Desenvolvimento sustentável, mandamento de Deus.
Por Carlos Vicente
Leio o capítulo 1 do livro do Gênesis e fico
maravilhado com o relato de como Deus formou nosso planeta. De um amontoado de
matéria sem forma, sem vida e mergulhado num ambiente de trevas, caótico e
inóspito, Ele criou um oásis magnifico.
Só posso tremer, reverente, diante do poder que
formou essa esfera rochosa de 12 mil km de diâmetro, com montanhas, oceanos,
florestas e campinas, protegida por uma fina camada de gases essenciais, como o
oxigênio. E que gira em velocidades impressionantes: em torno de si mesma a 1,7
mil km por hora, ao redor do sol a 107 mil km/h.
A Terra foi meticulosamente construída para que
pudesse abrigar a vida e ser o lar da humanidade. Deus a encheu de beleza,
formas, cores, odores, sabores e de toda sorte de seres viventes interconectados
e interdependentes. Depois, ao ver que tudo isso era muito bom e que já não
faltava nada, criou o ser humano e convidou-o a povoar a Terra e a desfrutar de
todas aquelas maravilhas.
Mas não posso deixar de sentir grande apreensão e
tristeza ao ver a crise em que vivemos e saber que as tormentas e sofrimentos
que abalam a Terra tem origem na destruição que fomos capazes de promover na
criação de Deus. Penso que um detalhe importante foi esquecido: Ele não deixou
o ser humano livre para fazer o que bem entendesse, mas lhe deu uma ordem
direta e clara para cultivar e guardar a Terra.
Está lá, em Genesis 2:15, e não é ideia humana, mas
a palavra do Criador. A ordem para cultivar e guardar a Terra revela Seu desejo
de que o ser humano promova desenvolvimento e gere prosperidade, fazendo uso de
sua inteligência, criatividade e inventividade. Com a ordenança para guardar a
Terra, Ele instituiu o princípio e a ética do cuidado na relação do ser humano
com todo o resto da criação.
É clara a vontade de Deus de ver o ser humano
vivendo em paz e harmonia. E isso só é possível em sociedades sustentáveis, nas
quais as diferentes formas de se desenvolver seguem o imperativo do amor ao
próximo e da conservação da natureza. Todas as sociedades humanas desenvolveram
conhecimentos e tecnologias extremamente importantes. Uma parte seguiu a rota
da industrialização e do mercado, outra parte o manejo sustentável dos recursos
naturais baseado em comunidades não mercantilizadas.
Observo, portanto, que a resposta escolhida para
essas duas ordenanças -desenvolver e preservar- configuram quatro tipos de sociedades
básicas. Procurei ilustrar com a figura abaixo. No tipo 1, temos sociedades não
industrializadas que enfrentam graves problemas de desigualdade social e
degradação ambiental; O tipo 2, se refere a sociedades não industrializadas
orientadas para o bem viver e a preservação dos recursos naturais; O tipo 3, se
compõe de sociedades industrializadas que enfrentam graves problemas de
desigualdade social e degradação ambiental; por fim, o tipo 4, formado por
sociedades industrializadas que lograram elevados níveis de qualidade de vida e
de preservação ambiental.
Nas sociedades do tipo 1 a maioria da população
sofre com a pobreza extrema. Elas são privadas, ao mesmo tempo, do avanço
tecnológico e do acesso a bens naturais essenciais, como a água e terras
férteis. Nas sociedades do tipo 2, apesar de sofrer com a carência de acesso a
serviços públicos, elas são portadoras de vasto conhecimento e tecnologias relacionadas
ao uso sustentável dos recursos naturais. São sociedades com abundância de ar
puro, água limpa, peixes, frutos e outros tipos de alimentos, plantas
medicinais e uma infinidade de matérias-primas encontradas na natureza. Nessas
sociedades, a ordenança de Deus foi obedecida: cultivar e guardar, ou seja,
desenvolver e preservar.
Nas sociedades de tipo 3, o grande progresso
científico e tecnológico e a prosperidade econômica convivem com graves
problemas de desigualdade social, contaminação ambiental, desmatamento e perda
de biodiversidade. Esse é o tipo de sociedade que provocou a crise climática
global.
Já as sociedades de tipo 4, são aquelas que
conseguiram alcançar o desenvolvimento econômico e social, reduzir as
desigualdades e assegurar elevado padrão de qualidade ambiental e conservação
dos recursos naturais. Nessas sociedades, que deveriam ser a regra, mas são
exceção, a ordenança de Deus também foi obedecida: cultivar e guardar, ou seja,
desenvolver e preservar.
>> Jesus e a Terra <<
Muitas pessoas podem pensar que a ideia do
desenvolvimento sustentável foi formulada pela primeira vez no Relatório Nosso
Futuro Comum, elaborado pela ONU, em 1987. As palavras são recentes, é certo,
mas o principio espiritual e ético é muito antigo: desenvolver e preservar está
nos fundamentos sagrados das 3 grandes religiões monoteístas do mundo -
Judaismo, Cristianismo e Islamismo, há mais de 2 mil anos.
A compreensão desse princípio tem grande
importância nos tempos em que vivemos. Podemos ter a certeza, dada pelas
Escrituras Sagradas, de que devemos nos unir num grande esforço para superar a
crise climática que enfrentamos neste século e que ameaça a própria existência
humana na Terra. Não faltam evidências científicas de que já elevamos a
temperatura média do planeta em 1,1 graus, desde a revolução industrial.
Segundo o Painel Científico da ONU, se
ultrapassarmos a barreira dos 1,5 graus de aumento da temperatura, os impactos
sobre a população e o meio ambiente serão devastadores. Infelizmente, a
mobilização dos países para deter essa escalada da temperatura não está
produzindo os resultados esperados. Todos os compromissos de redução das
emissões de CO2, firmados pelos países no Acordo de Paris, projetam uma
elevação de 2,8 graus na temperatura do planeta.
Para limitar o aquecimento em 1,5 graus, até o fim
do século, é preciso reduzir as emissões de CO2, em relação aos níveis de 2019,
na ordem de 48% em 2030, 65% em 2035 e 80% em 2040, chegando em 2050 com zero
emissões líquidas. No ritmo atual das negociações internacionais é impossível
que consigamos qualquer um desses resultados.
A única esperança de que haja uma mudança real é
que a população exija de seus governantes: mudar o tipo de desenvolvimento
econômico, promover condições de prosperidade para todos e implementar as
medidas de proteção ambiental necessárias com urgência.
Existem, entretanto, poderosos interesses
econômicos de setores que negam a existência da crise e sabotam os esforços
internacionais e o trabalho de governos comprometidos. Essas forças
negacionistas investem milhões de reais para confundir as pessoas e impedir uma
maior mobilização da população. Usam e abusam de teorias conspiratórias e de
toda sorte de mentiras.
Uma de suas mentiras mais eficazes é a propagação
da ideia de que a luta contra as mudanças climáticas é uma pauta de comunistas
e de imperialistas que querem impedir o desenvolvimento dos países e, até
mesmo, de supostos “satanistas”. Mas a verdade é que a crise do sistema
climático global é resultado da desobediência ao mandamento de Deus, de guardar
a Terra.
Na ganância de um progresso restrito a poucos, sem
cuidado com o planeta e com seus habitantes, acabamos por extrapolar a
quantidade segura de CO2 na atmosfera, por meio da queima desenfreada de
petróleo, carvão e gás e pela destruição das florestas, pelo saque e
contrabando das riquezas naturais, o desperdício, a poluição, o consumo
descontrolado.
Sinto, entretanto, que todos nós estamos a um passo
de reconhecer nossa desobediência. Sabemos que precisamos de madeira para
diversos usos, mas sentimos que está errado cortar indiscriminadamente árvores.
Achamos justo que um morador da floresta mate um animal para defender-se de um
ataque ou para alimentar sua família, mas sentimos repulsa quando vemos alguém
matar por diversão. Sabemos que precisamos de água tratada para beber e para a
produção agrícola e industrial, mas não gostamos da poluição dos rios, que
causa doenças e morte.
De onde vem nosso incômodo sentimento de tristeza
com a destruição da natureza? Creio que vem do fundo de nossa alma, da própria
imagem de Deus em cada um de nós, onde ressoa a voz de Deus ordenando: cultiva
e cuida da Terra.
Devemos nos arrepender de nossa histórica
desobediência a Deus, e lembrar que a prova do nosso arrependimento é a
transformação do nosso sentimento em ação prática. Como podemos fazer isso?
Adotando bons hábitos de consumo, ajudando a conscientizar nossos amigos e
parentes e a combater as mentiras. Também cobrando compromissos e ações
efetivas dos governantes e empresários e apoiando os esforços de preservação e
restauração da natureza feitos pelos grupos e organizações dedicadas a essa
causa. Devemos ainda nos esforçar para promover a paz, o respeito por todas as
pessoas e todas as formas de vida, e ajudar a reduzir a dor e o sofrimento dos
nossos semelhantes.
Nossa sobrevivência depende da obediência ao que
Deus estabeleceu nos primórdios da criação: desenvolver e preservar. O
resultado dessas atitudes vai muito além da mera sobrevivência: podemos
alcançar a vida em abundância, como Jesus prometeu, expressando nossa gratidão
pelo privilégio que Deus nos deu, de vivermos nesse precioso oásis, e nosso
amor por toda a criação e pelas futuras gerações que aqui viverão.
Carlos Vicente, engenheiro florestal.
(carlosvicente@yahoo.com)
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