Alexandre
Garcia: derrapando na curva
"A
trajetória ascendente da curva de poder do Supremo parece ter encontrado o
esgotamento do silêncio de dois atores: a OAB e o Senado", avalia
jornalista
Alexandre
Garcia
Postado
em 15/11/2023 03:55
Antes
mesmo de ser votada a proposta de emenda constitucional da vedação a decisões
monocráticas que contrariem decisões do Congresso, o decano do Supremo Tribunal
Federal, Gilmar Mendes, prometeu que se a PEC for aprovada, será derrubada pelo
STF. No mesmo evento de anteontem, na Universidade Mackenzie, o presidente da
Corte, Luís Roberto Barroso, certamente respondendo à nota crítica da Ordem dos
Advogados do Brasil, afirmou que os que veem ativismo judicial do Supremo são
porque não gostam da Constituição ou da democracia. A forte nota termina
dizendo que "a OAB continuará insistindo para que o Tribunal cumpra as
leis e a Constituição".
A gota
d'água foi o impedimento de um advogado de fazer a sustentação oral de um caso,
num agravo na 1ª Turma. Barroso também respondeu a uma crítica do presidente do
Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), no Correio Braziliense, de que drogas, aborto
e marco temporal são assuntos do Congresso, não do Supremo. Segundo o ministro,
não se deve querer mudar decisões do Supremo — no caso das drogas, disse que a
Corte agiu para "corrigir uma política desastrosa".
Seria
isso um início de reação dos advogados e dos políticos ao crescente
empoderamento do terceiro poder? Teria esse crescimento de poder no Supremo
chegado ao limite suportável?
O
economista Arthur Laffer desenhou numa curva o resultado de suas observações
sobre tributos. Quanto mais sobem os impostos, mais sobe a arrecadação. Mas há
um limite em que os pagadores de impostos se cansam de pagar e se os impostos
continuam subindo, a arrecadação faz uma curva e começa a cair, como a
trajetória de uma bala de canhão. É um fenômeno psico-social com consequência
econômica e política.
No
campo político, outra trajetória ascendente registraria o poder crescente de um
dos três poderes, por ironia o único sem representação expressa do voto. O
Supremo tem um inquérito que foi criado sem Ministério Público, em que o
tribunal é vítima e, ao mesmo tempo, condutor absoluto. Também tem julgamentos
em que o tribunal é vítima de invasões e julga e condena os invasores.
Julgamentos
virtuais tolhem a manifestação oral e presencial da defesa. Decisões que
interferem de tal modo no Poder Legislativo, que tornam o Supremo um criador ou
revogador de leis.
Durante
a pandemia, deu aos governadores o poder de revogar cláusulas pétreas da
Constituição. E, ampliando ainda o poder, interfere no Ministério Público sobre
arquivamento ou não de inquéritos.
A
trajetória ascendente da curva de poder do Supremo parece ter encontrado o
esgotamento do silêncio de dois atores análogos aos pagadores de impostos: a
OAB e o Senado — dois agentes fiscalizadores das leis, da Constituição e do
próprio Supremo, como são os senadores.
O
presidente do Senado não quer que partidos derrotados no voto usem o Supremo
como "terceiro turno". No discurso de posse na presidência do STF, o
ministro Luiz Fux identificou o desgaste do Supremo por essas interferências. O
discurso é de setembro de 2020 — depois disso, ampliou-se o desgaste.
Há um
importante alerta, usado por Mário Henrique Simonsen (ministro da Fazenda no
governo Geisel e do Planejamento no governo Figueiredo): o caso do trapezista
que, cada vez mais enlevado com seu poder de atravessar os ares do picadeiro,
um dia convenceu-se de que poderia voar e mandou tirar a rede.
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