O
conselho de C.S. Lewis para um novo periódico cristão
Se
todos estivessem vivos, deveríamos admitir Aristóteles (mas não Heráclito),
Voltaire (mas não Anatole France), Hardy (mas não Oscar Wilde)
Por
Paulo Ribeiro
Em
1947, C. S. Lewis foi convidado a opinar sobre a criação de um novo periódico
cristão. Abaixo o memorando que ele escreveu para o poeta Laurence Whistler.
Talvez alguns fiquem estarrecidos com a abordagem de Lewis. Uma abordagem
repleta de sabedoria e muito necessária hoje.
Para
Laurence Whistler:
Abril
de 1947
Memorando,
de Lewis, C. S.1
Entendo
que o impulso por trás do projeto é tanto religioso quanto cultural: que os
elementos parecem se misturar em diferentes proporções nas mentes dos
diferentes indivíduos presentes. E, quando chegarmos aos detalhes, concepções
muito diferentes do projeto do periódico se revelarão. Caso eu não possa estar
presente, gostaria de deixar por escrito, antes da reunião, minha opinião que
sugiro fortemente.
1.
Penso que o periódico deveria apresentar-se ao público sem quaisquer pretensões
religiosas explícitas: a sua oferta deveria ser simplesmente uma oferta de bons
poemas, boas histórias e boas críticas.
2. Por
outro lado, aqueles que o dirigem deveriam de fato ser todos cristãos. O padrão
que eles realmente aplicam ao admitir ou rejeitar colaboradores não deveria ser
o de acordo com a fé cristã, mas o de acordo ou desacordo com o que pode ser
chamado de *bom Pagão* como uma gama de racionalidade e virtude.
3.
Assim, embora muitos, talvez a maioria, dos colaboradores sejam explicitamente
cristãos, admitiríamos livremente bons trabalhos que não são, e poderíamos até
admitir trabalhos opostos à fé cristã, desde que a oposição for baseada num
apelo à razão e à ética.
4. O que
estaria definitivamente e sempre excluído:
(a)
Ceticismo total: ou seja, ataques à razão e à moralidade;
(b)
Linguagem imprópria, por mais intelectual que seja;
(c)
Cinismo e sadismo, disfarçados de realismo.
Assim,
se todos estivessem vivos, deveríamos admitir Aristóteles (mas não Heráclito),
Lucrécio (mas não Petrônio), Voltaire (mas não Anatole France), Hardy (mas não
Oscar Wilde).
Minha
razão para pensar isso não é que eu considere o padrão de bom pagão mais
importante do que o cristão, mas que considero as táticas que sugeri mais
prováveis, no longo prazo, de fazer o que um periódico pode fazer em relação à
conversão de pessoas instruídas na Inglaterra. Pelos seguintes motivos:
1. Já
existem muitos periódicos religiosos no mercado.
2. O periódico
explicitamente religioso deve ser confessional ou não. Existem sérias objeções
a qualquer uma das escolhas.
3. Ele
atrairia apenas aqueles que já estão convertidos ou próximos da conversão.
4.
Nenhuma crítica imparcial ocorreria na imprensa: seria ridicularizada e
bem-vinda em linhas puramente partidárias.
5.
Todos os outros periódicos estão se tornando cada vez mais uma “casa amarrada”.
Essa é uma das doenças que queremos curar.
6. [A
razão realmente importante em minha mente]. Em todas as outras épocas, a
pregação do cristianismo foi capaz de pressupor a luz da natureza nos seus
ouvintes. Foi pregado aos judeus, aos meio-judeus chamados metuentes2, aos
estoicos, aos epicuristas e aos bárbaros politeístas. Todos estes já tinham
algum tipo de ética, uma crença na razão e, muitas vezes, elevados padrões de
dever familiar, tribal ou cívico.
Onde há
ceticismo total, o apelo ao arrependimento e a promessa de perdão devem falhar
completamente. Os primeiros pregadores cristãos lutavam pelo sobrenatural
contra o natural. O que enfrentamos é o antinatural.
Sugiro,
portanto, que o título do periódico seja pouco revelador e que seu verdadeiro
padrão seja descoberto apenas gradualmente, pelo conteúdo.
C. S.
Lewis.
-
Provocativo, não acha?
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