúria que habitavam a região haviam
estado, a princípio, em oposição, mas, depois, fizeram as pazes com Júlio
César.
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