Olhando
para dentro
“Porque de dentro do coração dos homens, é que
procedem os maus desígnios”
Por
Esther Carrenho
Como
teóloga e psicóloga vejo uma semelhança entre o evangelho e o trabalho da
psicoterapia. Tanto um como o outro nos convida a olhar para dentro. Em
psicoterapia a proposta principal é olhar para si mesmo, tomar consciência das
próprias sombras e mazelas e escolher novos caminhos e ações para uma vida mais
integrada. Nos evangelhos encontramos pelo menos três situações em que Jesus Cristo
exorta seus ouvintes e interlocutores a examinarem a si mesmos para perceberem
a própria miserabilidade que tanto mal podem fazer para si mesmos e para os
outros.
A
primeira situação está no relato de Mateus 7.3 - 5 (trecho do Sermão do Monte)
e de Lucas 7.1 – 6. Trata-se da advertência tanto para a avaliação que fazemos
dos outros quanto para a iniciativa de querer ajudar depois da avaliação feita.
Jesus deixa bem claro que se quisermos ajudar a reformar o outro, precisamos
primeiro reformar a nós mesmos. E usa um tratamento bem duro chamando de
hipócrita aquele que quer tirar um cisco do olho do outro sem primeiro tirar a
trave que está no próprio olho.
A
segunda, está no relato de Marcos 7.1 - 23 e Mateus 15.1 - 20 em que os
discípulos são criticados pelos líderes judeus por comerem ser lavar as mãos,
um rito religioso. Jesus exorta tanto os religiosos quanto os seus discípulos a
avaliarem com seriedade o que está no interior, porque isto sim pode sair e
contaminar muito mais do que a falta de limpeza externa enquanto ritual. E faz
uma lista de maus desígnios que dizem respeito a você e a mim: maus
pensamentos, imoralidades sexuais, roubos, homicídios, adultérios, cobiças,
maldades, engano, devassidão, inveja, calunia, arrogância, insensatez. Com isto
fica claro que precisamos nos concentrar, e investir tempo em limpar as
impurezas que estão no nosso interior. As limpezas e belezas externas podem
alegrar os olhos, mas não cativam coração. A beleza interior atrai o olhar e
prende o coração. Não prejudica outros e é prazerosa para quem se aproximar.
A
terceira situação registrada em João 8.1 - 11 é a intrigante história de uma
mulher pega em adultério e trazida a presença de Cristo pelos escribas e
fariseus para que Ele autorize o apedrejamento estabelecido na lei judaica.
Aqueles homens estavam ali para exercer juízo contra uma mulher que fora pega
numa falha. Jesus diz claramente que depois de eles se autoavaliarem e, olhando
para as próprias vidas, não descobrirem nada de errado, estão autorizados a apedrejarem
a mulher. O texto diz que rodos saem do local, deixando a mulher livre,
obviamente porque rapidamente viram pelo menos um pouco das próprias vidas. E a
vida da mulher foi preservada, dando-lhe a oportunidade de mudar seus caminhos.
Neste
relato fica bem claro que antes de exercer qualquer juízo ou condenação contra
uma pessoa é necessário olhar com sinceridade, a própria vida. Cristo não
condenou a mulher adúltera, apenas ordenou que mudasse seu jeito de viver.
O que
fazer quando olharmos para dentro e descobrirmos nossas próprias misérias?
Primeiro,
dê nome ao que você descobriu. É inveja? Ciúmes? Maldade? Roubo? Hipocrisia? Ou
o quê?
Segundo,
arrependa-se. Arrependimento gera mal-estar e requer lamento, desejo de reparo.
Desejo de ir por outro caminho.
Terceiro,
confesse a Deus. De preferência, num lugar privado e audivelmente, para escutar
a sua própria voz. Quando confessamos em voz audível o próprio lamento, a dor
diminui dando forças para buscar novos caminhos.
Quarto,
compartilhe com uma pessoa amorosa a experiência. Pode ser um amigo, um
familiar, um conselheiro ou um profissional.
No
advento da graça em Cristo Jesus, podemos olhar para dentro e mesmo diante da
coisa mais vergonhosa e feia não mais carregar culpa. E muito menos condenar ou
punir-se. As Escrituras deixam bem claro, que todo e qualquer peso ou culpa
pelos nossos erros e pecados foram expiados na cruz do Gólgota. “O castigo que
nos traz a paz estava sobre ele” (Is 53.5). A única coisa necessária é a
conscientização, mesmo que dolorida, e a confissão mesmo que vergonhosa. E
desse momento em diante, podemos caminhar como pessoas autênticas e livres!
Esther
Carrenho, teóloga, psicóloga e autora dos livros: Raiva: Seu bem, Seu Mal e
Caminhos de Vida.
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