domingo, 19 de novembro de 2023

REFLEXÃO... 02

 

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O fim da magia na arte circense

Respeitável público… Senhoras e senhores… nesse sábado fui ao circo. Tinha palhaço, malabarismo, dança, globo da morte entre outros espetáculos. Olhares de decepção estavam estampados nas caras de meus companheiros de plateia, que fitavam o picadeiro ora pela tela dos malditos smartphones, ora com os próprios olhos. Reparei logo de cara um segundo problema: o público — se respeitável eu não sei — não compreendia aqueles sinais dos artistas que puxam aplausos — olhares diretos, gritos de “hey”, gesto de curvar-se, etc. —, nem sacavam os punches na comédia básica do palhaço, a ponto de o apresentador, constrangido, ter de avisar ao microfone os momentos de baterem palmas. Qualquer um com certa veia artística saiu arrasado daquelas lonas pitorescas.

 

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As pessoas já estão mal-acostumadas a verem todo tipo de presepada — algumas de alto nível — na internet ou televisão. Crianças em tenra idade já viram de tudo, em termos circenses, em suas telinhas: mágicos impressionantes, ilusionistas inacreditáveis — com efeito de câmera, edição e toda a parafernália — contorcionistas invertebrados como lesmas, equilibristas sem equipamento em arranha-céus, palhaçadas para todo gosto etc. Óbvio, a magia do circo acaba. Para um garoto que viu vídeos de equilibristas sem equipamento, nas nuvens, é uma tristeza ver um senhor andando sobre uma corda a três metros de altura, com rede de proteção logo abaixo. Imagina só ir a um circo e não ver um mágico serrado ao meio, acorrentado num aquário cheio de tubarões, dentro de um caixão, sobrevivendo a uma explosão de dez quilos de dinamite, com efeito especial hollywoodiano.

 

Não há culpa alguma em ter acesso a espetáculos surreais, os melhores de todo o mundo. Claro que sobe o nível do gosto e da expectativa. Mas há culpa na falta de bom senso e respeito, e na falta de percepções básicas para apreciar a arte milenar, por mais humilde que seja. Acostumaram-se em apreciar com meio tédio em potencial um conteúdo de trinta segundos e, em seguida, dar ou não um “like”, e perderam totalmente a noção do “reforço positivo” da vida real. Vi gente ouvindo e enviando áudio em aplicativo mensageiro, durante as apresentações, como se estivessem de frente a uma televisão.

 

Os circos populares continuam os mesmos, não pioraram em nada, pelo contrário. O público que piorou. Se o circo terá de se adaptar à velocidade e preguiça da modernidade é uma reflexão que temo em fazer, mas se o público continuar desacostumando com a vida real, estarão por tabela matando a arte exterior à virtual — ainda que seja a arte surreal e afins. Ninguém tem mais paciência para entender um poema, ler um romance, ouvir uma música com mais de dois minutos, observar o estilo de pinceladas em uma pintura, assistir uma hora de balé. Nesse ritmo, a apreciação da arte restará para esquisitões aventureiros e acadêmicos em busca de títulos.

 

01 de dezembro de 2021

 

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Anderson C. Sandes

Poeta, cronista, ensaísta. Articulista no PHVox. Vivo de poesia pra não morrer de razão.

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