4-Nas páginas iniciais de Apocalipse, nosso Senhor
se apresenta como o santo guerreiro celestial (1.12-20) que prepara o seu povo
para conquistar os seus inimigos (2.7, 22, 17, 26; 3.5, 12, 21) ao exortá-los a
ouvirem o que o Espírito tem a dizer nas cartas que ele escreve a sete igrejas.
Notavelmente, embora ele escreva cada carta a uma igreja particular, Cristo
insiste que cada uma delas seja ouvida por todos (2.7, 11, 17, 29; 3.6, 13,
22), tornando cada uma delas, efetivamente, uma “carta aberta” para todos os
crentes lerem. O que, então, Cristo deseja que aprendamos de sua carta à igreja
de Tiatira? Para ouvir essa lição, nós precisamos examinar alguns aspectos
chave da carta que Cristo escreveu aos cristãos de lá.
Acima de tudo, a mensagem de Cristo aos cristãos de
Tiatira é uma advertência de que eles estão em grave perigo espiritual. Mas
como pode ser isso? Essa igreja, diferentemente da de Éfeso, não perdeu o seu
primeiro amor (2.4-5), ao contrário, cresceu em amor e fé, com serviço e
perseverança (2.19). Certamente, eles estão seguros. Todavia, junto a essas
virtudes habita um vício. Em outras palavras, o risco não está vindo de fora da
igreja: assim como ocorria em Laodicéia, a perseguição da Roma imperial não
representava nenhuma ameaça ao bem-estar de Tiatira. Em vez disso, o perigo vem
de dentro. A igreja está tolerando a presença de uma falsa profetiza e seus
discípulos (2.20). Com efeito, a influência dessa árvore má e seus frutos maus
(Mateus 7.15-20) está comprometendo o professo noivado de Tiatira com Cristo
(ver 2 Coríntios 11.2-3). Nós entendemos melhor a ameaça posta por esses lobos
ao analisarmos o pano de fundo de Tiatira.
Embora segundo padrões mundanos Tiatira fosse a
menos conhecida das sete cidades do Apocalipse, ela se destacava pelo grande
número de corporações de ofício (relacionadas especialmente a tecidos e
armaduras) que nela prosperavam. A influência desses sindicatos na vida civil
era considerável. Rigorosamente todo mês, eles patrocinavam refeições comuns
para os seus membros, banquetes que envolviam adoração ao imperador romano com
divindades padroeiras locais e, frequentemente, imoralidade sexual. Não se
acomodar a essas práticas pagãs colocava alguém em significativo risco
econômico, particularmente se esse alguém desejasse progredir nos negócios e na
sociedade.
Uma coisa seria, em Tiatira, os cristãos envolvidos
no comércio (como Lídia, Atos 16.14) serem convidados para essas festas por
colegas de fora da igreja; outra coisa era um líder na igreja aprovar que
cristãos aceitassem tais convites. Imagine estas palavras tentadoras: “Vocês
conhecem as ‘coisas profundas’ (Apocalipse 2.24) que estão em jogo aqui. Vocês
sabem que “o ídolo nada é” (1 Coríntios 8.4); vocês sabem que “todas as coisas
são lícitas” a vocês (6.12). Então, vão ao banquete; comam, bebam e se
divirtam! Vocês precisam ganhar a vida, não é?”. Não é de surpreender que o
Senhor da igreja tenha chamado a falsa profetiza de Tiatira pelo depreciador
apelido de “Jezabel”. Em Israel, aquela rainha gentia do maligno rei Acabe
havia perseguido os profetas de Deus e promovido a típica adoração sexualmente
desenfreada a Baal (1 Reis 16.31-33; 18.4; 21.25; 2 Reis 9.22). Os paralelos
entre Israel e Tiatira são óbvios.
A idolatria e imoralidade de Tiatira, contudo,
expõe ainda mais acerca da falsa profetiza e seus discípulos. Se a Jezabel de
Tiatira não for o modelo para o retrato da Cafetina Babilônia feito por João em
Apocalipse 17, ela é ao menos uma encarnação local de tudo o que aquela
prostituta representava. Como uma filha imitando sua mãe, as seduções de
Jezabel ecoam as rejeições da Babilônia ao único e verdadeiro Deus e à sua
justiça, rejeições encarnadas nos sistemas sociais da presente era maligna.
Como a Babilônia, Jezabel faz com que seus filhos-seguidores tornem-se
cúmplices das prostituições deste mundo, no corpo e na alma. E no coração
dessas prostituições está o engodo da estabilidade econômica. Seguir Jezabel,
então, é partilhar da identidade da Babilônia terrena; renunciá-la é partilhar
da identidade da Jerusalém celestial.
Mas Cristo nos dá ainda mais discernimento acerca
da escolha posta diante de Tiatira e diante de nós. Com uma sabedoria superior
à de Salomão, Ele quer que as igrejas examinem seu destino pela sua semelhança
com a sua mãe espiritual. Aqueles que Jesus identifica como a profetiza
impenitente e seus filhos serão punidos com sofrimento e morte nesta era
(Apocalipse 2.22-23); aqueles que ele identifica como o seu povo arrependido e
firme (vv. 24-25) serão recompensados com uma participação na autoridade real
de subjugar seus inimigos no final desta era (vv. 26-28). A lição para Tiatira
e para nós é clara: partilhar da identidade de uma mãe é partilhar do seu
destino.
Temos nós ouvidos para ouvir a mensagem de Cristo a
Tiatira? Acaso o engodo da estabilidade econômica levou nossas igrejas a
tolerarem o falso ensino? Nossos antepassados protestantes viram sua igreja
tornar-se uma prostituta sujeita ao julgamento de Cristo. Então, eles
renunciaram a Jezabel; eles aceitaram perder “famílias, bens, prazer” e vir “a
morte enfim chegar”[1] e assim seguiu a Reforma. Que nós também nos
arrependamos de nosso desejo promíscuo por estabilidade econômica neste mundo
babilônio; que ponhamos um fim em nosso adultério com mestres que nos seduzem
para longe da santa segurança da Jerusalém de cima e do mundo por vir.
Notas:[1] N.T.: Trecho do hino “Castelo Forte”
(letra original composta por Martinho Lutero).
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content_size=”normal” text_align=”left” background=”fancy” line=”true”
style=”2″ animation=”right”]Observação:
Este artigo é parte da série “Igrejas de
Apocalipse”. Veja a lista de artigos sobre o assunto:
O que significa abandonar o primeiro amor? (Série:
Igrejas de Apocalipse – Éfeso)
Sê fiel até a morte! (Série: Igrejas de Apocalipse
– Esmirna)
Cuidado com a doutrina de Balaão e dos nicolaítas
(Série: Igrejas de Apocalipse – Pérgamo)
Você tolera Jezabel (Série: Igrejas de Apocalipse –
Tiatira)
Você tem fama de estar vivo, mas está morto (Série:
Igrejas de Apocalipse – Sardes)
Uma porta aberta que ninguém pode fechar (Série:
Igrejas de Apocalipse – Filadélfia) (06/04)
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